Apesar dos 181 anos de condenação e ao menos 48 estupros, o médico-monstro Roger Abdelmassih vai levar uma vida de conforto em sua casa por determinação da Suprema Corte. O que isso diz sobre nossa Justiça?
Apartamento de Roger Abdelmassih. (Crédito:Claudio Gatti)
Vidal Cavalcante/AE; Danilo Verpa/Folhapress
As sacolas abasteceram o apartamento do 12º andar onde vivem a esposa de Roger, Larissa Maria Sacco, que é procuradora licenciada, e os filhos gêmeos do casal. Na lista de compras, alguns dos produtos que Abdelmassih sentia falta: iogurtes, pão sírio e mussarela de búfala. Na segunda-feira 2, o homem condenado a 181 anos por ter cometido ao menos 48 estupros em 37 mulheres chegou ao condomínio em outro automóvel. Carregado por um dos funcionários do prédio e acomodado em uma cadeira de rodas, ele retornava ao conforto da vida domiciliar.
“Se fosse pobre estaria preso”O apartamento recebeu uma coleção de tapetes persas. Um dos
funcionários do prédio diz ter ficado com dores nas costas de tanto carregá-los
Um dos quartos do aconchegante apartamento de 272 metros quadrados foi adaptado para servir de unidade de terapia semi-intensiva, com maca de hospital, suporte para pendurar soro, remédios, cilindros de oxigênio e uma cama king size. Na sala de quase 65 metros quadrados, além de um imenso sofá, há objetos decorativos em estilo árabe e tapetes persas que chegaram recentemente de uma das fazendas vendidas pela família Abdelmassih. Do lado de fora do apartamento avaliado em cerca de R$ 5 milhões, as cortinas quase sempre fechadas escondem o dia a dia do ex-médico — e sempre monstro.
Desde 21 de junho, quando a 1ª Vara de Execuções Criminais de Taubaté concedeu pela primeira vez o benefício de prisão domiciliar em função de laudos que atestariam uma condição de saúde debilitada de Abdelmassih, os moradores do condomínio Monte Verde sentem-se incomodados com o vai e vem do ex-médico. “Eles perguntam até quando esse inferno vai durar”, diz um funcionário que não quis se identificar. Prestar assistência ao estuprador revolta quem trabalha no prédio. “É horrível ter de carregá-lo no colo”, diz um deles. “A Justiça é falha. Se fosse uma pessoa pobre não estaria em liberdade”, afirma, em tom indignado, um prestador de serviço do edifício vizinho.
Dos mais de 100 anos de condenação em regime fechado, Abdelmassih passou somente três na cadeia. Em agosto de 2014, após ser encontrado foragido no Paraguai, ele foi levado à Penitenciária II de Tremembé. Larissa costumava visitá-lo duas vezes por semana acompanhada pelo motorista. Hoje, três anos depois, ela evita sair do apartamento. O casal e as crianças vivem uma rotina de reclusão. Momentos com o pai só são permitidos na sala do imóvel. Só têm acesso ao quarto a mulher e as empregadas, uma cozinheira e uma faxineira. Três vezes por semana, um carro chega para entregar os cilindros de oxigênio — Abdelmassih tem insuficiência cardíaca crônica. O veículo da família, uma SUV blindada de R$ 200 mil, é usado principalmente para levar os filhos à escola. Ambos estudam em um colégio na avenida Paulista com mensalidades de R$ 2,6 mil. A alegação de problemas de saúde, segundo funcionários, pode ser fingimento. Eles relatam não haver acompanhamento médico. Abdelmassih já foi flagrado levantando da cadeira de rodas com facilidade. “O tratamento médico deve ser comprovado à Justiça”, afirma Lúcio França, advogado criminalista. Relatórios mensais sobre a saúde de Abdelmassih devem ser enviados à 1ª Vara de Execuções Criminais de Taubaté. “Pela gravidade do caso, ele deveria ter acompanhamento diário de enfermeiras e fisioterapeutas.”
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