A escolha
O que o
país deveria estar discutindo é como amparar aquelas que decidirem interromper
a gravidez para que o façam sem risco
As mulheres brasileiras estão vivendo um pesadelo.
As que estão grávidas, as que gostariam de engravidar, as que ainda não sabem
se engravidaram ou não. A ameaça de que o embrião seja infectado pelo vírus da
zika e sofra as consequências devastadoras da microcefalia abriu um cenário de
horror em que um reles mosquito tem o poder de destruir o futuro de uma criança
e deixar um casal abandonado, sim, a seu próprio infortúnio, em um país que
jamais conseguiu tratar com mínima decência os que necessitam de cuidados
especiais.
[ainda não nenhuma prova de associação entre microcefalia e o
virus zika - essa associação foi imaginada, divulgada e maximizada
pelas que defendem o maldito aborto.]
É indecente que autoridades ousem afirmar que darão
todo apoio à criança e aos pais. Não é verdade. Como é falso que tenham de fato
se empenhado em combater esse mesmo mosquito maldito que há anos nos assombra
com a dengue. O nascimento de uma criança com microcefalia é uma tragédia que
fere uma família. Como essas famílias já são muitas e sabe-se que serão cada
vez mais, estamos confrontados a uma tragédia nacional. Não há tempo nem lugar
para hipocrisias.
Discutir se, sim ou não, as mulheres que desejarem
interromper a gravidez têm esse direito é um desrespeito. As únicas que podem
tomar essa decisão são elas mesmas, e já lhes basta a angústia e o sofrimento
que estão enfrentando, não precisam que alguém ainda venha lhes dizer que
cometem crime ou pecado. [a mortal 'imortal' se arvora em 'governadora
suprema do Universo' e decreta que as mães que desejarem assassinar o filho que
carregam no ventre, a pretexto de evitar que nasçam microcéfalas, estão livres
para assim proceder.
NADA DISTO. O assassinato de crianças
inocentes e indefesas continua sendo crime.]
Há limites para a insensibilidade, e esse caso é
uma fronteira entre a compaixão e a crueldade. O que o país deveria estar
discutindo é como amparar aquelas que decidirem interromper a gravidez para
que o façam sem risco. E como socorrer aquelas que decidirem prosseguir na
gravidez, em atos, e não com mágicas marqueteiras, que logo desaparecem da
vida real.
Ninguém tem o direito de decidir pela mulher. A
decisão é dela. Esse debate põe a nu, em um momento de extrema gravidade, o
imenso equívoco que é, na sociedade contemporânea, tentar impedir que cada um
escolha seu destino. Porque este é o fundamento do pensamento autoritário e sua
ambição, quer se trate dos direitos das mulheres, das relações homoafetivas ou
do direito de morrer com dignidade.[a VIDA, seja da criança ainda no ventre
materno ou do idoso preso ao leito continua sendo um DIREITO garantido
pela CONSTITUIÇÃO FEDERAL - estando alojado em um artigo do texto
constitucional protegido por CLÁUSULA PÉTREA.]
Em vão. Não existe mais um destino preestabelecido.
Cada um pensa, reflete, discute com os mais próximos, em círculos de confiança,
antes de agir. Já não age porque tem que ser assim, em respeito a tradições ou
hierarquias, mas porque decide que assim seja, por convicção. O direito
indelegável de tomar decisões responsáveis sobre questões de vida ou morte não
pode ser negado por leis caducas, que insistem em falar a uma sociedade que já
não existe e são surdas àquela que as interpela. [o DIREITO A VIDA
continua existindo e não está caduco, nem também as leis que o defendem; os que
o consideram caduco, mais cedo ou mais tarde serão afetados pela senilidade (e
muito provavelmente não desejarão ser eliminados por 'caduquice), mas, o
DIREITO A VIDA sempre existirá e protegido pela Constituição Federal.
Também, não pode ser olvidado - exceto
pelos ateus - que as LEIS de DEUS, ainda que milenares, permanecem em plena
vigência e nenhum dos DEZ MANDAMENTOS foi revogado e entre eles está o NÃO
MATARÁS.
Os valores de Deus são eternos, não
estão sujeitos ao tempo - que para Deus não existe - e menos ainda ao maldito
'politicamente correto'.
A propósito, tem um amigo que sempre diz
que apesar das descobertas tecnológicas que para os humanos são fantásticas, o
inferno continua sendo aquecido com enxofre.]
As leis não são imunes à pressão de uma
sociedade em constante mutação. Os tribunais têm se mostrado mais
sensíveis aos apelos da sociedade, ao modo pelo qual direitos se constroem e
limites éticos são definidos, do que o Congresso Nacional, que perdeu o
respeito da população e insiste em impor a todos normas e princípios de vida de
inspiração fundamentalista em que só um punhado de deputados se reconhecem.[que é a Sociedade
diante de valores sagrados, entre eles o DIREITO À VIDA? quantas centenas,
talvez milhares, de sociedade se extinguiram e nenhuma falta fizeram?]
É certo que os religiosos têm direito a
sua opinião como todos os cidadãos. Mas não se trata de um debate de
opiniões. Quem quer proibir a interrupção voluntária da gravidez não está
exprimindo apenas uma opinião. Está, no caso presente, impondo a uma mulher,
contra a sua vontade, um futuro que só ela pode decidir se quer ou não assumir.
[que
lei, humana ou divina, concede à mulher o direito de decidir sobre a vida de um
ser inocente humano e indefeso? não podemos esquecer que a o DIREITO À VIDA - o
que inclui a do feto, que é um ser vivo, humano, inocente e indefeso, desde o
momento da concepção - é assegurado também pela ONU - organização que apesar de
repleta de falhas é sempre respeitada e citada como regra pelos defensores do
assassinato de crianças = óbvio, quando a citação lhes convém.]
O argumento da maioria no Congresso não procede. Há
liberdades que não podem ser negadas porque são intrínsecas à dignidade de cada
um. O recurso aos tribunais tem sido o caminho legal para a ampliação destes
direitos. Mas há outra maneira de lidar com leis injustas, que é o que fazem
milhões de pessoas, recusar em suas vidas, mesmo correndo riscos, os interditos
que restringem sua liberdade. No Brasil, o “crime” de interromper a
gravidez é praticado por milhões de mulheres com o conhecimento de outros
tantos milhões de “cúmplices”. Os países desenvolvidos já entenderam que
não há que impor às mulheres uma gravidez indesejada. A lei que proíbe a
interrupção voluntária da gravidez só serve para infernizá-las com ameaças de
prisão e expor ao risco de vida as mais desvalidas. [que morram; cada
aborteira que morre durante, ou logo após, um aborto é uma assassina a menos.
Existem diversas provas que a
microcefalia não significa necessariamente invalidez.
Também é uma violência negar a um
doente terminal o direito de morrer com dignidade. Quando um adulto
decide que não quer mais sofrer, como negar-lhe o alívio, a serenidade e o
exercício de uma última liberdade neste momento limite da existência? Que
instância tem autoridade para recusar tal pedido, para arrogar-se tão desumano
poder?
Você confiaria ao palco de escândalos que é o
Congresso Nacional a elaboração da ética que vai pautar sua vida? [gostem ou não o
atual Congresso Nacional é fruto de uma escolha democrática dos brasileiros.
Certo agiu Pelé quando disse que o 'povo
brasileiro não sabe votar'.]
Por: Rosiska Darcy de
Oliveira, escritora - 'imortal' da Academia Brasileira de Letras
rosiska.darcy@uol.com.br
Transcrito de O Globo - 27 fev 2016