Revista Oeste
O presidente do Brasil, pelo que ele próprio faz questão de dizer, está a favor da China e da Rússia, as duas ditaduras mais ativas do mundo de hoje, para não contar as Cubas e as Nicaráguas da vida
O presidente Lula jogou o Brasil num mundo de trevas em sua viagem à China — e escureceu as coisas ainda mais, logo em seguida, quando culpou a Ucrânia pela invasão de seu próprio território e pela guerra que há mais de um ano destrói o país, já matou milhares de pessoas e viola diariamente todas as leis do direito internacional.
É mais prático ir por partes — pela China e pela economia, primeiro. Lula, em sua proposta mais ofensiva aos interesses do Brasil, mais indecente em favor dos interesses da China e certamente mais idiota entre as que já fez na vida, disse que quer fazer o seguinte: o Brasil deixa de receber em dólares as exportações que faz para a China (o maior comprador de produtos brasileiros em todo o mundo), e passa a receber em yuans; a China passa a receber em reais o que vende para o Brasil. (Há “detalhes” que ele não tem ideia de quais são, é óbvio; mas a essência do seu “plano” é essa.)
Não se trata de um tiro no pé. É mais um tiro na boca do próprio estômago. Lula, para demonstrar o alcance filosófico de suas meditações sobre a circulação de moedas nos mercados mundiais, disse que não “entende” por que “todo mundo é obrigado a usar o dólar” no comércio internacional; preocupa-se com isso, segundo revelou, todas as noites. Ele não “entende” por uma razão bem simples: nunca perguntou a ninguém, já que sabe tudo, sobre todos os assuntos. Se tivesse perguntado, não estaria perdendo seu sono.
Ninguém obriga ninguém a aceitar dólares; é o exato contrário. São os países, as empresas e as pessoas que querem receber o que vendem em dólar, pois é a moeda mais segura, mais líquida e mais desejada do mundo — por decisão do mundo, e não por um decreto do governo americano, como Lula acha que é. Ninguém quer receber nada em yuan, nem em real e nem em peso argentino, como Lula sugeriu na sua declaração na China — sim, ele falou até em peso argentino para substituir o dólar, acredite se quiser. Ninguém quer porque ninguém faz nada com um yuan, nem com um real e muito menos com um peso argentino, que hoje derrete a um ritmo de 100% de inflação ao ano. Não dá para comprar, com esse tipo de dinheiro, nem uísque paraguaio.
A submissão do Brasil aos interesses da Rússia é outra prova de que a política externa brasileira, pela primeira vez nos últimos 80 anos, se aliou às ditaduras e contra as democracias
Os dólares desprezados por Lula também são essenciais para formar as reservas internacionais do Brasil em moeda forte; nenhum país do planeta tem reservas em yuan, ou em peso. De novo, não é uma questão de desejos, nem de “costura política” — o Brasil precisa das suas reservas, hoje na casa dos 300 bilhões de dólares, para manter a sua independência econômica. É como oxigênio: sem dólar ninguém é independente. É por isso que você não vê missões do FMI no Brasil — nem “exigências dos credores”, nem falta de dólares para fazer importações ou viagens. É por isso que o Brasil, ou as grandes estatais, ou as empresas brasileiras podem levantar crédito nos bancos e organismos financeiros internacionais. É por isso, em suma, que o Brasil é um país solvente. É o contrário, exatamente, da Argentina — o sonho econômico que Lula persegue com tanto fervor. Outra dificuldade é o valor que os chineses vão dar às mercadorias brasileiras, nesse novo sistema que Lula está achando lindo adotar. O Brasil será obrigado a vender maciçamente na China; quem você acha, no caso, que vai fazer os preços dessas exportações, sobretudo quando se considera que a economia chinesa trabalha com estoques que lhe permite, o tempo todo, importar mais ou menos, conforme queira? Ilustração: Shutterstock
Lula usa relógio Piaget de R$ 80.000 | Foto: Reprodução/Redes sociais
O fato é que não há nada de honesto, ou de útil para a população brasileira, ou de democrático, em nenhuma das decisões que Lula tomou desde que teve certeza de que seria declarado vencedor das eleições de 2022 pelo TSE. A submissão do Brasil aos interesses da Rússia é outra prova de que a política externa brasileira, pela primeira vez nos últimos 80 anos, se aliou às ditaduras e contra as democracias. Está valendo tudo, aí. Como é possível alguém dizer que a Ucrânia é culpada pela invasão do seu próprio território? (Lula chama a área invadida de “terreno”; acha que está lidando com uma questão imobiliária.) Não é apenas o zé-mané ignorante querendo se meter em conversa de gente maior que ele, ou o amador no meio de profissionais espertos; é isso, mas também é pior que isso. No caso, foi uma licença para a Rússia afirmar, oficialmente, que o Brasil apoia a invasão da Ucrânia, como disse o ministro russo de Relações Exteriores. Disse com toda a razão: é o que Lula fez, na prática e em público. De novo, a comparação com Bolsonaro: ele foi massacrado pela viagem que fez a Moscou, antes da guerra, por ter colocado o Brasil “a reboque” da Rússia e “isolado das democracias”. Mas Bolsonaro nunca disse uma sílaba em favor da invasão da Ucrânia, como Lula acaba de fazer. Quem, então, é a favor da ditadura?
Esse ministro russo, que o mundo democrático trata como uma espécie de renegado, foi recebido pessoalmente por Lula, com todas as honras, na viagem que fez ao Brasil logo após o presidente ter voltado da China. Por uma dessas coisas que antigamente as pessoas chamavam “castigo de Deus”, Lula estava com o homem na sua sala no mesmo dia, exatamente, em que o oposicionista Vladimir Kara-Murza foi condenado num tribunal da Rússia a 25 anos de cadeia fechada — isso mesmo, 25 anos — pelos crimes de “fake news” e de participação num grupo político “indesejável”, ou “antidemocrático”. Parece com o que, essa condenação?
É o mundo que as polícias de repressão ao pensamento do governo Lula, a esquerda radical e o STF querem impor ao Brasil; ainda não conseguiram, mas estão fazendo o possível para chegar lá. Tudo isso, naturalmente, é tratado pela maioria da mídia como uma questão “técnica” de diplomacia. Do ponto de vista “pragmático”, perguntam os jornalistas, quais os prós e contras da dupla opção de Lula pela China e pela Rússia? No máximo, e com respeito de igreja, se fala em possíveis “desconfortos”, ou “ruídos” ou “restrições” que poderiam estar ocorrendo, quem sabe, com sua guerra ao dólar e com sua declaração que a Ucrânia é culpada pela guerra. É, mais uma vez, a mídia brasileira apresentando ao público o lado bom do suicídio.
As posições de Lula e dos extremistas do seu governo são um ataque direto à democracia. O resto é farsa.
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J. R. Guzzo, colunista - Revista Oeste