Marina Silva está de volta. Se o Tribunal Superior Eleitoral cassar os
mandatos de Dilma Rousseff e Michel Temer, o Brasil terá uma eleição
presidencial neste ano, e Marina poderá lembrar que sua candidatura não
contém pesticidas, glúten, nem menções na Lava-Jato. Mesmo que isso não
aconteça, o grau de deterioração do sistema partidário chegou a um ponto
que Marina será uma candidata altamente competitiva em 2018. Seu novo
partido é jovem e virgem, pois nenhuma roubalheira chegou a quilômetros
de distância da ex-ministra do Meio Ambiente de Lula.
Depois de passar algum tempo em silêncio, Marina reaparece condenando o
movimento pelo impeachment de Dilma (que empossa Temer) e defendendo a
intervenção do TSE. Numa entrevista ao repórter Marcelo Leite, a
professora expôs a concepção “marineira” dos problemas nacionais
oferecendo uma esperança, ela.
Reapresentou a barafunda retórica que
contribuiu para a ruína de sua campanha em 2014. Definiu-se como “sustentabilista progressista”, condenou o uso de
rótulos e classificou seu partido como um “experimento” de superação do
PT e do PSDB, que rotula como social-democratas. O Rede seria um partido
tradicional, de massas e de quadros. Ele busca “um modelo de
desenvolvimento que seja sustentável nos seus aspectos econômico,
social, ambiental, cultural, político, ético e até mesmo estético”. Essa
construção pode dizer tudo, ou nada. Marina exercitou um velho hábito:
diz o que não é, mas não diz o que é. Como o freguês que entra num
restaurante, lê o menu e diz o que não quer comer. Não quer uma
“perspectiva de terra arasada” porque busca “uma nova síntese”. Não quer
“megaestruturas para ficar fazendo política como muitos vinham
fazendo”. Não quer hegemonia nem a sacralização do seu partido. Diante
da confusão geral, Marina Silva diz que “o primeiro dever de casa que
temos de fazer é trabalhar de fato no programa, de estabelecer
prioridades”. Chega-se assim ao programa Marina.
Na eleição de 2014, em menos de três meses, ela teve um desempenho tão
espetacular quanto melancólico. Depois da morte de Eduardo Campos, em
agosto, conseguiu uma ascensão fulminante, ultrapassando Aécio Neves e
liderando as pesquisas para o segundo turno com dez pontos de frente
sobre Dilma Rousseff. Teve duas adversidades: seu escasso tempo no
horário gratuito na televisão (dois minutos) e a barafunda de seu
programa de governo. Nele apresentava propostas econômicas racionais e
saídas políticas visionárias, como a “democracia de alta intensidade”
com a convocação de plebiscitos. Em setembro os adversários começaram a
atacá-la, e, nos últimos dias da campanha, Aécio recuperou-se,
deixando-a fora do segundo turno, mas com 20 milhões de votos.
Marina cometeu o erro de acreditar que poderia se eleger com propostas
indecifráveis, vagas ou mesmo conflitantes. Foi obrigada a recuar mas
pode-se dizer tudo dela, menos que tenha mentido com a grandiosidade
pertinaz de Dilma Rousseff.
Na sua versão Rede, a ex-ministra corre o risco de reviver um episódio
ocorrido há décadas. Um sociólogo de fala desconexa terminou sua
exposição, e o divertido deputado gaúcho Temperani Pereira
cumprimentou-o: “Saiba que, diante de suas palavras, estou incorrobúvel e
imbafefe”.
Fonte: Elio Gaspari, jornalista - Folha de São Paulo
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quarta-feira, 20 de janeiro de 2016
Tudo mudou, menos Marina Silva
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