O PT entrará na campanha com sua história e sua incapacidade de reconhecer erros
Fernando Haddad tem pouco mais de um mês para mostrar que não é o
“Andrade”. Sua unção aconteceu aos 45 minutos do segundo tempo, quando a
vitimização de Lula já tinha rendido tudo o que podia render. É até
provável que o PT tenha perdido uma semana de propaganda ao esticar
desnecessariamente a corda.
Haddad entra em campo com o patrimônio dos bons tempos de Lula e com a
bola de ferro das malfeitorias do petismo. Seus adversários negam que
ele tenha presidido um país com emprego, crescimento e olho na redução
das desigualdades sociais. Perdem tempo, pois o sujeito que perdeu o
emprego lembra da vida que teve. Já os petistas, inclusive Haddad,
embrulham o mensalão e as petrorroubalheiras numa delirante teoria da
conspiração. Também perdem tempo, pois o resultado está aí e chama-se
Jair Bolsonaro.
A cenografia que o PT armou em Curitiba foi exemplar. O comissariado,
reunido num hotel, anunciou que sua Executiva Nacional decidiu, por
unanimidade, colocar Haddad na cabeça da chapa. Teriam feito melhor se
dissessem que carimbaram uma decisão de Lula, coisa que até as grades da
carceragem da Federal já sabiam. Há dias Haddad fez-se fotografar
sorrindo atrás de uma máscara de Lula. A partir de hoje começa a ser
testada a cena real, com Lula sorrindo atrás de uma máscara de Haddad. O PT e Bolsonaro têm o mesmo sonho: chegar ao segundo turno tendo o
outro como adversário. Talvez esse seja o único projeto comum à senadora
Gleisi Hoffmann e ao general Hamilton Mourão.
Todas as projeções feitas com base nas pesquisas desembocam na mesma
pergunta: qual será a transferência de Lula? [palpite a ser cobrado: inferior a DEZ POR CENTO - dificilmente haverá segundo turno e se houver Haddad não estará nele.]Certo mesmo é que enquanto
se espera por um crescimento de Haddad capaz de levá-lo a um segundo
turno contra Bolsonaro, algo que se poderia chamar de eleitorado de
centro espalhou seus votos entre três candidatos: Ciro Gomes, Marina
Silva e Geraldo Alckmin. Eles têm, somados, 34% das preferências.
Bolsonaro tem 24%.
Com o pé na estrada, Haddad oferece um projeto, goste-se ou não dele.
Seus adversários do suposto centro estão perdidos numa busca de
estratégias marqueteiras. Candidato a vice na chapa de Marina Silva,
Eduardo Jorge viu num indesejável dilema Haddad-Bolsonaro uma
oportunidade para ferir o petista: “Bolsonaro é o candidato do Lula no
segundo turno para, junto com candidato terceirizado que ele quer
colocar na outra vaga da finalíssima, pavimentar a volta do Lula”. Com anos de atraso, Marina usa a palavra “corrupto” para classificar
Lula. Alckmin decide atacar Bolsonaro, freia e dá marcha a ré. Já Ciro
Gomes, que negociava uma chapa com Haddad, lembrou que na eleição de
2016 ele perdeu a Prefeitura de São Paulo no primeiro turno, tendo
conseguido menos votos que a soma dos nulos e em branco.
Esse clima de barata-voa dificilmente construirá candidaturas que
possam ser associadas a políticas públicas. Pode-se atribuir o leve
crescimento de Ciro Gomes à sua proposta de renegociação das dívidas dos
inadimplentes do sistema de crédito. Ganha uma viagem à Venezuela quem
for capaz de citar uma proposta de Geraldo Alckmin. Outro dia ele quis
contar que pretende reforçar a Força Nacional com a contratação de
conscritos que deixam as Forças Armadas, mas perdeu-se com
reminiscências. Haddad tira o tom de fantasia em que o PT envolveu sua participação
na disputa. É tão pesado quanto o foi Dilma Rousseff na sua primeira
campanha. Se o poste de 2010 tinha a alavanca do poder e do sucesso
lulista, o ex-prefeito de São Paulo depende do prédio da carceragem de
Curitiba.
Elio Gaspari, jornalista - O Globo
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quarta-feira, 12 de setembro de 2018
Haddad põe o pé na estrada
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