Bancoop mudou projeto para garantir vista para o mar ao tríplex de Lula. Ricardo Berzoini representava o ex-presidente
Os privilégios recebidos pela família do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no caso do tríplex do Guarujá vão além de reformas pagas pela OAS. O projeto inicial do condomínio Mar Cantábrico - renomeado Solaris – foi alterado pela Cooperativa Habitacional dos Bancários de São Paulo (Bancoop) para se ajustar a exigências de Lula e da ex-primeira-dama Marisa Letícia. É o que apontam documentos enviados pelo Ministério Público paulista à força-tarefa da Lava Jato. ISTO É teve acesso a dois deles. O primeiro é o depoimento do corretor Temoteo Mariano.
Por anos, ele intermediou a aquisição de terrenos para a
cooperativa. Em 2003, participou da compra da área em que foram erguidas
as duas torres do condomínio Solaris. Temoteo afirmou, diante dos
promotores em fevereiro, que o empreendimento fora alterado pela Bancoop
para garantir o desejo de Lula de ter uma cobertura de frente para o
mar. Mudanças que trouxeram prejuízos a cooperados e contaram com a
participação do ministro e ex-dirigente da cooperativa, Ricardo
Berzoini.
No depoimento, Temoteo afirma ter sido “o primeiro a comprar um
imóvel naquele empreendimento”, em 2003. Adquiriu um apartamento de
frente para o mar no 10º andar da torre hoje chamada Salinas. Mas desfez
o negócio em poucos meses, após a Bancoop adotar uma medida
controversa. Mudou a localização dos quatro apartamentos de cada
pavimento para beneficiar o líder petista. “O ex-presidente da
República, Luiz Inácio Lula da Silva, através de Ricardo Berzoini, era
um dos aspirantes a uma unidade no prédio defronte ao mar”, afirma.
“Desde o início do empreendimento Mar Cantábrico já havia a prévia
solicitação do ex-presidente por uma cobertura. Ocorre que as unidades
defronte para a praia já estavam vendidas.”, diz. Nada que o
companheirismo da cooperativa ligada ao PT não pudesse resolver. A
Bancoop modificou “a numeração dos apartamentos constantes do projeto
original, ou seja, quem comprou as unidades finais 1 e 2 passou a ter a
vista traseira e quem comprou as unidades finais 3 e 4, passou a ter a
vista frontal para a praia.” O tríplex que, para os investigadores,
pertence a Lula é o 164A.
Outro ex-proprietário confirmou a inversão das unidades ao MP. Em 3
fevereiro, o corretor José Roberto Maifrino, que trabalhou para a
Bancoop, disse ter exigido a devolução das oito parcelas pagas após
descobrir que seu apartamento de final 2 não teria vista para o mar.
Procurou Carlos Della Libera, da empresa Dellpar, para entender a razão
da mudança. A firma, diz, desenvolvia empreendimentos com a
Bancoop. A resposta veio sem rodeios. Carlos Della Libera disse que
“Tomas (Edson Botelho Fraga, ex-diretor da Bancoop) mandou avisar que
era para mudar de empreendimento, porque questões internas da BANCOOP
sinalizavam a necessidade de mudança de posição dos apartamentos”,
afirma.
A mudança privilegiava, além de Lula, outros integrantes da cúpula da cooperativa. Nos
depoimentos, Temoteo e José Roberto revelam que a Bancoop fez outra
alteração na planta. Não existiam tríplex, como o de Lula, no projeto do
condomínio Mar Cantábrico - renomeado Solaris. Os maiores apartamentos
eram duplex. “Com a construtora antiga, que não era a ARCHTECH, nem a
OAS, havia a previsão de duplex e não tríplex”, afirmou Temoteo ao MP.
Autoridades desconfiam que o acréscimo de um andar nos apartamentos da
cobertura foram feitos para atender, entre outros, à família Lula. “São
afirmações importantes, eles conhecem a história do empreendimento desde
os primórdios”, diz o promotor paulista Cássio Conserino.
“Estas e outras oitivas, além de documentos, revelam que o
favorecimento ao casal é bem anterior ao Petrolão”, complementa. Para
Conserino, os relatos obtidos nestes e em outros depoimentos jogam pá de
cal na versão do ex-presidente de que ele teria comprado, apenas uma
cota de outra unidade em 2005. A defesa de Lula diz que ele e Marisa não
optaram por ficar com esta unidade nem por receber o dinheiro de volta
quando a Bancoop transferiu o empreendimento inacabado à OAS em 2009.
Outros proprietários foram obrigados a decidir em 30 dias sob o risco de
perder o dinheiro. Em 2014, Lula, Marisa e um filho do casal foram
vistos no tríplex. A primeira-dama acompanhou a reforma do imóvel, que
custou mais de R$ 700 mil e foi paga pela OAS.
O MP-SP pediu a prisão preventiva do ex-presidente no caso do
tríplex no Guarujá na quarta-feira 9. Lula teria cometido os crimes de
falsidade ideológica e lavagem de dinheiro. A Justiça, no entanto,
enviou a denúncia ao juiz federal Sergio Moro, que cuida da Lava Jato.
Na terça-feira 22, o ministro Teori Zavascki, do Supremo Tribunal
Federal, determinou que a investigação fosse remetida ao STF. No meio
jurídico, no entanto, é dado como certo que as investigações sobre o
tríplex voltarão aos domínios de Sergio Moro.
Fonte: Pedro Marcondes de Moura - Revista Isto É