Bolsonaro revoga artigo da Medida Provisória 927 que previa a suspensão dos contratos de trabalho e de salários por quatro meses, que provocou uma enxurrada de críticas. Ministro da Economia, Paulo Guedes, cita mal-entendido e má redação do texto
A Medida Provisória 927 permitindo suspender os contratos de trabalho por quatro meses gerou uma enxurrada de críticas e fez o Palácio do Planalto retroceder, numa clara demonstração de que houve uma derrapada no Executivo. “Determinei a revogação do art.18 da MP 927 que permitia a suspensão do contrato de trabalho por até 4 meses sem salário”, escreveu o presidente Jair Bolsonaro no Twitter. À noite, o Diário Oficial da União, em edição extra, publicou a MP 928 que, entre outros pontos, traz a revogação do artigo. [a MP 928, também suspende os prazos para que sejam enviadas as respostas de pedidos feitos via Lei de Acesso à Informação (LAI).]O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) editou a uma Medida Provisória (MP) que suspendeu os prazos para que sejam enviadas as respostas de pedidos feitos via Lei de Acesso à Informação (LAI). O mecanismo, que existe desde 2011, permite que qualquer cidadão solicite informações a órgãos públicos municipais, estaduais e federais, como os próprios poderes Executivos, Legislativos e Judiciário.
Anteriormente, ao comentar a MP 927, editada na noite de domingo, o chefe do Executivo disse, também pela rede social, que o governo poderia prestar auxílio aos empregados. “Esclarecemos que a referida MP, ao contrário do que espalham, resguarda ajuda possível para os empregados. Ao invés (sic) de serem demitidos, o governo entra com ajuda nos próximos 4 meses, até a volta normal das atividades do estabelecimento, sem que exista a demissão do empregado”, afirmou. No entanto, ele não deixou claro como se daria o auxílio para os empregados atingidos pela medida.
Antes de anunciar a revogação do artigo, Bolsonaro disse, na saída da residência oficial, que a MP “flexibiliza a CLT”, numa referência à Consolidação das Leis do Trabalho. Ele apontou ainda uma outra medida, que permitiria colocar funcionários de férias. “É uma maneira de preservar empregos, diminui o tempo do aviso-prévio, permite que se entre em férias agora, que é melhor do que ser demitido. Basicamente, é por aí essa nossa medida.”
Já o secretário especial de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia, Bruno Bianco, afirmou que houve “má interpretação” a respeito do tema. “O presidente da República pediu que nós suspendêssemos esse artigo porque houve uma má interpretação. Eu acho que o presidente da República está correto, e o motivo é muito simples. As pessoas estavam entendendo que não teria nenhuma contraprestação do empregador e não é isso que estava no texto”, ressaltou. “A ideia do texto era muito clara: haveria uma contraprestação por parte do empregador, um acordo entre empregados e empregadores para que, obviamente, o empregador pagasse os custos do empregado sempre respeitando a Constituição Federal, que garante o salário mínimo para todos.”
Segundo o secretário, um novo documento será editado com a previsão de uma “contraprestação por parte do Estado” aos funcionários que tiverem seus contratos suspensos. “Diante dessa interpretação equivocada e do descasamento das medidas, que houve por conta de uma medida não ser orçamentária e a outra ser orçamentária, o presidente entendeu por bem uma revogação desse dispositivo e que nós pensássemos na próxima MP em um novo dispositivo que, aí sim, trouxesse as duas coisas em conjunto: a possibilidade de suspensão e também a contraprestação por parte do Estado”, declarou.
[caro secretário:
necessidade de extrema atenção ao redigir qualquer texto legal a ser promulgado pelo Presidente da República, clareza e exatidão são indispensáveis.
Além da necessidade de clareza e exatidão, inclusive são requisitos que reduzem a judicialização - prática que se tornou um vício desde a CF 88 - e, se tratando de norma promulgada pelo Presidente da República, tudo é examinado com rigor extremo, recebendo inclusive a atenção pessoal do 'corregedor-geral' dos 3 Poderes = um (;) onde se requer um (.) já justifica a condenação da norma.]
De acordo com Bianco, Bolsonaro pediu pressa na preparação da nova MP. “O presidente determinou celeridade. Estamos trabalhando nessa questão, como já estávamos. Mas toda medida que envolve custo e gasto depende de responsabilidade fiscal”, destacou. “Essa segunda (MP) demora um pouco mais do que as outras, mas o presidente pediu pressa, e soltaremos o quanto antes.”
GuedesEm entrevista à Agência Estado, o ministro da Economia, Paulo Guedes, também bateu na tecla da má interpretação. “Houve um mal-entendido. Começou todo mundo a bater e dizer que estão tirando do trabalhador. O presidente virou e disse: ‘Tira isso daí, está dando mais confusão do que solução’. Ele ligou para mim e perguntou. ‘PG, o que está havendo?’ Eu falei que era uma coisa boa, mas não normatizou”, contou. “Eu disse, presidente, ainda não está redondo. Ele disse: ‘Vocês arredondam e depois mandam’. Politicamente, ele fez certo. Foi uma precipitação mandar sem estar definido. A gente está querendo é evitar o pior.”
Ao ser perguntado sobre o próximo passo do governo, Guedes afirmou que haveria a anulação do artigo, como de fato ocorreu. “Mas tinha um pedaço que foi mal redigido. A gente queria proteger os trabalhadores de demissão. Faltou colocar a suplementação salarial. A ideia é fazer o que estão fazendo lá fora. Você pega um trabalhador que ganha R$ 2 mil, e a empresa não aguenta pagar. Aí, reduz à metade (o salário), cai para R$ 1 mil. O governo paga 25%. Acaba o salário caindo para 75% (do que era originalmente). A empresa paga 50%, o governo 25% e todo mundo perde um pouquinho.”
A medida provisória Confira os principais trechos da MP 927
Teletrabalho» Empregador pode mudar regime de trabalho presencial por trabalho a distância, sem necessidade de acordos individuais ou coletivos, avisando ao empregado com antecedência de 48 horas;» A responsabilidade pelos equipamentos necessários para que o empregado desempenhe a função em casa deve ficar firmada em contrato;» Caso o empregado não tenha os equipamentos necessários, o empregador poderá fornecer, ou as horas de trabalho ficam computadas como tempo à disposição do patrão;
Férias» Empregador pode antecipar as férias do empregado, avisando-o com antecedência de 48 horas;» As férias não podem ser em período inferior a cinco dias;» Empregado e empregador podem negociar antecipação de férias futuras;» O empregador pode optar em pagar o adicional de um terço das férias depois da sua concessão, até dezembro;» O pagamento da remuneração das férias concedidas pode ser efetuado até o quinto dia útil do mês seguinte ao das férias;» Empregador pode suspender férias ou licenças “não remuneradas dos profissionais da área de saúde ou daqueles que desempenhem funções essenciais”;» O empregador pode dar férias coletivas sem comunicar previamente ao Ministério da Economia e aos sindicatos;
Feriados» Empregadores podem antecipar a folga de feriados não religiosos, desde que o empregado concorde;» Os feriados podem ser utilizados como compensação do saldo em banco de horas;
Banco de horas» Empregador pode interromper as atividades e constituir regime especial de compensação de jornada, por meio de banco de horas, estabelecido por meio de acordo coletivo ou individual, para a compensação no prazo de até 18 meses;
Segurança e saúde no trabalho» Suspensa a obrigatoriedade de fazer exame ocupacional, exceto os demissionais;» Exame demissional poderá ser dispensado caso o exame médico ocupacional mais recente tenha sido realizado há menos de 180 dias;
Direcionamento do trabalhador para qualificação (REVOGADO POR BOLSONARO)» Contrato de trabalho poderá ser suspenso por até quatro meses, com suspensão de salário. Alteração será registrada na carteira de trabalho. A suspensão não dependerá de acordo ou convenção coletiva, podendo ser acordada individualmente;» O patrão poderá dar ao empregado ajuda mensal durante o período;» O empregado participará de curso ou programa de qualificação profissional não presencial oferecido pelo empregador;» Se não houver curso ou programa de qualificação, ou o empregado permanecer trabalhando para o empregador, a suspensão ficará descaracterizada;
FGTS» Empregadores não precisarão pagar FGTS dos meses de março a maio (com vencimento em abril, maio e junho de 2020);» O recolhimento poderá ser feito a partir de julho, em até seis parcelas;» Assim, os trabalhadores que poderiam fazer o resgate, não poderão nesse período.
Correio Braziliense