Aos 40 anos, Fabiano Guimarães da Rocha experimenta uma inesperada fama e já recebe até sugestões para entrar na política
O carioca chegou a Brasília em setembro do ano passado. Na época, a primeira-dama Michelle Bolsonaro pediu ao presidente que traduzisse simultaneamente seus discursos para os surdos. O Planalto abriu então duas vagas para intérprete. Fabiano soube da seleção, se candidatou e foi chamado. Desde então, ele se tornou figura onipresente ao lado do presidente, participa de viagens, aparece na televisão durante entrevistas e acompanha as cerimônias oficiais. O intérprete aprendeu libras quase por acaso. Aos 18 anos, era membro de uma igreja e participava de um grupo que fazia apresentações religiosas. Certo dia, o líder do grupo inseriu na coreografia um pouco da língua de sinais. Ele ensaiou os primeiros movimentos, se interessou por libras, resolveu estudá-la e se tornou professor. “Faço parte de uma parcela histórica de intérpretes, daqueles que roeram o osso para a construção de tudo o que hoje existe”, conta.
Discreto, ele não gosta de falar muito sobre o trabalho ao lado do presidente. No governo, segundo ele, o maior desafio é traduzir o ministro da Economia, Paulo Guedes, visto que há muitos termos técnicos que nem sempre são diferenciados na linguagem de sinais — investimento e financiamento, por exemplo, são interpretados da mesma maneira. É, porém, o presidente Bolsonaro, conhecido por seu falatório nada técnico, que deixa Fabiano em apuros. Os pronunciamentos do presidente nunca são informados previamente, mas normalmente o intérprete recebe briefings para se preparar, o que não evita determinadas surpresas, como o episódio em que Bolsonaro chamou jornalistas de “bundão”. Fabiano foi rápido no gatilho, fazendo gestos circulares para traduzir o palavrão presidencial. “Nós interpretamos a fala do orador. O script que nós temos é o da fidelidade, e temos o compromisso de transmitir o discurso de quem o pronuncia. O que o presidente ou uma autoridade fala, a fala é dele. A gente só faz a transcrição”, explica. Longe, porém, de Fabiano fazer qualquer crítica ao presidente, a quem diz ter entregado seu voto em 2018 e concordar com seus valores sobre religião e família. Evangélico fervoroso, o intérprete de libras participa de manifestações pró-governo, é apoiador de Bolsonaro nas redes sociais e até usa ternos encomendados ao mesmo alfaiate do presidente.
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Publicado em VEJA, edição nº 2705, de 23 de setembro de 2020