Eliane Cantanhêde
Juntando as duas pontas, significa que a polarização política do País, já forte e irracional, deve atingir níveis praticamente insuportáveis
O ex-presidente Lula já saiu da prisão chamando o presidente Jair
Bolsonaro para briga. Depois de correr solto neste seu primeiro ano de
governo, digladiando contra a mídia e inimigos imaginários, Bolsonaro
passa, portanto, a ter finalmente oposição. E não uma oposição qualquer. Juntando as duas pontas, significa que a polarização política do País,
já forte e irracional, deve atingir níveis praticamente insuportáveis.
De um lado, as esquerdas reunidas em torno de Lula, tentando se livrar e
erros e acusações que não evaporam com o "Lula Livre". Do outro, a
direita pendurando-se em Bolsonaro, fingindo que não há nada demais na
defesa de tortura e AI-5 nem nos ataques ao meio ambiente e aos aliados
históricos do Brasil no mundo.
[se espera do presidente Bolsonaro o BOM SENSO de simplesmente DESPREZAR Lula - lembrar que se trata de um criminoso CONDENADO por corrupção ativa e passiva, lavagem de dinheiro e que está, TEMPORARIAMENTE, fora da cadeia.
O destino de Lula é o ostracismo e antes do próximo Natal concluirá que preso chamava mais atenção - especialmente quando se consolidar o entendimento de que a Lei da Ficha Limpa continua impedindo sua candidatura.]
O que ainda não está claro é em que arena esse embate vai ocorrer. Lula
terá força para arregimentar multidões nas ruas das capitais e grandes
cidades? Bolsonaro conseguirá reagir à altura? E até que ponto pode
contagiar o Congresso, numa época de votações de grandes reformas
estruturais?
Os precedentes não indicam uma guerra campal, depois que o impeachment
de Dilma Rousseff ocorreu sem grandes manifestações pelo País ou
protestos diante do Congresso Nacional. Na prisão de Lula ninguém matou,
ninguém morreu, como previra a presidente do PT, Gleisi Hoffmann. E até
a reforma da Previdência passou tranquilamente, sem oposição de rua (ou
gramados).
No seu discurso a militantes, logo ao sair da carceragem da PF em
Curitiba, Lula elegeu aliados e inimigos. Os aliados são os de sempre, o
PCdoB, o PSOL, a CUT, o MST... Os inimigos são Bolsonaro, tratado com
provocações, e a força-tarefa da Operação Lava Jato, acusada de "banda
podre" do Estado. Aí incluídos Justiça, Ministério Público e Polícia
Federal, que, segundo ele, "não prenderam um homem, tentaram matar uma
ideia".
Foi uma repetição praticamente literal do que o mesmo Lula já tinha dito
quando da prisão, 580 dias antes. Isso reforçou a sensação de que ele
entrou e saiu com o mesmo discurso, os mesmos alvos e os mesmos amigos
do peito, como a própria Glesi. Aliás, Lula confirmou que vai casar com a
socióloga Rosângela Silva e não dedicou uma única palavra a Dona
Marisa, companheira de décadas, mãe de seus filhos.
Eliane Cantanhêde, colunista - O Estado de S. Paulo