A ANP poderia ter aproveitado a oportunidade para acabar com o conluio das distribuidoras de combustível. Preferiu manter a farra das empresas que ditam as regras do mercado
Vencida a greve dos caminhoneiros, tudo voltou ao normal. O abastecimento de combustíveis foi restabelecido, mas há algo, porém, que não deverá retornar ao estágio anterior ao movimento: o preço nas bombas dos postos. Isso porque tudo retornou ao estado de antes: a lentidão da Agência Nacional do Petróleo (ANP) em combater o cartel das distribuidoras que dominam o mercado. Tão logo a greve se encerrou, a agência recuou e revogou a medida excepcional que suspendia a vinculação de marca para vendas de distribuidoras do produto líquido.
O mercado dos combustíveis distribuídos nos 40 mil postos brasileiros
é dominado por três grandes empresas: Raizen/Shell, Ipiranga e BR
Distribuidora, que detêm 70% do comércio de derivados de petróleo = [sob a forma de associação (disfarce para cartel) denominada Plural - e mais uma vez o MP silencia sobre o assunto; aliás, envolveu caminhoneiro, locaute de transportadoras e associação de revendedoras o MP opta pelo silêncio.]
Ou seja, tudo ficou como antes. O posto que tiver as cores da Raízen/Shell, Ipiranga ou BR Distribuidora fica impedido de comprar combustível em uma bandeira branca. Mesmo que o preço do litro seja mais baixo que o fixado pelas três gigantes do setor. Agindo assim, a ANP perde a oportunidade de livrar os empresários de postos das amarras impostas por essas empresas, que já duram uma década. Em 2008, a ANP sucumbiu ao lobby pesado do Sindicato Nacional das Empresas de Combustíveis e Lubrificantes (Sindicom). Na ocasião, o presidente da agência era Haroldo Borges Rodrigues Lima, nomeado pelo então presidente Lula.
Consumidor paga mais
Naquele ano, a ANP modificou uma resolução do Ministério de Minas e Energia que garantia aos postos escolher de qual distribuidora comprar combustível. Bastava apenas informar a origem na bomba. O resultado era imediato: ao comprar mais barato, a economia era repassada ao consumidor. Com a edição da nova regra, ficou vedada essa prática. Ou seja, o posto tinha de comprar combustível somente com a marca da distribuidora que estampava na fachada. Detentoras de 70% dos postos no País, a Raízen/Shell, Ipiranga ou BR Distribuidora passaram a ditar as regras – e os preços do litro dos combustíveis. O resultado foi imediato. Em dez anos, o faturamento dessas empresas saltou de R$ 78 bilhões (2007) para R$ 219 bilhões (2017).
Com a deflagração da greve, a ANP suspendeu a modificação na resolução do Ministério de Minas e Energia. Numa iniciativa de bom senso, a agência suspendeu essa vinculação entre postos e distribuidoras. A medida temporária suavizou as conseqüências do movimento grevista. Mas, como diz o ditado popular, o que é bom dura pouco: na terça-feira 5, a ANP cassou seu próprio ato, perdendo, assim, a oportunidade de fazer história.
Tudo como antes A agência controladora da política de preços dos combustíveis retrocedeu à norma anterior:
O mercado dos combustíveis distribuídos nos 40 mil postos brasileiros é dominado por três grandes empresas: Raizen/Shell, Ipiranga e BR Distribuidora, que detêm 70% do comércio de derivados de petróleo
Em 2008, diante de lobby das três companhias, a ANP, então dirigida por Haroldo Borges, determinou que os postos estavam impedidos de comprar combustíveis de uma distribuidora de bandeira branca, mesmo que os preços fossem mais baixos.
Em meio à greve dos caminhoneiros, que provocou grande crise de desabastecimento, a ANP suspendeu temporariamente, e em caráter excepcional, que os postos pudessem comprar das distribuidoras que melhor lhes atendessem, inclusive de bandeira branca, o que provocaria redução de preços
Mas foi apenas o abastecimento se regularizar, que a ANP voltou atrás e tornou a manter os efeitos nocivos do cartel
Ary Filgueira - IstoÉ