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sábado, 30 de setembro de 2017

Correios - Banco Postal fecha 1.800 agências e afeta 137 mil aposentados

Correios fecham agências do Banco Postal e afeta 138 mil aposentados

Correios decidem deixar de prestar o serviço financeiro em 1,8 mil agências. Beneficiários do INSS na Bahia, Paraná e Goiás serão os mais afetados. Segundo a estatal, falta de recursos para manter exigências de segurança motivou a suspensão

Mais de 1,8 mil agências de Correios do país deixarão de fornecer serviços de Banco Postal a partir de 11 de outubro, anunciou ontem a instituição. A mudança atingirá 12 estados e afetará diretamente a vida de quase 138 mil beneficiários do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), que precisarão migrar para agências do Banco do Brasil mais próximas ou para outros bancos. Pelo menos 1,2 mil deles terão que viajar para outras cidades para sacar os benefícios. O restante continuará sendo atendido em agências bancárias nas mesmas localidades, segundo o INSS. 

Os Correios apontam como principal motivo para o corte a falta de dinheiro para arcar com gastos de manutenção, como contratação de vigilantes armados e portas giratórias. Das 6 mil agências dos Correios que oferecem serviços bancários, quase 2 mil são obrigadas, por lei, a ter vigilantes, o que gera um custo de R$ 8 milhões por mês. Para contratá-los em todas as agências do Banco Postal, o custo chega a R$ 28 milhões mensais. “Com o aumento das decisões judiciais que obrigam a adoção de ações de segurança adicionais às previstas para correspondentes bancários, os Correios se veem obrigados a interromper os serviços do Banco Postal nessas localidades, uma vez que os altos custos os tornam inviáveis”, justificou, em nota, a assessoria da empresa.

O impacto é grande, principalmente, para os moradores de pequenas cidades. Em 759 municípios do país, o Banco Postal é o único acesso da população a instituições financeiras. Acabar com o serviço significa, nas palavras do próprio presidente dos Correios, Guilherme Campos, “destruir a atividade do comércio, punir o aposentado e afetar de uma maneira brutal a economia dessas localidades”. Ele fez a declaração em audiência pública na Comissão de Desenvolvimento Regional e Turismo do Senado, na última terça-feira, ocasião na qual adiantou que acabaria com o serviço nas agências. “Estamos tomando uma decisão a contragosto”, lamentou.

Na audiência, Campos ressaltou que oito em cada 10 agências que oferecem serviço de banco postal são deficitárias, o que contribuiu para o prejuízo de R$ 800 milhões da estatal só no primeiro semestre deste ano. “Não temos condições de subsidiar a atividade em localidades onde não seja lucrativo”, explicou. Os estados mais prejudicados pela decisão serão Bahia, que perderá os serviços bancários em 440 agências; Paraná, em 412; e Goiás, 259. O Banco do Brasil afirmou que ainda estão em andamento negociações para encontrar alternativas para manter, pelo menos, parte dos pontos de atendimento.  As agências citadas não fecharão apenas deixarão de prestar serviços bancários. Os serviços postais continuarão funcionando. 




Fonte: Correio Braziliense






A nova carta de Palocci

Trata-se de um dos mais contundentes documentos políticos de nossa história recente

Ex-ministro da Fazenda e da Casa Civil dos governos Lula da Silva e Dilma Rousseff, respectivamente, Antonio Palocci não é um delator qualquer. Muito mais do que um mero observador privilegiado dos 13 anos de lulopetismo, o ex-prefeito de Ribeirão Preto é nada menos do que um de seus mais engenhosos artífices.  Seria um arriscado exercício de imaginação afirmar que sem Antonio Palocci o Partido dos Trabalhadores (PT) não teria chegado ao poder em 2002, quando Lula da Silva assumiu a Presidência da República após três derrotas eleitorais consecutivas. Entretanto, sua liderança na coordenação do programa de governo petista muito contribuiu para dar confiança e previsibilidade a uma candidatura tida como aventureira e inconsequente antes de suas intervenções.

Por meio da famosa Carta ao Povo Brasileiro, concebida por Antonio Palocci, Lula da Silva assumiu o compromisso de, uma vez na Presidência da República, respeitar os pilares macroeconômicos erguidos a duras penas durante os mandatos do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Lula da Silva, enfim, foi eleito e Antonio Palocci assumiu o Ministério da Fazenda, passando a ser a figura central na interlocução entre o governo e o chamado setor produtivo. Sob a gestão de Palocci, a economia do País navegou em mares tranquilos.

Na posição de ministro da Fazenda, Palocci viu aumentar significativamente o seu poder e influência em outras áreas do governo, caminhando naturalmente para ser o candidato à sucessão de Lula da Silva não fosse uma carreira criminosa que logo seria descortinada diante dos olhos da Nação.  Se com a notória Carta ao Povo Brasileiro Palocci ajudou a fundar a era lulopetista, em sua mais recente missiva o ex-ministro afunda de vez a propalada mística política de Lula da Silva, além de expor as vísceras do partido do qual é um dos fundadores e que, agora, se resume a uma mera rede de vassalagem ao suserano de São Bernardo.

No documento de pouco mais de três páginas, escrito na cadeia e dirigido à presidente do PT, a senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR), o ex-todo-poderoso petista dá detalhes de sua participação nos governos de Lula da Silva e Dilma Rousseff e expõe, de forma clara e articulada, os subterrâneos das negociatas que deram origem a um verdadeiro plano para tomada do Estado brasileiro para fins pessoais e partidários.  Profundo conhecedor do ethos petista, Palocci, com a autoridade que poucos na legenda têm, questiona se o PT é “um partido político sob a liderança de pessoas de carne e osso ou somos uma seita guiada por uma pretensa divindade?”. Bem, a julgar pela reação da destinatária da carta, um partido político o PT não é mais.

Em entrevista publicada no jornal Valor na quinta-feira passada, a presidente do PT deixa claro que o bom destino do País é o que menos importa para seu partido hoje. 
Por meio de uma narrativa que muito se aproxima do fanatismo religioso, Gleisi Hoffmann deixa claro que para o partido que preside nada mais importa do que a defesa inarredável da inocência de Lula da Silva, não obstante a condenação já sofrida pelo ex-presidente na Justiça, a primeira em sete processos a que responde.

Quando não se ocupa de defender a candidatura de Lula na eleição de 2018, Gleisi Hoffmann presta-se a tentar desqualificar, pateticamente, as alegações de Antonio Palocci, como se proviessem de algum estranho, e não de uma figura central do partido, alguém que teria sido ungido por Lula para sua sucessão não fossem os “ilícitos” do ex-ministro, como ele chama seu passeio pelo Código Penal.  Para terem valor jurídico, é evidente que as alegações de Antonio Palocci contidas em sua carta de desfiliação do PT – uma extensão do depoimento espontâneo que o ex-ministro prestou ao juiz Sérgio Moro – deverão vir acompanhadas por provas do que lá vai escrito. Entretanto, trata-se, desde já, de um dos mais contundentes documentos políticos de nossa história recente.

Fonte: Editorial - O Estado de S. Paulo


Rio, uma cidade acuada - Conheça o penoso cotidiano de quem vive uma guerra urbana

Vítima da letal combinação entre falência do Estado e crescente domínio do tráfico, a Cidade Maravilhosa se torna refém da violência e do medo que se espalha por todas as classes sociais. Como esse inferno foi criado e o que pode ser feito para resgatar a paz

A rotina da sociedade carioca mudou completamente nas últimas semanas. Tanques de guerra e homens vestidos para a batalha se impõem ostensivamente, alterando as paisagens da segunda maior cidade brasileira e cartão postal do País. Soldados com máscaras de caveira anunciam o horror do confronto com traficantes. Marcas de bala em muros de residências antes seguras são um termômetro da frequência dos tiroteios. 
 CONTROLE Forças Armadas entram na Rocinha para tentar conter a guerra entre traficantes. Na última década, o governo recorreu a essa solução 12 vezes (Crédito: Leo Correa)

 Estabelecimentos fechados interrompem o fluxo do comércio e até a tradicional boemia associada ao estilo de vida dos cariocas tem hora para acabar, com bares e restaurantes tradicionais de bairros como a Lapa fechados ao escurecer para segurança da clientela.

Crianças impedidas de ir às aulas veem seu futuro comprometido. Refém do crime, do medo e da inércia do poder público, a cidade agoniza em um triste retrato da supremacia da violência. Das 1.025 comunidades da capital, 843 estão sob domínio de traficantes ou de milicianos. Só nos três primeiros meses deste ano, houve 1.867 vítimas de homicídios, roubos, agressões e operações policiais. Nas últimas semanas, com a disputa pelo controle do tráfico na Rocinha, a tensão extrapolou os limites do morro e atingiu todas as camadas da sociedade. Sinais de que se trata de uma guerra se alastram pela cidade que hoje, antes de fazer jus ao título de maravilhosa, se apresenta ao mundo como devastada.

As consequências desse poderio se mostram das formas mais perversas no dia a dia. O crime passou a controlar a circulação de carros e ônibus nas comunidades. Na quarta-feira 27, embora sete das nove escolas da Rocinha tivessem voltado funcionar, poucos alunos foram às aulas. Uma massagista foi demitida do emprego em uma clínica de Ipanema por ter faltado. “O patrão não está nem aí se eu tinha com quem deixar minha filha pequena ou não”, disse, chorando.


Muitos coletivos não conseguiram transitar nas ruas tomadas pelo Exército, impedindo que moradores pudessem sair para trabalhar. Um motorista de Uber que não quis se identificar disse à ISTOÉ que vigilantes armados identificam a luz do celular acoplado ao painel do carro e o interceptam. “Mesmo com filtro nos vidros, eles mandam o carro parar exigindo pagamento. Estão sempre com uma arma na cintura”, afirma ele, que já teve de pagar R$ 50 para buscar uma passageira na zona norte. Segundo registros em delegacias, cinco motoristas são vítimas de extorsão por dia.

Em meio às intensas trocas de tiros, instituições de ensino próximas às comunidades vêm tomando precauções sem esperar pelas autoridades. A Escola Alemã Corcovado, em Botafogo, no mesmo bairro em que está localizado o Morro Dona Marta, primeiro a receber uma UPP, providenciou uma passagem subterrânea para os alunos caminharem do estacionamento às salas de aulas. Trata-se de uma garagem no subsolo usada para a saída de alunos e funcionários em situações adversas. A escola já chegou a suspender o recreio dos alunos em função dos tiroteios. Medidas como essas não são exageradas quando se toma por base o caso de duas crianças e um bebê atingidos por balas perdidas em julho desse ano. Mesmo fora das regiões de confronto, muitos cariocas deixam de sair à noite por medo, e a vida noturna na cidade sofre um violento baque. 


 MASCARADOS Soldados utilizaram bataclavas com imagens de caveira: política de confronto se sobrepõe aos investimentos em inteligência (Crédito:Fernando Frazão/Agência Brasil)

O restaurante Frontera, no Jardim Botânico, teve redução de 50% no movimento. Na sexta-feira 22, o Braseiro, “point” do Baixo Gávea, no bairro homônimo, vendeu dois barris de chope ao invés dos habituais sete. Outros pontos que outrora ferviam na noite carioca, como a Lapa, no Centro, e a Rua Conde de Bernadotte, no Leblon, agora sobrevivem apenas. Na Lapa, o centenário restaurante Nova Capela passou a fechar as portas mais cedo devido à violência da área. Ninguém do estabelecimento quis dar entrevista. “Com o movimento em baixa e sem segurança, quem pode aguentar?”, questiona o garçom de um bar vizinho, na região mais boêmia do Rio.
 


(...) 

FORÇAS ARMADAS
Ao longo da última década, o governo do estado do Rio recorreu 12 vezes a intervenções das Forças Armadas. “A situação mostra uma crise periódica e permanente. Faz-se uso de um modelo militarizado que não resolve o problema”, diz Ignácio Cano, sociólogo e coordenador do Laboratório de Análise da Violência da Universidade Estadual do Rio de Janeiro.n
“A preseça dos militares tem um custo muito alto e não representa uma mudança de cenário no longo prazo.” Entre 2014 e 2015, a presença de soldados no Complexo da Maré por 15 meses custou aos cofres públicos R$ 600 milhões e a favela até hoje sofre com os mesmos problemas. Por trás da falência no combate ao crime está também a falta de investimento. Contas do governo estadual revelaram que gastos com “informação e inteligência”, fundamentais para o combate ao crime, foram reduzidos a zero no ano passado, quando a despesa com a segurança pública consumiu R$ 9,1 bilhões. 


EXÉRCITO A atuação das Forças Armadas na Rocinha teve duração de oito dias. Segundo o ministro da Defesa, Raul Jungmann, a favela está estabilizada (Crédito:Bruno Itan / Parceiro / Agência O Globo)

Do total, R$ 7,68 bilhões foram destinados à administração geral, ou seja, pagamento de salários. “Policiais acreditam que o trabalho se restringe à lógica de confronto e dão pouca importância à inteligência”, diz Silvia. Para ela, com a entrada massiva de fuzis nas favelas, houve uma “bopetização” da polícia, neologismo que se refere à atuação do Batalhão de Operações Policiais Especiais (BOPE), famoso pelos métodos violentos. Os policiais que usam máscaras de caveira ao subir o morro são prova.

A predominância de fuzis no arsenal dos traficantes de drogas revela o quanto o comércio de armas avançou no Rio. Em junho desse ano, policiais apreenderam 60 fuzis de guerra no Aeroporto Internacional Tom Jobim, o Galeão. “Isso mostra que as armas estão entrando pela porta da frente do País”, afirma Bruno Langeani, gerente de Sistemas de Justiça e Segurança Pública do Instituto Sou da Paz. “O aumento de munições apreendidas de calibre restrito, armas de maior poder de fogo, não tem comparação com nenhum outro estado brasileiro.” Segundo ele, a grande parte dos fuzis é vendida legalmente dos Estados Unidos para países como Bolívia e Paraguai e contrabandeadas para o Brasil. 

 Um dado revelado pelo relatório é que 42% das munições apreendidas em 2014 são de uma fabricante nacional. “Isso expõe as fragilidades no controle das munições brasileiras”, diz. Com uma média de 430 munições apreendidas por dia, é possível imaginar a disponibilidade bélica dos grupos de criminosos. Mais que uma reserva de balas para sustentar intensos tiroteios, eles dão demonstrações de seu poder de fogo disparando rajadas de tiros. Estima-se que cada bala de fuzil chegue a custar R$ 50. Para reverter esse cenário seria necessário aumentar a fiscalização da Polícia Rodoviária Federal, evitar que armas e munições fiquem por muito tempo nas delegacias e monitorar seus deslocamentos para acabar com canais de desvio. 

(...)

Há um vácuo no poder que agrava a violência em todo o Rio de Janeiro. O diagnóstico da socióloga do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania da Universidade Cândido Mendes, Julita Lembruger, explica-se pela ausência de declarações e ações efetivas do governador Luiz Fernando Pezão e do prefeito Marcelo Crivella diante do caos que dominou a favela da Rocinha nas últimas semanas. No dia 22, no estopim da crise, enquanto moradores viviam momentos de pânicos com o confronto entre traficantes e homens das Forças Federais, o prefeito demorou quinze horas para se manifestar por meio de nota.

Limitou-se a pedir que as pessoas evitassem áreas onde estivessem ocorrendo ações militares. Na quarta-feira 27, dez dias após o início dos conflitos, aos gritos de “sumido”, o prefeito visitou a Rocinha. O governador Pezão também se pronunciou apenas para dizer que sabia da invasão de traficantes, mas por cautela, desautorizou qualquer ação da polícia. “São afirmações inócuas, sem projetos, sem ideias. As favelas vivem um verdadeiro apagão”, diz Silvia Ramos, cientista social.

 MATÉRIA COMPLETA em Isto É



 

Guerra de Poderes compõe o cenário de anarquia desejado pelos pregadores da ruptura

O grau de influência de Hamilton Mourão sobre os quartéis é tema controverso, mas o general que sonha com um golpe tem uma tropa. São apenas três soldados, que não usam uniforme. Valem, contudo, por várias divisões blindadas. Seus nomes: Luís Roberto Barroso, Luiz Fux e Rosa Weber.  Quando determinou o afastamento de Aécio Neves do mandato e medidas cautelares restritivas de liberdade contra o senador, o trio decidiu cassar as prerrogativas do Congresso. O "caos", motivo sugerido por Mourão para sua intervenção militar, nasce do choque entre Poderes fora do marco da Constituição.

O STF flerta, há tempos, com o "caos". A prisão do senador Delcídio do Amaral, em novembro de 2015, deu-se no limite da lei, pois foi avalizada pelo Senado. Depois, a maiorias dos juízes do Supremo entregou-se à anarquia.  A "suspensão temporária" do mandato de Eduardo Cunha, em maio de 2016, foi um exercício de direito criativo: a invenção de uma figura jurídica destinada a circundar a lei que reserva aos parlamentares a prerrogativa de cassar parlamentares. A sentença, qualificada como uma "excepcionalidade" pelo relator Teori Zavascki, serviu de precedente para a liminar de Marco Aurélio de afastamento de Renan Calheiros da presidência do Senado, em dezembro passado.

O "caso Renan" manchou duas vezes a reputação do STF, pela emissão da liminar ilegal e, na sequência, por um intercâmbio de bastidores que conduziu ao recuo da Corte e à retirada de Calheiros da linha sucessória, outra pena emanada da caverna do direito criativo. O episódio desenrolou-se como confronto mafioso de Poderes, pontuado pelas ameaças do senador de votar leis de supressão de privilégios corporativos do Judiciário.

O Supremo existe para proteger-nos da "excepcionalidade". Nosso STF, porém, como evidencia o "caso Aécio", viciou-se na exceção. Os juízes não têm a prerrogativa de suspender mandatos e, não podendo decretar soberanamente a prisão preventiva de parlamentares, não podem, igualmente, impor-lhes medidas restritivas de liberdade.  A lei é geral: vale para Aécio, Calheiros, Cunha, o diabo e a avó do diabo, o PMDB, o PSDB ou o PT. O trio de juízes opera ao arrepio da ordem legal como registrou um Calheiros que, para defender a própria pele, organiza a reação parlamentar à cassação branca de Aécio. "Caos": a soma de um STF que ignora a Constituição com um Congresso que, mesmo desprezado, tem agora a oportunidade para desmoralizar juízes sem juízo.

Mourão, ponta emersa de uma embrionária articulação golpista de raízes civis, transita na geografia do "caos". Os constituintes de 1988, lembrou Jorge Zaverucha (Folha, 27.set ), contaminaram a ordem democrática com um pingo de ambiguidade, redigindo o artigo 142 de modo a propiciar dupla leitura. O artigo estabelece que as Forças Armadas "destinam-se", entre outras funções, à "garantia da lei e da ordem".  Na interpretação literal, sustentada pelo fio implícito da adesão filosófica aos princípios da democracia, a hipótese de intervenção militar depende de iniciativa do Executivo. Mas, na tradução livre, de inspiração autoritária, a missão de garantia da ordem é um dever absoluto, um "destino" não sujeito a limitações. É disso que fala Mourão, quando alega curvar-se à Constituição.

Na Europa, imigração e terrorismo alimentam os discursos da ascendente direita nacionalista. Por aqui, a corrupção e o crime organizado desempenham papéis similares, nutrindo uma "nova direita" que cultua a "idade de ouro" da ditadura militar. A guerra de Poderes que já não reconhecem fronteiras legais desenvolve-se sobre essa paisagem, compondo o cenário de anarquia desejado pelos pregadores da ruptura. Os magistrados talvez imaginem que afastam a sombra de Mourão ao violar a lei para combater a corrupção. Enganam-se: fora da lei, existe apenas a força.



Fonte: Demétrio Magnoli - Folha de S. Paulo


Ficha Limpa não pode ter eficácia limitada




A lei apenas estabeleceu critérios para serem obedecidos no momento do registro da candidatura, portanto não cabe aplicar a ela o conceito da não retroatividade


O momento por que passa a sociedade, de enfrentamento da corrupção, se desdobra em várias frentes, ampliadas à medida que organismos de Estado avançam na identificação de esquemas de corrupção conectados a partidos da situação e oposição, a grandes empresas e que se entranharam no Executivo com a chegada ao Planalto do PT. A legenda não inventou a corrupção no Brasil, mas a praticou de forma sistêmica, como amplamente comprovado.

Em reação a este movimento, Polícia Federal e Ministério Público entraram no combate aos malfeitos até que chegou ao Judiciário o primeiro importante resultado do trabalho de investigação e denúncia de poderosos, com o processo do mensalão, julgado pelo Supremo. Estrelas do PT (José Dirceu, José Genoíno etc.) foram condenadas, numa sinalização republicana forte de que a lei é mesmo para todos.

Foi dentro deste espírito de se dar um basta a um traço aristocrático do país, o da impunidade, quando se tratam de homens públicos conhecidos, que, em 2010, um projeto de origem popular, sustentado em 1,3 milhão de assinaturas, terminou aprovado pelo Congresso. Criou-se a Lei da Ficha Limpa, para se acabar com um dos vários pontos cegos da legislação que permitiam que condenados por crimes graves, já em duas instâncias, conseguissem se candidatar e poder obter imunidades para continuarem impunes.

Ao permitir que crimes confirmados no julgamento do recurso do condenado à segunda instância tornem a pessoa inelegível por oito anos, a Ficha Limpa passou a ser um dos marcos legais chave para o combate à corrupção e à sua infiltração no Estado.
Mas, como nada é fácil neste campo, também a Ficha Limpa corre risco, num julgamento no Supremo de processo em que o vereador baiano Dilermando Soares, do interior do estado, questiona sua inelegibilidade, porque cometera crime que o enquadrara na lei antes de junho de 2010, quando ela foi promulgada.

Retomado o julgamento, o ministro Luiz Fux, que pedira vista, rejeitou a tese da defesa, e foi seguido por mais quatro votos (Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Rosa Weber e Dias Toffoli). O placar está 5 a 3 (os três são o relator Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes e Alexandre de Moraes).  Faz todo sentido o argumento, até agora vencedor, de que a Ficha Limpa criou um critério a ser aplicado no momento em que o político apresenta o pedido de registro de candidatura, sem importar quando o crime foi cometido. Não vale neste caso, portanto, a norma da não retroatividade da lei.

O julgamento deve ser retomado na quarta, e espera-se que a tendência dos votos seja mantida. Observam-se várias investidas para reduzir a margem de ação de agentes públicos que trabalham na repressão à corrupção. Com este objetivo, são feitas emendas cavilosas em projetos de leis em tramitação no Congresso, e chegam a tribunais processos que podem levar a novas interpretações de leis, caso da Ficha Limpa. São manobras previsíveis. O importante é ter-se a consciência de que se trata na verdade da reação de forças contrárias à limpeza da vida pública.

Fonte: Editorial - O Globo