Hoje, os 40 ladrões se multiplicaram. Os tesouros ficam num cofre de banco ou num sindicato e parte é alopradamente usada para comprar silêncios. Mas quem vende silêncio costuma delatar os compradores para sair da cadeia.
O problema, para o governo, é que as delações saem aos poucos. Se todas surgissem ao mesmo tempo, daria para inventar uma história boa, que arrumasse os fatos. Não está dando: inventa-se uma história bonitinha, eu não sabia, a casa era emprestada, toma que o filho é teu, e aí surge nova delação, desmentindo tudo. As denúncias de Delcídio, agora liberadas, são de arrepiar. E atingem, com gravação e tudo, o mais fiel dos fiéis, Aloizio Mercadante. Na sexta, quando Dilma disse que ia renun…, quer dizer, que não ia, ou sabe-se lá, quem era o único ministro a seu lado? Ele: Aloizio Mercadante. Que propôs a um assessor de Delcídio tudo o que fosse pedido, em troca de não haver delação premiada. Algum promotor mal-humorado pode entender isso até como obstrução à Justiça.
Delcídio cita Lula, Dilma, políticos do PP, PMDB, PT, PTB. E Delcídio pode ser fichinha: o deputado federal Pedro Corrêa, do PP, também decidiu falar. É do ramo, sabe como as coisas são feitas. Ele nunca quis aparecer: nomear e dividir, era disso que gostava. Pelo jeito, a Federal terá de importar japonês.
Aloprem-se
Lula deve favores a Mercadante – que, entre outras coisas, desistiu de uma eleição garantida para a Câmara Federal para ser vice de Lula, que não tinha chance. Mas, apesar disso, Lula não quer Mercadante por perto. Considera-o afoito, incapaz de um projeto que dê certo.
Foi Lula que chamou a equipe de Mercadante de “os aloprados” numa eleição estadual, em que José Serra já estava eleito. Os petistas acharam que valia a pena comprar um dossiê falso contra ele e foram apanhados. Por pouco não atrapalharam a reeleição de Lula em 2006.
Recordando
Pedro Corrêa está condenado a 20 anos e sete meses de prisão (e preso desde 10 de abril do ano passado), por recebimento de propina de R$ 11,7 milhões, 72 crimes de corrupção passiva, mais 328 operações de lavagem de dinheiro.
Mercadante, antes de buscar o assessor de Delcídio, tentou contato com a família do senador. Mas a esposa Maika recusou qualquer conversa com ele. Desde o início, irritada com o comportamento dos antigos companheiros de Delcídio, que o abandonaram, defendia que o marido optasse pela delação premiada.
Prevendo
Não dá para jurar que o autor dessas frases seja o citado. Mas é de ambos que me lembro. De Pedro Malan, ministro da Fazenda: “No Brasil, até o passado é imprevisível”. De Joelmir Beting, um dos maiores jornalistas do país: “Prognóstico bom só depois do jogo”.
Mas arrisquemos: Lula pode ir (ou não) para o governo. Mas não irá nem para a Fazenda nem para a Casa Civil, porque as empreiteiras e os amigos ainda não terminaram de reformá-las. Se for para o governo, e der certo, teremos, como nunca dantes neste país, uma ex-presidente em exercício (todas as manhãs, alguns quilômetros de bicicleta). Se não der certo, teremos dois ex-presidentes em exercício, até que o vice Temer os convide a descansar.
Vale tudo
A entrada de Lula no governo é a última tentativa de sobrevivência de Dilma. Lula sem dúvida é politicamente mais competente do que ela e qualquer dos seus ministros. Pode fazer algumas indicações interessantes – uma boa aposta seria Henrique Meirelles, que foi seu presidente do Banco Central, para o Ministério da Fazenda – isso se ele estiver disposto a aceitar as teses de Meirelles, que não assumirá pasta nenhuma para perder sua reputação.
Mas os riscos são altíssimos: primeiro, a discussão jurídica, se a nomeação tem ou não o objetivo de salvá-lo do juiz Sérgio Moro; segundo, a superexposição a que ficam submetidos sua esposa e três de seus filhos, que não têm foro privilegiado; terceiro, os resultados a curto prazo. Lula assumiu em 2003 como esperança e hoje está longe de ter o apoio de que já desfrutou. E, alvo de delação premiada (Delcídio o aponta como responsável por providências que podem causar problemas), sobreviverá?
O PMDB como é
OK, o PMDB decidiu, mais ou menos, afastar-se de Dilma, mas deu 30 dias de prazo para efetivar o rompimento – em outras palavras, espremer o resto do leite das tetas quase secas do governo. Ninguém precisa deixar seu cargo até lá.
Em compensação, nenhum membro do partido pode aceitar um convite – menos, naturalmente, o deputado Mauro Lopes, que esperava há tempos ser nomeado ministro da Aviação Civil. Como não disse Sua Excelência, o PMDB sempre lutou por cargos; vai mudar justo quando a vez dele chegou? Então, tudo bem, nada de inflexibilidade.
E, se mais cargos houver, mais exceções haverá.
Fonte: Coluna de Carlos Brickmann - http://www.brickmann.com.br/