É uma decisão histórica. Como todos sabem - e quem ainda não percebeu precisa se apressar - forjou-se uma “ética” (falsa) elevando essas vacinas de covid à condição de panaceia. Mais que isso: a partir de um arrastão de propaganda sem precedentes, instaurou-se um estado de coisas em que o jogo passa a ser perseguir e estigmatizar qualquer um que não tenha se vacinado. Nem seria preciso reiterar a raiz absurda disso, mas vamos lá: são vacinas que sequer têm o poder de bloquear infecção e transmissão do vírus. Ou seja: a “ética” de proteção coletiva é falsa.
Pior que isso: o arrastão de propaganda fantasiada de ciência convenceu grande parte da população de que ela não precisa se informar devidamente sobre os riscos ainda não dimensionados dessas vacinas - cujo desenvolvimento ainda não cumpriu todas as etapas. Ou seja: como impor uma vacinação sem que os indivíduos possam sequer fazer um balanço concreto entre os riscos da doença e os da vacina?
Entre os aspectos contemplados pela desembargadora Elisabete Filizzola em sua decisão sóbria e responsável está a “presença dos requisitos excepcionais à concessão da tutela de urgência recursal, dada a contundência do impacto nos direitos fundamentais titularizados pelas pessoas jurídicas” (os clubes que contestaram o decreto municipal). Em rara constatação do princípio óbvio citado acima, ela escreve: “(…) a presença exclusiva de vacinados nas dependências do clube não é fator decisivo à não circulação do vírus, afinal, é mesmo notória - está em todos os jornais - a constatação de que a vacinação contra covid-19, lamentavelmente, NÃO IMPEDE (grifo dela) a contaminação daqueles que foram vacinados, o que determina, portanto, a manutenção das idênticas cautelas sanitárias desde sempre adotadas, independentemente de estarem ou não vacinados os frequentadores”.
A decisão do agravo de instrumento observa ainda a falta de isonomia do decreto da prefeitura do Rio de Janeiro - instituindo a obrigatoriedade de apresentação do certificado de vacinação em locais como clubes, cinemas, academias e eventos e não instituindo para outras atividades/ambientes como shoppings, bares e restaurantes. A decisão nota a falta de uniformização da medida sanitária, já que todas as situações acima descritas envolvem convivência e reunião de pessoas com o consequente potencial de contágio.
Que a razoabilidade da doutora Elisabete Filizzola abra um caminho de avaliação mais responsável e menos espetaculosa no enfrentamento à pandemia.
Guilherme Fiuza, colunista - VOZES - Gazeta do Povo