Patologia da ideologia
[oportuno ter presente que sendo Bolsonaro, por força de determinação constitucional, o comandante supremo das Forças Armadas qualquer ofensa dirigida àquelas instituições e/ou aos que a integram, com honra e retidão, é também dirigida a ele, que as comanda.]
Se não reage, Bolsonaro incorpora insultos à equipe
que escolheu
Foge à
compreensão das mentes normais a razão de o presidente do Brasil assistir de
maneira complacente à enxurrada de insultos dirigidos a figuras da República,
entre as quais o vice-presidente e alguns ministros, por aquele antagonista
residente na Virginia, cujo nome passo a me abster de pronunciar por
considerá-lo a materialidade gráfica do baixo calão. O assunto aqui não é ele.
É o presidente. Mais que tolerante, Jair Bolsonaro é submisso e até reverente
ao autor das ofensas que em última análise lhe são dirigidas, pois atingem
profissionais que escolheu porque achou capazes de ajudá-lo a governar o país.
Nesse aspecto, não faz diferença se civis ou militares.
Bolsonaro
alega que é “dono do próprio nariz” para justificar sua indulgência e afirmar
que cada um age como quer no controle da própria vida. Pois se existe alguém
impedido de dizer e fazer impunemente o que lhe dá na telha é exatamente o
chefe da nação. É o mais comprometido dos brasileiros com o dever de dar
satisfação, de medir consequências de seus atos, palavras e até omissões, de
atuar no estrito limite da ordem constitucional. Ocupa o cargo por delegação de
quem passou a ter a propriedade do nariz presidencial desde a eleição.
E aqui se
incluem todos os brasileiros. Os que votaram nele ou deixaram de votar movidos
por convicção e os que o escolheram motivados pela rejeição ao adversário. Uma
das hipóteses para que o presidente seja dócil ao tratamento hostil é que não
queira dar aos cidadãos que compartilham não necessariamente do estilo mas das
crenças do autor referido no início a impressão de que esteja cedendo a gente
identificada com ideias opostas e aí dando uma demonstração de fragilidade ante
o eleitorado de raiz. É verdade
que nas pesquisas Bolsonaro encontra ainda apoio significativo nesse segmento.
Mas é verdade também, e até mais eloquente, que perde credibilidade entre os
que optaram por ele achando que se livravam das amarras ideológicas do PT e
agora deparam com atuações patológicas avalizadas pelo presidente, que, assim,
consegue a façanha de ver boa parte do Brasil pensante aplaudir a presença de
militares no governo, algo antes temido e tido como sinal de alerta para o
risco de retrocesso.
Nada a
ver com esquerda, com partidos de oposição. É questão de bom-senso, e Jair
Bolsonaro se coloca do lado contrário de maneira arriscada para ele. Da grita
em redes sociais, o repúdio ao clima de sarjeta transbordou para o Congresso,
no qual crescem as manifestações de solidariedade aos ofendidos enquanto
caminha com lentidão a reforma da Previdência. A sociedade reage e as
instituições se posicionam. Logo chegará a vez de o Judiciário pronunciar-se a
respeito. Com isso,
o presidente da República cava o isolamento e, paradoxalmente, se põe cada vez
mais sob a tutela daqueles que são alvo dos ataques porque são eles que recebem
o crescente respaldo da opinião pública. É de perguntar até quando isso vai
durar se Bolsonaro não parar de falar em páginas viradas e não puser um
ponto-final na balbúrdia em que se transformou o seu governo.