As Olimpíadas põem o
Rio de Janeiro em situação de risco, devido à presença de grandes delegações de
atletas dos países diretamente envolvidos nos conflitos do Oriente Médio
Os atentados de Nice, na França,
e de Munique, na Alemanha, na sexta-feira, acenderam a luz amarela dos
serviços de segurança do Brasil e das principais potências ocidentais em
relação às Olimpíadas do Rio de Janeiro a duas semanas dos jogos. Por
aqui, o fato relevante foi a prisão preventiva, pela
Polícia Federal, de 11 suspeitos de envolvimento com Estado Islâmico, que supostamente estariam se organizando
para realizar um ato terrorista e agora correm o risco de serem enquadrados
na nova Lei Antiterror.
O episódio reacende o debate
sobre a segurança dos jogos e os direitos e garantias individuais, porém, em contexto muito
diferente das prisões dos black blocs durante as grandes manifestações de junho
de 2013, que antecederam a Copa do Mundo de 2014. A
paranoia em relação ao terrorismo no Brasil, diante dos atentados de
inspiração islâmica na Europa e nos Estados Unidos, não
é uma coisa sem sentido. A maioria dos ataques de “lobos solitários” ou grupos ligados virtualmente ao Estado
Islâmico foi perpetrada por indivíduos que haviam sido monitorados pelos
serviços secretos dos respectivos países.
As Olimpíadas são o maior evento
de massas do mundo e, de
fato, põem o Rio de Janeiro em situação de risco, devido à presença de grandes
delegações de atletas dos países diretamente envolvidos nos conflitos do
Oriente Médio, particularmente na guerra contra o Estado
Islâmico na Síria e no Iraque. É nesse contexto que o governo interino
de Michel Temer, responsável pela segurança das Olimpíadas, empunha a bandeira da ordem, às vésperas da
votação do impeachment da presidente afastada Dilma Rousseff, de quem herdou o problema e pode fazer desse limão uma doce
limonada.
Ordem e Progresso, o lema
positivista da bandeira nacional, é o slogan oficial do governo Temer. Adotado no contexto que resultou no afastamento de Dilma
Rousseff, parecia uma sacada artificial e démodé, em meio à crise
econômica, política e ética. A onda
terrorista protagonizada por indivíduos que se associam ao Estado Islâmico pelas
redes sociais, porém, com a aproximação das Olimpíadas, fez da
manutenção da ordem uma necessidade real. O que não se pode é derivar para
a lógica do Estado Leviatã.
Terror
e tráfico
Publicado em 1651, O Leviatã, de Thomas Hobbes, foi uma resposta à Guerra Civil inglesa, provocada pela destituição do rei Carlos I pelo parlamento, em meio ao conflito entre anglicanos e presbiterianos. O resultado foi o caos, uma guerra de todos contra todos, que Hobbes atribuiu à natureza humana. Segundo ele, sem uma ordem política estabelecida, a vida se torna “solidária, pobre, repugnante, brutal e breve”. Para construir uma sociedade é necessário que cada indivíduo renuncie a uma parte de seus desejos e chegue a um acordo mútuo de não aniquilação com os outros. Nasceu daí a ideia hobbesiana do “contrato social”, de modo a transferir os direitos que o homem possui naturalmente sobre todas as coisas em favor de um soberano dono de direitos ilimitados. Este monarca absoluto, cuja soberania não reside no direito divino, mas nos direitos transferidos, seria o único capaz de fazer respeitar esse contrato e garantir, desta forma, a ordem e a paz, exercendo o monopólio da violência que, assim, desapareceria da relação entre indivíduos.
Publicado em 1651, O Leviatã, de Thomas Hobbes, foi uma resposta à Guerra Civil inglesa, provocada pela destituição do rei Carlos I pelo parlamento, em meio ao conflito entre anglicanos e presbiterianos. O resultado foi o caos, uma guerra de todos contra todos, que Hobbes atribuiu à natureza humana. Segundo ele, sem uma ordem política estabelecida, a vida se torna “solidária, pobre, repugnante, brutal e breve”. Para construir uma sociedade é necessário que cada indivíduo renuncie a uma parte de seus desejos e chegue a um acordo mútuo de não aniquilação com os outros. Nasceu daí a ideia hobbesiana do “contrato social”, de modo a transferir os direitos que o homem possui naturalmente sobre todas as coisas em favor de um soberano dono de direitos ilimitados. Este monarca absoluto, cuja soberania não reside no direito divino, mas nos direitos transferidos, seria o único capaz de fazer respeitar esse contrato e garantir, desta forma, a ordem e a paz, exercendo o monopólio da violência que, assim, desapareceria da relação entre indivíduos.
Ironicamente,
foi a ditadura de Cromwell, o “Lorde
Protetor”, que primeiro deu forma ao Estado Leviatã
e realizou a revolução burguesa na Inglaterra. Mais tarde, em 1689, na
Revolução Gloriosa, que foi pacífica, o parlamento promulgou a Declaração dos
Direitos (Bill of Rights), que serve
de base para o parlamentarismo monárquico britânico.
A crise humanitária do
Mediterrâneo e os atentados terroristas na Europa parece reproduzir o “estado natural” descrito por Hobbes no
Leviatã. São consequências da guerra
civil e do caos que se instalaram com a desestruturação dos estados nacionais do Iraque
e da Síria pelas desastradas intervenções das potências ocidentais, lideradas pelos Estados Unidos durante o governo Bush, após
o 11 de Setembro de 2003, que agravaram ainda mais os conflitos do
Oriente Médio e do Afeganistão. O Brasil manteve-se sempre à margem desses
conflitos, apesar das grandes
comunidades brasileiras de origem árabe e judaica.
Entretanto,
os indicadores de violência e a presença
ostensiva do tráfico de drogas no país, principalmente no Rio de Janeiro, se assemelham a uma espécie de “guerra civil” não declarada. Não há registro de conexões entre traficantes e supostos apoiadores do
Estado Islâmico, mas nem por isso deixa de ser
prudente a transferência dos chefes das
quadrilhas que atuam no Rio de Janeiro de Bangu para presídios federais de
segurança máxima em outros estados e a
prisão temporária de suspeitos de envolvimento com organizações terroristas.
[só não é prudente juntar as duas
categorias de bandidos; durante o Governo Militar essa convivência aconteceu e
dela resultou o PCC, o VC, o 3º Comando, governadores corruptos – sendo que
todos passaram por esse período de convivência harmoniosa.
Devem ir para presídios de segurança
máxima distintos, a única forma de que realmente permaneçam isolados.] O que não se pode, porém, é
derivar para uma concepção de segurança pública contrária aos fundamentos da
democracia, ainda mais num ambiente político pautado pelo processo de
impeachment da presidente Dilma Rousseff.