Só um cego não vê o que se desenha
[o que pega na pergunta é que o Lula é um condenado, um presidiário, não tem direitos políticos, não pode chamar ninguém às ruas; achamos intempestiva a manifestação, mas mesmo intempestiva ela não pode ser convocada por sentenciados - devido a sentença impedir e ao fato de estarem na jaula.]
Imagine que o
presidente da República fosse Lula. E que, sentindo-se fraco, ele
admitisse participar de manifestações de ruas convocadas por seus
devotos para apoiá-lo e protestar contra o Congresso e o Supremo
Tribunal Federal que o estariam impedindo de governar. A essa altura, o que
os adversários de Lula diriam? No mínimo, que ele quer emparedar os
demais poderes da República jogando o povo contra eles. No extremo, que
Lula trama um golpe para acabar com a democracia e governar sozinho.
E se os ministros que
cercassem Lula em Brasília fossem generais da reserva? E se os
comandantes militares calados estivessem e assim permanecessem? A
propósito: ameaçada pelo impeachment, Dilma quis decretar o Estado de
Emergência. Os militares disseram não. [é tradição que quando os militares entendem necessário uma manifestação mais presencial - sem o uso, para alerta, do Twitter - eles realizam atos mais efetivos.
Manifestação intempestiva, apenas para responder a uns imbecis que consideram CONTINGENCIAR e CORTAR sinônimos, é perder tempo, se desgastar a toa.]
No ano passado, ao sinal
de que Lula poderia ser solto, Eduardo Villas-Bôas, comandante do
Exército, postou uma mensagem no Twitter ameaçando o Supremo. Lula segue
preso. Villas-Bôas despacha no Planalto. Sérgio Moro, no Ministério da
Justiça. Ou falta inteligência
política ao presidente Jair Bolsonaro, ou ele é louco, ou, como disse o
ex-presidente José Sarney em entrevista no último fim de semana ao
jornal “Correio Braziliense”, Bolsonaro está “no olho de um furacão e
joga todas as suas cartas no caos”.
De Sarney se poderá dizer
tudo, menos que lhe falte experiência aos 89 anos de idade, 52 dos
quais vividos como deputado e senador, fora os quatro anos como
governador do Maranhão e os cinco como presidente da República. Já viu
tudo que gostaria ou não de ter visto. O furacão ao qual Sarney
se refere foi provocado por Bolsonaro que não governa, que só se aplica
em desatar crises, quase uma por semana. A um presidente responsável e
bem-intencionado caberia desinflar crises e debelar furacões criados à
sua revelia.
Bolsonaro passou 28
longos anos na Câmara dos Deputados e está cabalmente demonstrado até
aqui que nada aprendeu. Eleito presidente por “milagre” como ele mesmo
reconhece, não se preparou para tal, e não parece interessado em
preparar-se. Mas de golpe entende. Defendeu o golpe de 64.
Defendeu a ditadura militar que se arrastou por 21 tenebrosos anos.
Defendeu a tortura de opositores do regime. Lamentou que a ditadura
tenha matado menos gente do que mata o carnaval. [Bolsonaro defendeu práticas perfeitamente necessárias para o restabelecimento da ORDEM PÚBLICA e a manutenção do BRASIL INDEPENDENTE e SOBERANO.] Jamais se penitenciou
por ter dito todas essas infâmias.
Mesmo que acabe
convencido por seus generais de pijama de que não deve comparecer às
manifestações marcadas para o próximo domingo, só ter cogitado de ir é
uma prova de sua insanidade ou de sua disposição por ora reprimida de
forçar uma ruptura institucional. De resto, terá estimulado
seus seguidores a ocuparem as ruas em sua defesa e em ataque ao
Congresso e à Justiça. Por sinal, foi o que fez ontem ao compartilhar no
WhatsApp um texto favorável às manifestações e ao dizer que o problema
do Brasil “é a classe política”.[na qual ele fez questão de se incluir, lembrando ainda ser daquela classe.]
Só não enxerga o que se desenha no horizonte quem é cego ou se recusa a ver.