Últimas
Vozes - J.R. Guzzo
O ministro do STF Luís Roberto Barroso.| Foto: Nelson Jr./STF
Todo mundo, salvo os que não se interessam por esse tipo de coisa, sabe que não existe no Brasil o que nos regimes democráticos normais é conhecido como “segurança jurídica” – a expectativa racional, por parte dos governados, que as leis em vigor no país serão aplicadas quando a Justiça decide alguma questão.
É uma noção que desapareceu por aqui, por ação direta do STF e dos galhos mais altos do Poder Judiciário.
Whatsapp: entre no grupo e receba as colunas de J.R.Guzzo
Ninguém sabe, hoje, quais as leis que estão ou não estão valendo, porque são o STF e os seus subdepartamentos que decidem quais as leis que se aplicam e quais as que não se aplicam; depende de quem está acionando, ou de quem está sendo acionado.
À insegurança jurídica se junta agora a insegurança auditiva – ninguém mais sabe o que vai ouvir dos ministros quando eles falam fora dos autos, e eles passam a vida falando fora dos autos, principalmente em Nova Tork, Lisboa etc. e tal.
Os ministros do Supremo deram a si próprios o poder de decidir que a Constituição pode ser desrespeitada praticamente todos os dias.
A última surpresa nos foi oferecida pelo ministro Luís Roberto Barroso. Ele revelou, em mais um dos seus pronunciamentos à nação, que o STF passou, sim, a ser um “poder político” do Brasil, depois de “um vertiginoso processo de ascensão” – mas não faz “ativismo político”.
É mesmo? Como o STF pode ser uma coisa e não fazer a outra?
Pois aí está, exatamente, a fotografia do Brasil de hoje.
Os ministros do Supremo deram a si próprios o poder de decidir que a Constituição pode ser desrespeitada praticamente todos os dias; basta ver as decisões que tomam. Também deram a si próprios a licença de dizer coisas que não fazem nexo.
Quem autorizou o STF a ser um “poder político” neste país?
Alguma emenda constitucional, aprovada por três quintos da Câmara e Senado?
Foi algum plebiscito, ou coisa parecida?
Não se sabe; foi, segundo Barroso, uma ascensão “vertiginosa”, apenas, e é com isso que o público pagante tem de se contentar.
O ministro, como quase sempre acontece quando a “suprema corte” quer lançar algum manifesto, não apresentou nada que possa ser qualificado como argumento.
Foi, mais uma vez, o costumeiro angu mental que o STF consegue produzir, com muito palavrório e poucas ideias, quando quer dar instruções ao povo brasileiro.
Ao fim, sobrou unicamente um atestado do subdesenvolvimento generalizado da atividade intelectual no Brasil deste 2023.
Barroso tentou explicar o verdadeiro significado da palavra “ativismo”. Segundo ele, o que as pessoas comuns consideram ativismo não é ativismo. Pronto: fica resolvido assim, com uma canetada oral, o problema de explicar que diabo ele quis dizer quando afirmou que o STF “não pratica” ativismo político.
O que parece ser o raciocínio básico de Barroso para justificar as ações do STF tem a profundidade de uma poça d’água, das rasas.
Ele diz, basicamente, que as críticas às decisões do Supremo são feitas porque as pessoas “não gostam” do que foi decidido; nesse caso, Barroso diz que “sente muito”. É uma bula do Papa.
Não existe, por este modo de ver as coisas, a possibilidade de alguém discordar do STF com algum fundamento racional.
E quando alguém critica as barbaridades do Supremo da Venezuela, por exemplo – ou da Coreia do Norte, ou de qualquer das outras aberrações que existem por aí?
Será, também, uma questão de torcida? O ministro acha que sim. Ele sente muito.
J.R. Guzzo, colunista - Revista Oeste