Na Terça-Feira de Carnaval, o presidente Jair Bolsonaro conseguiu superar a marca de Itamar Franco ao protagonizar um caso de vulgaridade inominável
Passado o impacto inicial, o caso virou um verbete no folclore da política nacional ao qual se recorre para descrever uma autoridade que se comporta de modo abobalhado em público. Na Terça-Feira de Carnaval, o presidente Jair Bolsonaro conseguiu superar a marca de Itamar ao protagonizar um caso de vulgaridade inominável. Com o objetivo de denunciar os excessos dos blocos carnavalescos, Bolsonaro divulgou em sua conta no Twitter um vídeo com imagens obscenas de dois homens durante o Carnaval (leia reportagem aqui), causando espanto mais ou menos generalizado, deflagrando as piadas de sempre e expondo o país ao ridículo internacional.
É bom não confundir os elementos. Uma coisa é um presidente ficar incomodado com comportamentos inaceitáveis em público, quer durante o Carnaval, quer fora dele. E o comportamento exibido no vídeo é execrável. Outra coisa, inteiramente diferente, é um presidente achar apropriado e adequado usar uma conta oficial de primeiro mandatário da República Federativa do Brasil para divulgar cenas de cunho pornográfico a pretexto de condená-las. Trata-se de uma dolorosa evidência de que Bolsonaro não faz ideia do tamanho, da dignidade e do decoro do cargo que ocupa.
É um tremendo desalento confrontar a iniciativa patética do presidente com a realidade socioeconômica do país. O desemprego continua na estratosfera. A economia engatinha. O sistema de saúde precariza-se cada vez mais. As escolas públicas oferecem um ensino de qualidade claudicante. A reforma da Previdência é um imperativo incontornável para o qual toda a atenção é pouca. Tudo isso compõe um cardápio de urgências do qual o Brasil não tem o direito de abrir mão. No entanto, o presidente acha que, entre as prioridades nacionais, está um vídeo repulsivo feito durante a folia de um bloco carnavalesco em São Paulo. Com esse comportamento, o presidente Bolsonaro fica menos presidente e mais Bolsonaro.
Publicado em VEJA de 13 de março de 2019, edição nº 2625