A decisão do Banco Central de não subir os juros pode até mesmo ser sustentada tecnicamente, mas é inegável que o seu presidente Alexandre Tombini cometeu uma barbeiragem na condução do anúncio oficial, reavivando a desconfiança que fez o mercado apelidá-lo de “Pombini”, em referência à sua submissão à presidente Dilma.
Os “pombos” são mais condescendentes, enquanto os “falcões”, mais agressivos, estão sempre prontos a tomarem medidas radicais se necessário. Tombini tornou-se “Pombini” nas mãos da presidente Dilma, durante o período em que ela resolveu levar os juros a taxas históricas mais baixas sem que houvesse condição para isso.
Em abril de 2013 a taxa
Selic chegou à mínima histórica de 7,25%. A partir daí, a política voluntarista de queda dos
juros teve que ser abandonada diante da realidade inflacionária, e a taxa
voltou aos dois dígitos nas reuniões de novembro de 2013, no sexto aumento
consecutivo, que depois continuaram até a taxa chegar aos 14,25% de hoje.
Tombini, na decisão de ontem, não quebrou apenas a tradição de membros do Banco Central não
se pronunciarem nos dias de reunião, para não dar margem a especulações,
como deixou de lado abruptamente o objetivo de conter a inflação no teto
da meta inflacionária neste ano, para depois trazê-la ao centro no ano
seguinte. Após uma audiência fora da agenda com a presidente Dilma, negada
oficialmente, mas verdadeira para todas
as versões brasilienses, o presidente do Banco Central aproveitou a revisão
dos números do FMI para se pronunciar extemporaneamente sobre o documento,
insinuando que os novos números teriam influência na direção oposta ao que
havia sido sinalizado pelo Banco Central até aquele momento. Não há dúvida de
que os números ruins do FMI, piores do que o próprio
mercado estava prevendo para este ao –
queda de 3,5% do PIB – poderiam justificar uma
reanálise dos dados, mas não havia nenhuma razão para que Tombini
anunciasse isso ao mercado financeiro em meio à reunião que decidiria a
trajetória dos juros.
Além do
mais, a surpresa com que as autoridades monetárias
brasileiras foram apanhadas indicam que não havia segurança alguma sobre os números que estavam usando para
tomar suas decisões. O ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, disse ontem em
Davos que os números do FMI são apenas “projeções”,
e que a economia brasileira pode voltar a crescer antes do que o FMI prevê, mas
o fato é que “Pombini” os levou tão a
sério que quebrou diversas regras para anunciar a mudança de rota.
A
autonomia do Banco Central, considerada fundamental para dar
credibilidade à política monetária de qualquer governo, já era
vista pelo mercado financeiro como próxima do inexistente, e agora temos
a prova concreta de que a presidente Dilma interfere como quer nas decisões do
Banco Central, não encontrando resistência em “Pombini”. Até mesmo as informações dando conta de que o Palácio do
Planalto não gostara da nota de Tombini, pois ela poderia dar a entender que
houvera interferência de Dilma na decisão, mostra que o presidente do Banco
Central não está conseguindo nem mesmo fazer o jogo de cena necessário nesses
casos.
Na ânsia de justificar uma
mudança de estratégia, agora
voltada mais para o nível da atividade econômica, Tombini revelou sua fraqueza diante da presidente, ainda mais por
que dias antes, na carta em que justificou o não atingimento da meta de
inflação, o Banco Central reafirmara que sua missão estava focada em combater
efeitos da alta da inflação.
Muitos
economistas criticavam a tendência do Banco Central de aumentar mais ainda os
juros, alegando
que a recessão da economia só seria piorada com a medida. Mas há outros
economistas, como Alexandre Schwartsman, ex-diretor do Banco Central, que
acham que a recessão não é justificativa para não subir os juros. Ele considera que o país cometeu o mesmo
erro em 2011, ao reduzir os juros para combater os efeitos da crise
europeia, e acabou tendo uma recessão muito maior.
Fonte: Merval Pereira – O Globo