Durante a semana, falou-se muito da operação Triplo
X. O centro das operações foi o edifício Solaris, no Guarujá, onde Lula
tem um triplex, teria um triplex, ou acha que teve um triplex, ou
possivelmente só contemplava um triplex. Não é esse Triplo X que me
interessa tanto. O prédio caiu nas malhas da Operação Lava Jato e o
triplex com suas múltiplas explicações continuará em cartaz.
Traduzindo o X por uma incógnita, gostaria de
acrescentar mais um, que escapa da rede da Lava Jato, mas foi
brandamente recebido. É o fato de os dirigentes da Bancoop terem seus
apartamentos e deixarem centenas de famílias ao relento. Era um projeto
comum, que eles lideravam, no entanto abandonaram o navio como aquele
comandante do Costa Concordia, transatlântico que afundou na costa da
Itália. Ele foi condenado a 16 anos de prisão. Ali no Costa Concordia
havia vida em jogo. No Bancoop, apenas sonhos e economias para a casa
própria.
Nada mais corrosivo para uma proposta política que se
pretende igualitária: em caso de naufrágio, salvam-se os líderes, a
galera que se dane. Surgiram inúmeras defesas de Lula para livrá-lo das
garras da Lava Jato. Como sempre, algumas falam de um suposto
apartamento de Fernando Henrique. Ele é o norte moral: se fez, podemos
fazer também.
O advogado de Lula, Nilo Batista, busca uma outra
linha: o apartamento é pequeno, um Minha Casa Minha Vida, as obras de R$
770 mil no sítio de Atibaia, apenas um puxadinho. Até que ponto tudo
isso não é um preconceito? Com tantos blogs por aí, defensores
ardorosos, o PT não encontra uma única versão para esse quarto X: a
deslealdade da cúpula com os mutuários. Tudo por um apartamento diante
da praia de Guarujá. Na verdade era um futuro melancólico que foi
abortado pelas denúncias.
Vaccari era o presidente da Bancoop e tem um triplex
no Solaris. Ele está preso. Mas por outros motivos. O silêncio do PT
diante da Bancoop revela um pouco como o respeito, o medo, ou mesmo uma
vontade de proteger a cúpula a qualquer custo minaram seus fundamentos.
Se não fosse triplex mas um simples quarto e sala, se a empresa não
fosse envolvida no Petrolão, a cúpula do Bancoop, os seletos donos de
apartamentos escapariam das malhas do Lava Jato, mas não das malhas da
decência comum, negadas por comandantes que se salvam enquanto os outros
se ferram.
Embora exista um processo na Justiça, a oposição deu
pouca importância ao episódio. Mais um esqueleto num armário tão grande
como a sala de um museu de história natural. Existe um outro X para mim.
Houve grande empenho para soltar o empresário Leo Pinheiro. O objetivo
era afastá-lo da delação premiada. Zavascki, Lewandowski,
alguém o soltou no Supremo. Quando tudo parecia resolvido, surgem as
mensagens de Pinheiro. Seu telefone contava em mensagens parte do que
contaria em delação premiada.
O Triplo X traz de novo Pinheiro à cena. O Solaris
foi comprado pela OAS. O triplex que Lula ocuparia foi reformado pela
OAS. Tanto esforço para soltar o homem e ele reaparece em cena. Seus
tornozelos devem estar ardendo em regime de prisão domiciliar. O que
adiantou soltar Pinheiro? O volume de informações sendo processado é
muito grande e talvez a Lava Jato não dependa tanto de novas delações.
O fluxo de dados vai desvendando a Operação Triplo X e
se ela se aproximar de Lula através desses dois fatos secundários, um
triplex e um sítio, repetirá outras ocasiões em que a Justiça acabou
chegando por atalhos a estradas mais largas. De qualquer forma, sítio e
triplex são presenças concretas. No imaginário popular pesam mais do que
abstratas contas na Suíça. Maluf ou Cunha podem dizer que não têm conta
no exterior, e o mundo segue seu curso. Não há imagens.
Quando não são meras montagens, as fotos tendem a
reaparecer com mais nitidez e frequência quanto mais nebulosas forem as
explicações. Só a verdade pode devolvê-las, no seu tempo, ao silêncio
dos arquivos. Se o edifício é Solaris, que se faça luz. Por
enquanto, as sombras o cobrem, desde a origem quando os bancários foram
passados para trás.
Curioso é que Solaris também é nome de um oráculo
cuja função é exatamente fazer perguntas. E com a seguinte advertência:
perguntas irrelevantes, do tipo “Vai chover hoje?”, não serão
consideradas. Infelizmente, a consulta se faz num tempo difícil,
dominado por uma pergunta que o próprio oráculo não sabe responder: como
sair dessa maré?
Fonte: Fernando Gabeira - O Globo