Pantomima de Marco Aurélio tira da pauta abuso de autoridade [e suspende, 'ad infinitum', atividades da Comissão dos supersalários.]
Patuscada de ministro teve ao menos um efeito desejado por juízes e procuradores; abusos continuarão sem punição. E ainda dizem ser essa a voz das ruas
A destrambelhada e ilegal liminar de
Marco Aurélio Mello já surtiu um dos efeitos desejados: Renan Calheiros
(PMDB-AL), presidente do Senado, desistiu de pôr para votar o projeto
que muda a lei que pune abuso de autoridade. Vamos ser claros? Era ou
não era o que queriam os sindicatos de juízes? Era ou não era o que
queriam os promotores? Era ou não era o que queriam os procuradores?
Tenho 55 anos. Um amigo 15 anos mais
maduro me disse outro dia: “Renan Calheiros é louco? Ele já viu alguém,
no Brasil, desde as capitanias hereditárias, vencer uma braço de ferro
com juízes?”. Pois é. Não sei se o presidente do Senado estava fazendo
tal competição. O fato é que ele sentiu o peso que tem juízes,
promotores e procuradores.
Convenham: até outro dia, o alvo era
Eduardo Cunha. Renan era deixado meio de lado. Ele só virou a Geni das
ruas porque foi essa a pauta dos togados e da turma do MPF, certo? Ele
só entrou na mira por causa do projeto que muda a lei que pune abuso de
autoridade; ele só se tornou a caça quando decidiu instituir a comissão
dos supersalários.
Se setores consideráveis da imprensa e os
idiotas não estivessem mesmerizados pela pauta policial, isso teria
sido percebido de pronto. Renan viu que enfrentar essa turma é coisa
para quem topa um jogo mais pesado do que aquele a que ele próprio está
acostumado.
Caras e caros, por que eu vivo dizendo
que procuradores e juízes não podem fazer política e participar de
passeata, seja de coxinhas, seja de mortadelas? É simples: procuradores
pedem para prender e para fazer mandado de busca e apreensão. E juízes
autorizam.
Ora, a soma das duas prerrogativas pode
liquidar carreiras e destruir vidas. Apareça na televisão como alvo de
coisa parecida para ver se consegue um emprego depois… A liminar absurda
de Marco Aurélio para destituir Renan da Presidência do Senado foi
concedida na véspera de votação do tal projeto, que as duas categorias
rechaçam.
Renan, que ainda não foi denunciado por
eventuais crimes da Lava Jato viu que desafiar os togados é coisa muito
séria. Pode-se ficar a um passo da cadeia. Ele desistiu.
Afirmei aqui que a pauta de Marco Aurélio
era corporativista, não? Que um dos objetivos era esse. Pronto! Está
aí. A coisa está feita.
O texto aprovado na Câmara, que é mesmo
ruim, instituindo o crime de responsabilidade para juízes e membros do
MP foi para as calendas. O de abuso de autoridade do Senado também foi
adiado sem prazo, tudo indica. Agora só falta os doutores tentarem
mandar para os ares a comissão dos supersalários. [que ainda não foi implodida mas paralisou todas as atividades - paralisia que terá continuidade durante e após o recesso parlamentar.
Será esquecida.]
E tudo fica como está. Afinal, o brasileiro médio e pobre acha
que a justiça é capenga no Brasil por culpa dos políticos. Um dia, quem
sabe?, talvez se lembrem de indagar a responsabilidade de juízes e de
membros do Ministério Público no quadro clamoroso de injustiças.
Fonte: Blog do Reinaldo Azevedo