O maior desafio será a convivência com um Congresso sob a mira da Justiça e que deve tentar chantagear o Executivo
Vivemos a
conjuntura mais complexa da história republicana. Michel Temer governa um país
cercado por crises por todos os lados. Tem bases políticas frágeis no
Congresso. Não numericamente, ao menos até o momento. Mas no campo ético.
Herdou o Congresso que ajudou o PT a governar por 13 anos e cinco meses. Tem a
tarefa de retirar o país da tormenta, conduzi-lo a porto seguro, com a mesma
caravela que serviu fielmente ao projeto criminoso de poder.
Esta
contradição vai marcar todo o período de seu governo, mesmo após a recomposição
ministerial, que deve ocorrer após o Senado julgar o impeachment de Dilma
Rousseff. Se não há qualquer possibilidade de o projeto criminoso voltar ao
poder, o que poderia levar o país à guerra civil, é líquido e certo que Temer
deve organizar um governo sob novas bases quando for presidente de fato. O
maior desafio será a convivência com um Congresso sob a mira da Justiça e que
deve tentar chantagear o Executivo nas questões consideradas vitais para a nova
administração federal.
Até o
momento, Temer tem conseguido gerir bem os momentos de tensão. Acabou a organização
do Ministério minutos antes da posse. Teve de fazer inúmeras concessões. E vai
ter de conviver com elas até o fim do processo de impeachment. Não há saída.
Sem isso, seria o caos, tanto de ingovernabilidade, como de devolver o poder
aos criminosos que produziram o maior saque de recursos públicos da história da
humanidade.
Na
interinidade, o presidente vai conviver com os constantes ataques petistas e de
seus comparsas. E quando se aproximar a data do julgamento, a tendência é de
enfrentamento nas ruas. Buscam desesperadamente um cadáver. Têm de transformar
o governo em repressor. Faz parte do script dos marginais que foram
defenestrados do poder. Caberá ao governo manter a ordem dentro dos limites
constitucionais.
Ainda
haverá muitas surpresas. A principal fonte deverá ser a operação Lava-Jato. Não
é descartada a prisão de Lula. Afinal, mantê-lo em liberdade é colocar em risco
as investigações, pois o ex-presidente pode coagir as testemunhas, destruir
provas. Mantê-lo solto também é um perigo para a ordem pública. Ele estimula a
guerra civil em todos os seus pronunciamentos. Além da contradição de o chefe
do petrolão continuar a fazer política — leve, livre e solto — da mesma forma
como desempenhou a sua presidência e de sua criatura.
Se a
prisão de Lula é condição sine qua non para a estabilidade das instituições
republicanas, a continuidade da Lava-Jato vai atingir o coração do Congresso
Nacional, suas principais lideranças, inclusive os presidentes das duas Casas.
Será mais um desafio para o governo Temer. E isto em meio à mais profunda e
longa crise econômica da nossa história — quando o Congresso terá de ser
acionado para aprovar medidas emergenciais.
Deve o
governo manter o funcionamento da máquina pública. Só isto não basta. Tem de
apresentar resultados imediatos — mesmo que aparentes, pois as medidas
econômicas não vão produzir efeitos a curto prazo. Daí a necessidade de
solucionar as crises na composição do Ministério rapidamente, sem pestanejar. E
ter cuidado na designação dos novos ministros, mesmo tendo limites, derivados
da composição — mais que necessária — com a base congressual, especialmente a
do Senado.
O maior
desafio de Temer vai ser o de levar o governo até a aprovação do impeachment.
Terá de conviver com sucessivas crises. Parte delas produzidas pela própria
composição de forças que levaram à organização do governo provisório; outras,
devido à estrutura carcomida da República brasileira. E vai sofrer
diuturnamente ataques do PT e seus asseclas, que vão buscar desgastar o governo
e explorar suas vacilações.
Até o
momento, Temer tem conseguido administrar os conflitos. Porém, é necessário
avançar e enfrentar os opositores. Uma saída conciliatória é inviável. Passar à
ofensiva é a melhor forma de fortalecer o governo e garantir a aprovação do
impeachment, sem ter de aceitar a chantagem de senadores corruptos. E para isso
tem de, inicialmente, convocar uma rede nacional de rádio e televisão para
expor — ainda que sem um levantamento completo — a situação em que encontrou o
governo. Não será, infelizmente, necessário uma ampla pesquisa. Basta relatar,
sucinta e didaticamente, o que o PT fez com as empresas e bancos estatais e a
máquina estatal. Mostrar o descalabro e seu significado econômico-social é a
melhor defesa frente aos golpistas que rasgaram os ordenamentos legais da
República, seus princípios, sua história.
No campo
econômico, o governo está indo bem. Tem conseguido restabelecer a confiança e
uma expectativa favorável às suas medidas. Na política externa, os sinais
também são positivos. Nos ministérios sociais, tem tido dificuldades em
administrar a herança recebida. O vaivém nas medidas adotadas tem demonstrado
falta de competência gerencial e, principalmente, de firmeza. Ceder faz parte
do jogo democrático, mas ceder por mera pressão de grupelhos sem representação
social efetiva é fraqueza. E mais: estimula novos desgastes, criando a sensação
de que a administração é frágil, vacilante e que teme os “movimentos sociais”,
sustentados por generosas verbas durante 13 anos.
Em três
semanas — com todas as dificuldades —, a presidência Temer conseguiu
estabelecer um novo rumo para o país. Não há saída responsável para a crise
mais grave da nossa história a não ser dando condições de governabilidade.
Imaginar um retorno de Dilma ao Palácio do Planalto seria transformar Brasília
em Caracas. É brincar com fogo. E pode acabar mal.
Fonte: Marco
Antonio Villa é historiador