A
associação do quadro com o vírus Zika é nova, bastante recente. Mas a
microcefalia existe há muito tempo. É uma doença rara e a falta de informação e
de conhecimento está gerando dificuldade para compreender que não é preciso ter
tanto medo assim. Há vários graus da doença e cada caso é um caso. Só o
tempo vai dizer o que a criança vai ser capaz de fazer.
Simone
Tavares, 41 anos, é mãe em tempo integral de Patrícia, 20 anos, e Adriana, 14. As meninas foram diagnosticadas
com microcefalia quando pequenas – a mais velha, no primeiro mês de vida, e a
segunda, ainda na barriga da mãe, aos cinco meses de gestação. “Perguntei se
tinha remédio no posto para isso, mas o que ouvi era que o quadro era um pouco
mais complicado. 'Dificilmente vai andar e falar. Vai ser retardada'. Foram
essas as palavras da médica. O chão se abriu e comecei a despencar em um buraco
sem fim”, lembra Simone sobre o dia do diagnóstico.
Foto: Agência Brasil
Passado o
susto e com a primeira filha nos braços, Simone e o marido, moradores de Campo
Grande, resolveram buscar informação. “A gente não via deficiência nela.
Para mim, ela era perfeita. Eu não conseguia entender aquele
diagnóstico.” Uma neurologista ajudou o casal
a se acalmar, explicando que só o tempo diria o que a menina seria capaz de
fazer. O bebê foi encaminhado para uma instituição que oferece
estimulação precoce. Patricia andou e falou na mesma idade que crianças sem
microcefalia. A única diferença é que permaneceu sempre miudinha.
Quando
Patrícia estava com 6 anos, Simone decidiu engravidar novamente. “Minha
preocupação era ela ficar sozinha no futuro. Perguntei para a neurologista se a
microcefalia podia acontecer de novo e ela me disse que não. Mas mãe sabe das
coisas. Logo no início da gravidez, eu já sentia. Sabia que aquele bebê também
seria diferente.”
Um
ultrassom mais detalhado revelou que a segunda filha do casal também teria
microcefalia. “Levei
outro susto, mas, desta vez, a aceitação foi mais tranquila. Eu já sabia que
não era um bicho de sete cabeças. Manjava do assunto e estava preparada.” Quando Adriana nasceu, até a vaga na instituição que cuidava
da irmã já estava garantida para ela.
Hoje, as meninas frequentam uma
escola regular todos os dias pela manhã, com o objetivo de se socializar.
Apesar de se comunicarem bem, elas apresentam grande dificuldade no processo de
alfabetização e ainda não conseguem ler e escrever.
À tarde,
as irmãs fazem fisioterapia, aulas de dança e atletismo – este último, a paixão
das duas. Como para-atletas, já colecionam mais de 60 medalhas, todas
penduradas sobre as camas em que dormem. “Quando a Adriana estava com 4
anos, uma médica geneticista começou a atender na cidade onde moramos. Ela
descobriu que eu e meu marido temos uma falha em um cromossomo e que a chance
de termos outro filho com microcefalia é de 50%. Hoje, minha vida toda é
dedicada às minhas filhas”, diz Simone.
Infância
normal
Ajornalista Ana Carolina Dias Cárcere, 24 anos, fala com propriedade sobre como é a vida com
microcefalia. Diagnosticada com a síndrome desde o nascimento - a cabeça da jovem media
apenas 27,4 centímetros após o parto -, ela conta que teve convulsões
até os 12 anos de idade e precisou tomar medicação forte para controlar as
crises. Enfrentou, ao todo, cinco cirurgias delicadas, que envolviam a
abertura forçada dos ossos do crânio para que o cérebro tivesse espaço para
crescer. A primeira delas aconteceu aos nove dias de vida e a última, aos 9
anos. “Minha infância foi normal na medida do possível”, disse em
entrevista à Agência Brasil.
“Apesar
das dificuldades, frequentei a escola e meu aprendizado foi normal. Entrei com
7 anos, um pouco depois das outras crianças, mas consegui acompanhar bem.
Estudei com a mesma turma durante nove anos seguidos. Depois, entrei no ensino
médio e, em seguida, na universidade. Cheguei a cursar direito e, no terceiro
semestre, decidi mudar para jornalismo”, contou. A formatura do curso ocorreu em dezembro
do ano passado e reuniu família e amigos.
Os planos
agora se resumem a conseguir um emprego. “Já entreguei alguns currículos,
mas não recebi retorno ainda.” A longo prazo, a jovem sonha em fazer cursos
de língua estrangeira e uma pós-graduação em jornalismo internacional. Ao final
da conversa, Ana Carolina fez questão de deixar um recado para grávidas e mães
de crianças diagnosticadas com microcefalia recentemente. “A associação do
quadro com o vírus Zika é nova, bastante recente. Mas a microcefalia existe há
muito tempo. É uma doença rara e a falta de informação e de conhecimento está
gerando dificuldade para compreender que não é preciso ter tanto medo assim. Há
vários graus da doença e cada caso é um caso. Só o tempo vai dizer o que a
criança vai ser capaz de fazer.”
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Fonte: Agência Brasil