Ala do partido faz três exigências para, quem sabe!, votar em favor da reforma da Previdência: uma aceita, uma inaceitável e outra indecorosa
Eu tenho
alguns problemas que são, admito, também de fundo moral com o que se
chama habitualmente de “gente fingida”. A ala tucana que quer romper com
o governo alega, intramuros, que o partido não pode arcar com o peso da
impopularidade da gestão Michel Temer. Sei… Será que os números serão
os mesmos no ano que vem? Mas deixemos isso pra lá agora. Havia outro
elemento silencioso a pressionar em favor da retirada: os tais “cabeças
pretas” não queriam e não querem se comprometer com a reforma da
Previdência. E aquele conversa de “votaremos a favor do Brasil, mas não
precisamos, para isso, de cargos?” Neste blog, escrevi faz tempo: isso
aí é medinho não-declarado da reforma. E isso agora está claro.
O partido,
ou fatia considerável dele, faz três exigências para votar a favor das
mudanças. E olhem que Ricardo Trípoli (SP), o líder da legenda na
Câmara, ainda assim, não garante os 46 votos, não. Os tucanos querem:
a: integralidade no benefício por invalidez, não importa o local do acidente, se no trabalho ou não;
b: que a pessoa possa acumular benefícios, como aposentadoria e pensão, desde que não ultrapasse o teto de R$ 5.531;
c: que os servidores que ingressaram na
carreira até 2003 tenham aposentadoria integral (igual ao último
salário) e que não valha para eles a regra da idade mínima; para tanto,
teriam de pagar um pedágio.
Passo por cada uma rapidamente, destacando que as três propostas elevam os gastos em vez de diminuir:
– a primeira, a da invalidez, pode ser
considerada aceitável. Afinal, estamos a falar de pessoas que, em tese
ao menos, têm mais dificuldades para encontrar fontes alternativas de
renda;
– a segunda, a do acúmulo, já é
inaceitável porque, como se nota, não vincula o teto do recebimento ao
valor da contribuição ou ao tempo. O estabelecimento do teto não elimina
o fato da acumulação de vencimentos;
– a terceira, a dos servidores, além de inaceitável, é indecorosa.
[uma pergunta sobre uma situação hipotética, mas que existe aos milhares: um servidor ingressou no serviço público em 2002 e desde então tem contribuído sobre o salário integral - vamos supor R$15.000,00, alíquota de 11% - e por ter apenas 45 anos, tem que trabalhar no mínimo mais 17 anos.
[uma pergunta sobre uma situação hipotética, mas que existe aos milhares: um servidor ingressou no serviço público em 2002 e desde então tem contribuído sobre o salário integral - vamos supor R$15.000,00, alíquota de 11% - e por ter apenas 45 anos, tem que trabalhar no mínimo mais 17 anos.
Óbvio que seu salário de quinze mil reais não pode ser reduzido.
Mesmo
que passe a contribuir sobre apenas o teto do INSS - quase R$ 6.000,00 -
e com alíquotas que começam em 8%, atingindo os 11% apenas sobre o
valor acima de quatro mil e poucos reais, ele contribuiu durante mais de
quinze anos com um valor quase quatro vezes o máximo que o trabalhador
da iniciativa privada contribuiu (o máximo atual do INSS, iniciativa
privada, fica abaixo dos seis mil reais).
É justo que quando este camarada que hoje contribui com R$1.650,00 - situação que perdura há quinze anos - ao se aposentar, receba no máximo R$5.800,00 (valor aproximado do teto do INSS)?
NÃO. É necessário que haja uma regra de transição, que permita que sejam consideradas as duas situações.]
Cadê o
partido que votaria a favor do Brasil, estando ou não no governo? É
admissível que sejam os tucanos a abrir uma brecha como essa, numa
reforma que, convenha-se, já é mitigada? Observem que a alteração
mexeria com duas questões essenciais de uma proposta que já é bastante
suave e aquém das necessidades: idade mínima e vencimentos integrais
para servidores.
Nesta
terça, Rodrigo Maia (DEM-RJ), presidente da Câmara, que fala com
entonação de Torquemada contra os gastos quando dialoga com os tais
mercados, resolveu dar piscadelas para as propostas dos tucanos. Sim, de
forma realista, admitiu que já é difícil aprovar a reforma com os votos
do PSDB; sem eles, ficaria praticamente impossível. Daí ter dito que
talvez conviesse ao governo ceder às ditas sugestões, que sugestões não
são. Aécio Neves, presidente licenciado, defende o apoio à proposta do
governo e quer que o partido feche questão. Mas parece que isso não
acontecerá.
A verdade é
que o PSDB não tem ideia nenhuma para a Previdência que não seja tentar
garantir alguns privilégios que a já mitigada reforma do governo não
prevê. A carta de intenções do partido, tornada pública nesta terça,
deixa isso muito claro pelo caminho da omissão.