O julgamento do TSE é importante pelo que vai
decidir, seja qual for o resultado, pelo quadro sobre o qual se debruça,
pelo momento que o país vive e pelo roteiro intrincado que foi sendo
escrito nesses dois anos. O pior que pode acontecer é não haver decisão,
em consequência de um pedido de vista por alguma questiúncula, porque
isso o país entenderá como truque de protelação.
A economia não pode continuar em compasso de espera sobre esse
específico ponto da incerteza brasileira. A conjuntura continuará
incerta, havendo ou não cassação da chapa, mas um novo atraso será um
mergulho maior na crise institucional. O cidadão não pode concluir que
no TSE se conspira para que não haja punição para quem praticou crime
eleitoral. No meio do palavreado hermético e do ritual pesado e moroso da
Justiça, é possível entender que os grupos vão se formando de um lado e
de outro desse julgamento. O resultado é imprevisível, mas o que se
caminhou já é suficientemente ilustrativo do que precisamos corrigir na
democracia brasileira.
A campanha de 2014 não foi a única onde houve fraude, dinheiro ilegal
e um marketing criminoso. Mas foi talvez a pior delas. Como disse o
ministro Herman Benjamin, nada disso começou em 2003. Não mesmo, mas
tudo, naquele 2014, foi extremado. O que se sabe hoje das delações da
Odebrecht e das revelações dos marqueteiros é que dinheiro de propina
sustentou uma campanha milionária. A propaganda eleitoral do PT-PMDB
mentiu sobre a conjuntura, escondendo o que revelaria logo após o
fechamento das urnas, e atacou com agressividade pérfida os adversários
políticos.
Quando Marina Silva pareceu viável, foi acusada de se
preparar para tirar livros dos estudantes e comida dos pobres. O Bolsa
Família foi usado para chantagear os pobres. Voltou-se ao pior do
clientelismo, e o cidadão deixou de ser um portador de direitos para ser
um devedor de favores ao chefe político. É essa campanha que está no
banco dos réus. E é bom que esteja. Porque uma eleição assim deturpada
por marqueteiros sem limites éticos, e pelo dinheiro da propina tirada
de estatais, ameaça a democracia.
O ministro Herman Benjamin, ontem, foi rebatendo as últimas
preliminares, entrando devagar em seu voto, ainda não lido, mas
adiantando-se no mérito. Foi a forma de tratar de preliminares que
discutiam o conteúdo do que será tratado no voto. Para rebater o
argumento de cerceamento de defesa, o ministro mostrou que a defesa de
Dilma, em um dos depoimentos, fez 376 perguntas ao interrogado sem ter
nenhuma indeferida. Só um exemplo. Foi a própria defesa de Dilma que
pediu vários dos testemunhos que acabaram depondo contra ela. Quando os
advogados arrolaram testemunhas como executivos da Odebrecht e os
marqueteiros João Santana e Monica Moura, eles não eram colaboradores.
Santana e Monica foram ouvidos uma segunda vez a pedido do Ministério
Público Eleitoral, mas aí os advogados quiseram que os depoimentos
fossem anulados. O ministro disse que como relator procurou a “verdade
real”.
O mundo deu muitas voltas enquanto a Aime (Ação de Impugnação de
Mandato Eletivo), a Aije (Ação de Investigação Judicial Eleitoral) e a
representação tramitavam no TSE. O PSDB, autor das ações, chega ao
julgamento instalado no governo do presidente que pode ser cassado.
Dilma Rousseff e Michel Temer ficam na condição de inimigos íntimos,
porque defendem as mesmas posições e torcem pelo mesmo resultado. O
ministro Gilmar Mendes é o responsável por este processo estar ainda
sendo julgado, como disse ontem. A antiga relatora Maria Tereza pediu o
arquivamento, e Gilmar foi o voto divergente e o sustentou com
argumentos sólidos, que foram usados ontem por Herman Benjamin para
rebater as críticas às suas escolhas feitas, entre outros, pelo próprio
presidente do TSE. Gilmar disse que Herman Benjamin estava usando
argumento “falacioso”. Herman mostrou que o próprio Gilmar havia usado a
mesma tese.
No melhor cenário, esse julgamento estabelecerá limites para as
campanhas eleitorais, e pode ser, quem sabe, o começo de um novo tempo.
Se não houver punição, o TSE passará o sinal de que o vale-tudo pode
continuar.
Fonte: Coluna da Míriam Leitão - O Globo - Com Alvaro Gribel, de São Paulo
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quinta-feira, 8 de junho de 2017
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