O Globo
Hoje dá bananas, amanhã põe a língua de fora, não importa, o curso geral é este
Historicamente, governos isolados abrem caminho para grandes frentes de oposição, com um acordo básico em torno da democracia. [frentes de oposição??? no Brasil não existe isto? eles ainda estão discutindo se formam uma frente ampla, de centro (no caso se o centrão entra ou é descartado) de esquerda, social e por aí vai.
Na realidade, a maioria deles simula ser oposição para ver se desperta interesse para ser cooptado.]O discurso nazista de Roberto Alvim foi um momento especial em que essa possibilidade se mostrou.
Uma tática que me parece adequada diante de governos agressivos que tendem ao isolamento é a inspiração oriental: aproveitar o desequilíbrio de quem se lança ao ataque usando o seu próprio impulso. Bolsonaro, ao dar banana para a imprensa, acredita que a enfraquece. O mesmo vale quando se refere grosseiramente à repórter Patrícia Campos Mello. Na verdade, ele se isola mais. Entra aqui um outro elemento tático que é preciso discutir: os eleitores de Bolsonaro não podem ser confundidos com ele. Os próprios evangélicos, como nos Estados Unidos, podem estar se convencendo aos poucos de que Trump não os representa.
Hoje dá bananas, amanhã põe a língua de fora, não importa, o curso geral é este: o governo escolheu o isolamento e está ensinando o caminho para combatê-lo. Só uma ampla frente social pode responder a este momento. [?????] Hoje, o governo Bolsonaro expandiu a presença dos militares no centro das decisões. É mais um ângulo do seu isolamento. Foi incapaz de construir uma equipe na sociedade. Optou pelos seus guerreiros ideológicos, no caso de Weintraub, um guerreiro contra o português.
Restam ministros como Moro e Guedes, que são uma face do governo Bolsonaro mas não têm conseguido neutralizar o impulso para se isolar. Guedes falou o que não devia sobre servidores, comprometeu a reforma administrativa. [comprometeu? FHC os chamou de vagabundos, o que não impediu que o Congresso aprovasse o que ele queria.
É questão de preço. Felizmente, Bolsonaro quando pressionado a pagar, faz barulho - o que incomoda, mas, evita e até impede que o preço cobrado seja pago.
Vide Fundo Eleitoral o pretendido e o que foi concedido.] Referiu-se às empregadas não como um liberal o faria, mas como um aristocrata.
No caso de Moro, li uma notícia de que a mulher Rosângela escreveu que ele e Bolsonaro são uma coisa só. Não sabia. Vivendo e aprendendo. Ainda dentro do quadro de isolamento do governo coloco a frase do general Heleno sobre a chantagem do Congresso. Não exatamente a frase, mas a última palavra gravada: foda-se. [ofendem Jesus Cristo e o Supremo referenda quando decide que se trata de um mero exercício da 'liberdade de expressão'. Ou o exercício da tal 'liberdade' é defeso ao presidente Bolsonaro e seus auxiliares?]
A frase se refere a uma luta surda por um naco de R$30 bilhões do Orçamento. Na medida em que Bolsonaro se isola, o Congresso impõe uma nova divisão. O tema tem sido pouco discutido, inclusive a forma como os congressistas arrancam bilhões do Ministério do Desenvolvimento, às vezes para obras eleitoreiras.
Resta saber se o castigo virá antes ou nas eleições de 2022. O ideal é que viesse com elas. Processos de impeachment são traumáticos. Uma parte dos eleitores descrê da democracia. Mas há sempre uma negociação entre o trauma e o pesadelo. Às vezes, pesadelos tornam-se insuportáveis. Bolsonaro deveria pensar nisso. Mas o que falar com uma pessoa que dá bananas? Esperar apenas que não coloque a língua de fora ou decida se expressar com outras partes do corpo. Os dedos já estão ocupados simulando uma arma de fogo.
Fernando Gabeira, jornalista - Coluna O Globo