À esta altura do jogo, ninguém precisa de mais esclarecimentos sobre a conduta de Dilma
Rousseff no Palácio do Planalto, sua capacidade de
degenerar o próprio governo e a irresponsabilidade soberana com que toma, ou
acha que toma, suas decisões. Em todo caso, é sempre útil manter em
mente o potencial destrutivo que
conserva enquanto estiver exercendo oficialmente as funções de presidente da
República. Não é pouca coisa.
Justo agora, em mais um episódio
tenebroso de sua biografia, Dilma
se empenha abertamente em transformar o serviço público num mercado indecente, onde
vende cargos em troca de votos que a salvem do impeachment no Congresso.
Não é mais o que se poderia chamar de negociação política – virou tráfico, puro
e simples. São
de 500 a 800 postos em oferta, ao que parece; há contas indicando que podem ser
1.000.
Se precisasse, Dilma não conseguiria
comprovar um único caso de interesse publico nas nomeações que se propõe a
fazer – trata-se unicamente de compra e venda. “O PT é o partido da boquinha”,
disse certa vez o ex-governador Leonel Brizola. Mal imaginava que o PT acabaria não apenas como o campeão nacional da
boquinha, tomando para si tudo quanto é emprego público que lhe passa pela
frente; é também, no momento, o maior vendedor de boquinhas da praça.
Dilma conseguirá se safar com
isso? Com um
governo com a inépcia do seu, não dá para saber. É perfeitamente possível que a
operação toda acabe se transformando em apenas mais uma exibição de anarquia
explícita e incompetência em estado terminal. O governo não sabe exatamente quantos cargos pode vender, nem quais são
eles. Não sabe direito quem quer comprar; apenas imagina que seja gente
ligada a colossos da história política nacional como PP, PR, PSD, etc. Dilma não conhece a
vasta maioria dos que pretende nomear, como não tem ideia de quem são os que
pretende demitir. Não sabe, sequer, se Lula
vai ocupar ou não o ministério mais importante de seu governo – talvez já não saiba, nem mesmo, se ele
ainda quer o cargo. Fala-se que o governo vai socar “verbas” nos agraciados.
Que verbas? Todo
santo dia vem mais uma notícia sobre o estado pré-falimentar do Tesouro
Nacional – onde vão achar o
dinheiro para satisfazer o apetite da nova armada contra o impeachment? A
dívida bruta é recorde. A dívida líquida não é melhor. A lista dos
empregos empenhados na operação inclui, entre outros florões do serviço público
brasileiro, repartições especialmente sinistras sob a gestão do PT, como
Fundação Nacional da Saúde (em cuja
órbita já se roubou até sangue), Departamento Nacional de Obras Contra a
Seca, Companhia Nacional de Abastecimento e até uma Antaq, onde, acredite se
quiser, é administrado o “transporte
aquaviário” do país.
Um
probleminha, nisso tudo, é que entre os possíveis nomeados provávelmente haverá
gente tão encrencada com a corrupção quanto todos esses que estão por aí
tentando fugir da cadeia; assim que assumirem começarão a emergir suas folhas
corridas. Não se pode garantir, enfim, que haverá tempo
material para identificar e nomear os 500, 800 ou 1.000 cidadãos com os quais
Dilma espera fugir da deposição – o
processo de impeachment pode andar mais depressa do que as nomeações e, de
mais a mais, ninguém garante que os nomeados entreguem mesmo a mercadoria que
venderam.
Quem sabe, em sua calamidade, o
governo pudesse vender para algum interessado o comando da Força Nacional, criada para ajudar na segurança das Olimpíadas do
Rio de Janeiro? É uma ideia. Dilma ganhou de graça essa vaga. O
ocupante, coronel Adilson Moreira, se demitiu porque não quer mais, como disse em e-mail para os subordinados, servir a um
governo comandado por “um grupo
sem escrúpulos, incluindo aí a presidente da República”. O coronel
declarou-se “envergonhado”. Falou o
que milhões de brasileiros falariam, e esperam que os servidores públicos
decentes falem. É o contrário exato da manada que se precipita sobre as “bocas” que Dilma colocou em leilão no seu bazar.
Publicado
na revista EXAME - J. R. Guzzo