Guilherme Fiuza
Se liga. Vê se não vai se engraçar pelo submundo da desinformação e aparecer com críticas ao processo eleitoral impecável conduzido pelo TSE
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Decálogo da nova democracia brasileira:
- Em primeiro lugar, cala a boca que eu não te perguntei nada. Vai se acostumando ao status silencioso, em nome da paz e do amor. De preferência nem pensa, porque do jeito que você é horrendo o seu pensamento tende a ser uma usina de ódio. Chegou o tempo da harmonia, não há espaço para o que vem da sua mente;
- Um pensamento lhe será sempre permitido. Ou melhor, dois: pense duas vezes antes de abrir a boca. Nessa linha o seu livre pensar está garantido pelos talibãs do amor, a nova casta que te governa.
- Pensando duas vezes, na segunda vez o seu pensamento com certeza virá coalhado de verdades amorosas, as quais você poderá expressar livremente. Por exemplo: a eleição presidencial foi limpa. Isso é uma verdade que conforta o coração talibã;
- No assunto eleição 2022 você já sabe: se não andar na linha, babau. O talibã brasuca tem neste assunto um dos seus grandes totens. Se liga. Vê se não vai se engraçar pelo submundo da desinformação e aparecer com críticas ao processo eleitoral impecável conduzido pelo TSE, a corte talibã que prende e arrebenta em nome do bem. A nova Constituição não escrita (escrever toma muito tempo e não leva a nada) aconselha inclusive o cidadão a jamais pronunciar a palavra “auditável”. Obedeça, não seja um subversivo;
- Se uma audiência no Senado trouxer servidores e técnicos mostrando por A + B que o processo eleitoral foi imundo, obscuro, pervertido, manipulado, completamente irregular e consagrou a volta de um ladrão à cena do crime, você tem as seguintes opções para reagir a isso:
- Finge que não viu;
- Nega tudo;
- Espera o William Bonner negar tudo às 20:30 e repete tudo que ele disser;
- Chama todo mundo de golpista;
- Pede ao Alexandre de Moraes pra avisar aos mortais que o Senado não manda porra nenhuma e vai ser multado em R$ 1 bilhão por hora cada vez que inventar uma audiência antidemocrática e fora de hora como essa aí;
- Jamais desrespeite a liberdade de expressão das urnas brasileiras. Elas têm vontade própria, e seu direito de escolha é garantido pelo TSE. Se a urna escolher um amor bandido, por exemplo, isso é problema dela. Se você teclou outra coisa no dia da eleição, paciência. Respeite a diversidade. Não queira atrair a urna eletrônica para o seu pensamento único;
- Quem não respeitar a vontade (própria) das urnas será processado por assédio eleitoral;
- Quem não disser que o Lula é inocente será processado por assédio político;
- Quem não disser que o Alexandre de Moraes manda na porra toda será processado por assédio alexandrino;
- Quem não disser que a expressão “Perdeu, mané” consagrou Luís Roberto Barroso como o novo Montesquieu, deixando no chinelo aqueles iluministas chinfrins do passado, que nem sabiam quem era João de Deus, será processado por assédio filosófico;
- Quem disser que nada disso pode ser feito contra o cidadão porque não está na lei provocará uma gargalhada geral no próximo banquete dos supremos talibãs. A não ser que você tenha a ideia genial de desistir de ser mané.
- Leia também “Eleição à la carte”
- Guilherme Fiuza, colunista - Revista Oeste