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domingo, 1 de fevereiro de 2015

O paraíso da energia, segundo a doutora

Todo governante acredita demais no que diz, mas a água ferve quando diz algo em que não pode acreditar

Há dois anos, a doutora Dilma apareceu em rede nacional de televisão, anunciando que o Brasil entrara no paraíso da energia elétrica. Ela disse coisas assim:
“A partir de agora a conta de luz das famílias vai ficar mais barata. É a primeira vez que isso ocorre no Brasil”. “Isso significa que o Brasil tem e terá energia mais que suficiente para o presente e para o futuro, sem nenhum risco de racionamento, de qualquer tipo de estrangulamento, no curto, no médio ou no longo prazo”. “Estamos vendo como erraram os que diziam meses atrás que não iríamos conseguir baixar os juros e nem o custo da energia. Tentavam amedrontar nosso povo”. [os juros logo voltaram a subir, e continuam em elevação, e a energia vamos pagar aumentos superiores a 40% nas contas já a partir deste mês.]
 
Passados dois anos, os juros estão onde estão, as tarifas de energia vão subir, e o “risco do racionamento” está aí. Com má vontade, pode-se ver no pronunciamento da doutora uma sucessão de lorotas.  Com um pouco de boa vontade, vê-se outra coisa, diferente e, sob certos aspectos, até pior: a fé numa realidade virtual. Ela queria baixar as tarifas e acreditava no que dizia, mas acreditava demais.

Bastava que tivesse evitado os superlativos, tais como “tem e terá energia mais que suficiente”, “sem nenhum risco (...) no médio ou no longo prazo”. A doutora governa com três realidades. Na da racionalidade, sabe perfeitamente que não se deve dizer o que disse. Na da autoglorificação, cria um mundo virtual. No campo da militância política, constrói a fantasia e compõe um conflito no qual se apresenta como uma princesa combatendo as forças das trevas que querem “amedrontar nosso povo”.

Isso não é debate político, mas videogame. É do embaixador Marcos Azambuja a explicação de que os diplomatas produzem blá-blá-blás, mas não os consomem. Até que ponto a doutora acredita nos seus blá-blá-blás não se pode saber, mas sua fé na fantasia é mais complexa que a pura enganação. É também um estado da mente. Todo governante acredita demais no que diz, mas a água ferve quando diz algo em que não pode acreditar. Por exemplo: não haverá problemas com a energia “no curto, no médio ou no longo prazo”. O marqueteiro João Santana, cujas impressões digitais estão na fala do paraíso energético, pode acreditar que Elvis Presley está vivo, mas a doutora não podia acreditar no que disse.

No seu depoimento ao livro do repórter Luiz Maklouf Carvalho (“João Santana: um marqueteiro no poder”), ele diz que tem “uma relação misteriosa e cotidiana” com o físico italiano Ettore Majorana. O baiano Santana tem um pé na ciência política, outro no mundo mágico, e vive bem nos dois. Sua fascinação pelo caso de Majorana mostra como se pode ser feliz acompanhando ora a razão, ora a fantasia. 

Por: Elio Gaspari - O Globo