Qual será a situação financeira do governo daqui a dois anos? Como estarão as contas públicas?
Os sinais de retomada da economia são evidentes. Números desta
semana: o Índice de Atividade Econômica do Banco Central (IBC-Br), com
dados fechados até setembro, mostrou que o país engrenou três trimestres
seguidos de alta. Depois da queda no fim de 2016, houve expansão nos
nove primeiros meses de 2017. Na mesma direção, foram criados 76,6 mil
empregos formais em outubro último. Com isso, a série emplacou nove
meses seguidos de geração de vagas.
Há todas as ressalvas — recuperação moderada, irregular — mas está
em curso um claro processo de melhora das expectativas. Em janeiro
último, o consenso nos meios econômicos previa crescimento do PIB de
0,5% para este ano, com a taxa básica de juros de 10,25% para controlar
uma inflação perto de 5%. Hoje, as previsões para o PIB se aproximam de expansão de 1%, com
um cenário muito mais benigno para inflação (na casa dos 3%) e juros. O
BC já cortou os juros para 7,5% e praticamente cravou que vai reduzi-los
para 7% em dezembro próximo. Para 2018, as expectativas também estão
sendo revistas para cima: não será surpresa se o PIB crescer em torno
dos 3%, com inflação de 4% e juros básicos a 7%.
Então, tudo bem? Para o curto prazo, parece. Mas quando se olha mais à frente, tem
algo esquisito. Pelo jeitão da coisa, parece que 2018 está bem
encaminhado, tudo dentro da lógica. Se a economia estará mais aquecida,
inclusive com geração de empregos mais intensa, a inflação deve subir
paulatinamente, para se acomodar em torno dos 4% ao fim de 2018. E é
factível, provável mesmo, que permaneça nesse nível ao longo de 2019. Continuando com a bola de cristal: se PIB e inflação estarão mais
fortes, é normal que o BC suba a taxa básica de juros. Para quanto? Que
tal uns 8% ao ano, um pontinho acima, para assim tocar em 2019? Seria
mais ou menos a mesma coisa que a combinação atual de inflação a 3% com
juros a 7%. Coerente, portanto, com o conjunto do cenário.
No entanto, no mercado financeiro, os juros futuros estão subindo
mais, acima de 10%, isso nos títulos do governo com vencimento de 2019
para diante. Quando o investidor aplica no Tesouro Direto, por exemplo,
está comprando um título do governo. Dito de outro modo, esse investidor
está emprestando dinheiro para o governo, que paga uma determinada taxa
de juros, a remuneração do credor. Essa taxa é definida no mercado a
partir da seguinte questão simplificada: quanto o investidor exige de
prêmio para emprestar seu dinheiro ao governo? Está embutida aí outra pergunta: qual será a situação financeira do
governo daqui a dois anos? Como estarão as contas públicas? Um devedor
com finanças equilibradas paga juros menores. Já o devedor duvidoso... E
quando esse devedor é o governo, a alta de juros se espalha por toda a
economia, reduzindo as chances de crescimento, aumentando o dólar e
provocando inflação.
Resumindo: quando os que emprestam dinheiro para o governo estão
cobrando juros bem maiores a partir de 2019, isso indica uma dúvida em
relação ao ajuste fiscal e à continuidade da recuperação econômica. O entendimento dominante indica que as contas do governo caminharão
para o colapso se não forem feitas as reformas para conter o gasto
público, especialmente a despesa previdenciária. E estamos falando de dois governos, o atual, de Michel Temer, e o
que será eleito no próximo ano. O atual ainda luta para aprovar uma
reforma da Previdência que economize uns R$ 400 bilhões nos próximos dez
anos. O projeto original, que a equipe econômica considerava duradouro,
economizava o dobro. Mas não passou no ambiente político.
Nos meios econômicos, no mercado, a expectativa está entre o
racional e a pura torcida. No racional: Temer ainda não tem os 308 votos
para aprovar a Previdência na Câmara. Dentro do governo, estima-se que
275 deputados já estariam comprometidos com a reforma. E que seriam
necessários mais uns 40 para entrar na votação com um mínimo de margem
de segurança. Como arranjar esses 40? Negociando ministérios, cargos e verbas.
Tal é o plano em andamento, aliás fortalecido nesta semana. A melhora da
economia e a superação das denúncias deram mais fôlego ao presidente
Temer.
Funciona?
Aqui entra a torcida do mercado. O pessoal se dará por satisfeito
se a Câmara conseguir votar a meia reforma até 22 de dezembro. A coisa
ainda precisará passar pelo Senado, mas lá é mais fácil e pode ficar
para o ano que vem. E se a Câmara não votar nada? E se a reforma for derrotada em plenário? O ambiente claramente piora e a atenção vai se concentrando nos
candidatos a presidente. A partir daí, as pesquisas eleitorais serão os
principais indicadores econômicos. Na verdade, serão o foco mesmo que a
reforma seja aprovada. Há muito por fazer para equilibrar as contas.
Resumo: com a reforma da Previdência votada na Câmara, o país entra
no ano eleitoral mais tranquilo ou menos nervoso. Sem, o pessoal vai
cobrar juros.