Enquanto pratica a arte
de desdizer-se sempre que necessário para poder dizer o que acha que a plateia quer ouvir, Luiz Inácio Lula
da Silva age com determinação nos bastidores para forçar a substituição de mais um
ministro de quem não gosta: o titular da Justiça, José Eduardo Cardozo, que
acusa de “não controlar” devidamente
as ações da Polícia Federal (PF) no âmbito da Operação
Lava Jato, agora perigosamente perto dele próprio e de sua família. O cheiro do perigo despertou a metamorfose ambulante.
Depois
de passar semanas atacando o ajuste fiscal e a “política econômica” de Dilma e estimulando seu partido e as organizações
filopetistas a exigir a demissão do ministro Joaquim Levy, Lula fez na
quarta-feira, na Assembleia Legislativa do Piauí, onde foi homenageado, uma
enfática defesa da austeridade fiscal:
“Isso a gente faz na casa da gente. Gastou um pouco demais? Perdeu a conta? Tem
que brecar. Ou a gente faz isso, ou quebra de vez”.
Já
as investigações da Lava Jato em torno das relações
de Lula e família com o pecuarista José Carlos Bumlai – aquele que tinha
acesso livre ao Palácio do Planalto – mostram indícios de que o clã Lula da
Silva foi beneficiado por esquemas mal explicados. De acordo com a delação premiada do lobista Fernando Baiano, os dois filhos de Lula, Fábio Luiz e Luiz
Cláudio, ocupavam,
até o início das operações da Lava Jato, salas anexas ao escritório que Bumlai
mantinha em São Paulo. Além disso, de acordo com o mesmo delator, Bumlai teria usado recursos
do propinoduto da Petrobras para “dar uma
ajuda” de R$ 2 milhões a “uma
nora” do ex-presidente.
São informações como essas, classificadas pelos petistas como “vazamentos seletivos”, que provocam as
queixas de Lula sobre a “falta de
controle” do ministro da Justiça sobre a Polícia Federal. O que deixa claro que, para Lula e a
tigrada do PT, o
Ministério da Justiça tem obrigação de impedir que a Polícia Federal divulgue investigações que contrariem os interesses
políticos dos donos do poder. Assustado com a possível revelação
daquilo que não imaginava que pudesse vir a público, Lula quer valer-se do
pretexto de José Eduardo Cardozo estar enfrentando problemas de saúde para
ampliar o elenco de ministros de sua confiança nos postos-chave do governo.
De qualquer modo,
no que diz respeito ao ex-presidente, o amplo e minucioso trabalho de
investigação da Operação Lava Jato, realizado em conjunto pela PF e o
Ministério Público Federal (MPF), sob
a coordenação do juiz federal Sergio Moro, não tem feito mais do que acumular
indícios daquilo que todo o Brasil sempre soube: Lula tem o rabo preso com malfeitos praticados durante seu governo, pois afronta o
mais elementar bom senso imaginar que ele não tivesse nenhum conhecimento, por
exemplo, sobre o amplo esquema do mensalão, que resultou na condenação de parte
da cúpula do PT. Suas relações pessoais com grandes empresários, especialmente
donos de empreiteiras, sugerem reflexões sobre a promiscuidade e seus efeitos
sobre valores familiares e bancários.
Não é sem razão, portanto, que Lula
tem dedicado o melhor de seus esforços à tentativa desesperada de livrar-se das
encrencas à vista – o que é particularmente difícil por estar todo o projeto de poder
do PT à beira do precipício. Um de seus discursos prediletos, que sempre manejou
com grande competência, é o da vitimização de sua figura de defensor dos fracos
e oprimidos, que por essa razão é objeto
do “ódio das elites”, que “não se conformam” com as conquistas sociais que
ele realizou “como nunca antes na história deste país”.
Na Assembleia
Legislativa piauiense – enquanto manifestantes protestavam na porta
exibindo réplicas do já famoso boneco Pixuleco –, Lula caprichava no
papel de perseguido: “Este país está vivendo um
momento inusitado. Um momento de ódio, onde (sic) as pessoas não precisam nem ser julgadas e as manchetes condenam antes
das pessoas saberem se têm processos. Muita gente fica nervosa e irritada e
temos que nos perguntar o que está acontecendo”. Como se ele não soubesse…
Fonte:
O Estado de
São Paulo