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quinta-feira, 30 de novembro de 2017

Policiais mantêm carros com peças de segunda mão que são doadas por oficinas


TCE rejeitou esta semana um edital da Secretaria de Segurança para a compra de 750 veículos


 “A gente pode conversar, mas não tira foto minha, não. Só do carro”. O pedido é de um policial militar, que, em seguida, começa a falar em tom de desabafo. Ele tira o veículo da sombra de um pequeno prédio e o estaciona sob o sol forte do início da tarde de ontem para mostrar alguns defeitos. Cita algumas falhas mecânicas e explica por que os pneus estão carecas:  — Pode parecer estranho, mas peguei os quatro numa loja há pouco tempo. O dono vende pneus novos para a clientela e dá os velhos para a gente. Quem trabalha com policiamento motorizado está fazendo isso. Comerciantes, percebendo nossas  têm doado peças usadas para que possamos trabalhar.

O problema parece longe de uma solução, já que o Tribunal de Contas do Estado (TCE) rejeitou esta semana um edital da Secretaria de Segurança para a compra de 750 veículos, que renovariam parte da frota da PM. A justificativa para a decisão: os valores apresentados pelo governo estariam acima dos praticados no mercado.

A conta avaliada durante uma sessão plenária realizada pelo TCE na terça-feira foi de R$ 66.323.853,34, o que corresponde a R$ 17.058.928,70 (34,63%) a mais que uma estimativa feita por técnicos do órgão para aquisição dos veículos. Baseados em consultas a concessionárias e cotações da tabela Fipe, eles consideraram ideal um gasto de R$ 49.264.925,20 com novos carros.

ORÇAMENTOS DIFERENTES
Os dois orçamentos, tanto o da Secretaria de Segurança quando o do TCE, consideram um acréscimo de 20% em cima dos preços devido à necessidade de instalação de acessórios especiais, como radiotransmissores, giroscópios e sirenes. Mas, em seu relatório sobre o edital, assinado pela conselheira substituta Andrea Siqueira Martins, o tribunal observa que o governo estadual deveria ter fornecido a fonte de consulta.

O TCE, diante da diferença de quase 35% entre os valores propostos, determinou que a secretaria deve ampliar as pesquisas de preços junto a empresas especializadas, incluindo as de outros estados da Região Sudeste. E, em consulta ao Sistema Integrado de Gestão e Administração da Frota da PM, o tribunal verificou que, em abril, 986 viaturas não tinham condições de rodar. O número corresponde a 38% do total de carros da corporação (2.594). No entanto, no dia 13 deste mês, o colunista do GLOBO Ancelmo Gois informou que o percentual de carros da PM parados por falta de manutenção já chegava a 52% (1.349).

Anteontem, quando o TCE divulgou sua decisão, a repórter fotográfica do GLOBO Márcia Foletto flagrou seis policiais militares empurrando uma caminhonete quebrada durante patrulhamento na Vista Chinesa. A situação da frota é tão ruim que mexeu com os sentimentos do mecânico José Ednaldo Jerônimo, que deixou sua terra natal, João Pessoa, há 35 anos e hoje é dono da Jerônimo’s Car, no Rio Comprido. Ele conserta, em média, dois carros da PM por dia. Ontem, um da corporação e um da Polícia Civil estavam na oficina do paraibano para reparos. — Trazem para cá viaturas totalmente quebradas. Vêm em reboques ou puxadas por outros carros. Faltam pastilhas de freios, velas, cabos, correias, tantas peças... Sinto que tenho o dever de ajudar. O último carro da PM que recebi está com pneus carecas, elevadores dos vidros das janelas precisando de reparos, para-choque arrebentado e lanternas e faróis quebrados. Pego viaturas de tudo quanto é lugar, até do batalhão do Leblon (23º BPM).

A quantidade de veículos que a Secretaria de Segurança tenta comprar representa quase um terço (28,9%) da frota atual da Polícia Militar. O TCE deu prazo de 30 dias para que seja feita a revisão do orçamento. Mas um outro edital da pasta foi aprovado pelo tribunal: o de chamamento público para oficinas que queiram prestar serviços de manutenção preventiva e corretiva em veículos da PM. Com uma verba prevista de R$ 93.662.160,00, o documento prevê gastos com fornecimento e instalação de peças que atendam às recomendações dos fabricantes dos carros.

A Secretaria de Segurança informou que vai encaminhar a decisão do TCE à PM, responsável pela elaboração do edital para compra de veículos. A corporação ficará encarregada de fazer os ajustes propostos e prestar esclarecimentos ao tribunal.

O Globo