Opinião
Descrédito impõe que próximo presidente da Câmara paute pedidos de impeachment
De lá para cá, Bolsonaro acumulou nova e farta coleção de vilezas, notadamente na sabotagem aberta às políticas de combate à pandemia, cujo fracasso nacional culminou na tragédia de Manaus. Hoje, 42% apoiam o impeachment, ante 53% contrários à medida. Compreende-se que a opinião pública e, por extensão, o mundo político hesitem diante de intervenção tão drástica. Há indicadores mais evidentes da deterioração da imagem do mandatário, que para metade dos brasileiros não tem condições de liderar o país.
Conforme o Datafolha, a aprovação a seu governo caiu de 37%, em janeiro, para 31%. No período, os que consideram a gestão ruim ou péssima passaram de 32% a 40%, cifras semelhantes às do pior momento desta administração, em junho (32% e 44%, respectivamente). Desde Fernando Collor, que não concluiu seu mandato, um presidente eleito não ostentava números tão ruins a esta altura. Ainda assim, Bolsonaro dispõe de apoio suficiente para tornar difícil o avanço de um processo de impedimento já —embora a pregação mortal contra medidas de distanciamento, a defesa charlatona de medicamentos ineficazes e a ofensiva infame contra a vacinação possam facilmente ser consideradas crimes de responsabilidade.
Mesmo calcada em fundamentos jurídicos, a deposição institucional de um mandatário é evento sobretudo político. E, como se percebe na disputa pelos comandos da Câmara dos Deputados e do Senado, a providência não conta, até aqui, com a ampla maioria corretamente exigida pela Constituição. Para esta Folha, o impeachment é recurso extremo, vagaroso e sempre traumático. Infelizmente não há como ignorar, todavia, a conduta indigna de Bolsonaro, nem os quase 60 pedidos de abertura de processo que aguardam decisão já tardia —e cujas motivações têm amparo em não poucos pareceres jurídicos, como mostrou o jornal. Analisá-los é imperativo para o próximo presidente da Câmara, e congressistas não devem se esquivar de debater às claras seus fundamentos. Trata-se de resposta que não pode ser sonegada à sociedade.[decisão privativa do presidente da Câmara - eleito por seus pares, que receberam delegação da sociedade para decidir sobre este e outros assuntos.]
Opinião - Folha de S. Paulo