Morei algumas vezes na cidade do Rio de Janeiro — a
maravilhosa — e tenho ótimas recordações desses períodos que a vida
profissional concedeu a mim e a minha família. Gostávamos de ir ao
teatro. Quando o tempo permitia, elegíamos uma peça em cartaz e fazíamos
o programa cultural de fim de semana. O da Gávea estava entre os
preferidos. Apreciávamos o trabalho dos artistas que subiam ao palco
solitariamente e se submetiam ao crivo da atenta plateia daqueles
espetáculos. Monólogos exigem muito dos intérpretes. Demanda atenção
redobrada nos ensaios e na execução do texto. Os sucesso ou fracasso
está ligado à capacidade de entrar, sem pedir licença, na mente e no
coração de seus ouvintes. Alcançar isso é uma arte. Se um indivíduo
possui esse dom e se propõe a usá-lo em benefício da sociedade,
emoldure-o, eis um líder inspirador.
Essa liderança pode abarcar vários setores da vida
humana (artistas, empresários, religiosos, militares, cientistas,
professores ... e até políticos). Diante do que se assiste pela
imprensa, tratar do comportamento dos políticos passa a ser uma catarse.
O desafortunado momento de crise sanitária aguda, a lembrança afetiva
de monólogos teatrais e a leitura de um pequeno trabalho do Yuval
Harari: “Na batalha contra o coronavírus, faltam líderes à humanidade”
me fizeram retomar o tema liderança.
A propósito, hoje (27 de abril), após lamentável crise
de liderança e gestão dos governantes, inicia-se a Comissão Parlamentar
de Inquérito (CPI) da Covid, sob a batuta do Senado Federal. A sociedade
espera efetividade! Para a sorte da humanidade, alguns países com
habilidosos “condottieres” estão enxergando a planície além do cimo da
montanha. A vastidão plana e descortinada à frente está semeada de boas
expectativas.
Outros países, lastimosamente, não. Nesses rincões, a
complexidade da pandemia transformou os detentores do poder em vigias
sonolentos de faróis marítimos apagados durante uma tempestade bravia.
Para esses mandatários, o poder afrodisíaco (expressão cunhada por Henry
Kissinger) parece ter-lhes inebriado a ponto de escancarar suas
insensibilidades morais. Serão responsabilizados pelo naufrágio dos
navios que se chocarem nos arrecifes pontiagudos durante a borrasca.
No texto, Harari defende que o verdadeiro antídoto para
epidemias é a cooperação e que a melhor defesa contra os patógenos é a
informação. Informação que precisa ser gerada por especialistas
confiáveis e difundida por atores qualificados. Atores que, como em um monólogo de sucesso, precisam
entrar sem pedir licença no imaginário de seus ouvintes, seguidores ou
não. O público, mesmo o mais humilde, consegue entender nuances se
apresentadas com honestidade.
Em seu livro Dez lições para o mundo pós-pandemia
(Intrínseca, 2020), o jornalista Fareed Zakaria cita o Brasil como
antiexemplo de combate à pandemia. A razão, alega ele, alguns de seus
dirigentes questionarem abusivamente as recomendações dos agentes de
saúde e, em alguns casos, se recusarem a acatá-las. Uma questão de mau
exemplo. Isso dificultou o enfrentamento do assombroso desafio que teima
em não ceder.
Com os números de mortes e infecções crescendo e gritando impiedosamente nos ouvidos da população, vamos precisar envolver mais especialistas para administrarem as questões pandêmicas sem viés ideológico. [até o trecho destacado a matéria era uma leitura agradável e recomendável. Mas, quando trouxe ao tema a palavra 'especialistas', que no Brasil são em esmagadora maioria especialistas em nada, sempre prontos a expelir o que o entrevistador mandar, optamos, por encerrar a transcrição.
Chega de ouvir bobagens e profecias sobre fatos de ontem. Alguém se surpreendeu com a opinião dos especialistas que opinaram sobre o encontro virtual do Biden? A surpresa, surpreendente, foi determinada emissora de TV - talvez em busca da credibilidade perdida na contagem de cadáveres - apresentar reportagem, em horário nobre, mostrando que a situação ambiental na Amazônia não é o que pintam.]
Por Otávio Santana do Rêgo Barros — General de Divisão do ExércitoPaz e Bem!