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quinta-feira, 22 de fevereiro de 2024

A guerra de Lula - O Estado de S. Paulo

Opinião do Estadão

Na ânsia de se autopromover como líder global dos ‘pobres’ contra os ‘ricos’, Lula reduziu o Itamaraty a linha auxiliar de sua ideologia maniqueísta e de seu voluntarismo narcisista 

O presidente Lula da Silva parece ter declarado guerra ao Ocidente. Uma guerra imaginária, claro, mas nesse delírio o petista pretende posicionar o Brasil na vanguarda da luta contra tudo o que simboliza os valores ocidentais – tendo como companheiros de armas um punhado de notórias ditaduras, como China, Rússia, Irã e Venezuela.

A irresponsável declaração de Lula sobre Israel, comparando a campanha israelense contra os terroristas do Hamas ao Holocausto, está perfeitamente alinhada a esse empreendimento ideológico. Não foi, portanto, fortuita nem acidental.

Lula parece empenhado em usar seu terceiro mandato para lançar-se como líder político do tal “Sul Global”, uma espécie de aggiornamento do “Terceiro Mundo” dos tempos da guerra fria. Nessa nova ordem, as características distintivas do Ocidente – democracia, economia de mercado e globalização são confrontadas por regimes autocráticos que buscam reviver o modelo que põe o Estado e a soberania nacional em primeiro lugar, à custa das liberdades individuais, direitos humanos e valores universais, denunciados como armas retóricas das democracias liberais para perpetuar sua supremacia.

No confronto Ocidente-Oriente, a geopolítica e a segurança nacional prevalecem sobre a economia e a globalização. A geopolítica multilateral do pós-guerra se fragmenta em arranjos insuficientes para as necessidades de cooperação ante desafios globais, como mudanças climáticas, pandemias, terrorismo e guerras.

O Brasil não está imune a essas incertezas, mas, comparativamente, tem vantagens. Suas dimensões, sua democracia multiétnica e pacífica e sua economia relativamente industrializada e diversificada o tornam uma potência regional. Seus recursos o colocam numa posição-chave para equacionar o tripé do desenvolvimento sustentável global: segurança alimentar, energética e ambiental.

Nessas águas turvas e tumultuosas, sem grandes instrumentos de poder, o País precisa, para defender interesses nacionais e promover os globais, de sutileza, inteligência e credibilidade. 
Felizmente, conta com uma tradição diplomática consagrada nos princípios constitucionais do respeito aos direitos humanos, à democracia e à ordem baseada em regras, e corporificada nos quadros técnicos do Itamaraty.
 
Mas esse capital está sendo dilapidado pela diplomacia sectária do presidente Lula da Silva. Lula já disse que a democracia é relativa. Mas sua política externa é definida por um princípio absoluto: a hostilidade ao Ocidente (o “Norte”, os “ricos”) e o alinhamento automático a tudo o que lhe é antagônico.

Sua passagem pela África foi um microcosmo desse estado de coisas. Interesses econômicos foram tratados de forma ligeira. Em entrevista, ele se evadiu de cobrar a Rússia e a Venezuela por sua truculência autocrática, ao mesmo tempo que insultou judeus de todo o mundo ao atribuir a Israel práticas comparáveis às dos nazistas.

Seja em conflitos onde o País teria força e autoridade para atuar, como os da América Latina, seja naqueles nos quais não tem força, Lula se alinha ao que há de mais retrógrado e autoritário. Abrindo mão de sua neutralidade, o País se desqualifica como potencial mediador. 
O Brasil poderia promover seus interesses econômicos e pontos de cooperação com a Eurásia sem prejuízo da defesa de valores civilizacionais comuns ao Ocidente. Mas Lula sacrifica os últimos sem nenhum ganho em relação aos primeiros. 
Em sua ânsia de se autopromover como líder global dos “pobres” contra os “ricos”, reduziu a máquina do Itamaraty a linha auxiliar de sua ideologia maniqueísta e seu voluntarismo narcisista.
 
A “frente ampla democrática” propagandeada na campanha eleitoral deveria ter sido projetada para as relações internacionais. 
Mas também aqui ela se mostrou uma fantasia eivada de sectarismo ideológico – arrastando consigo o Brasil, obliterando suas oportunidades de integração econômica e prejudicando possibilidades de cooperação pela promoção da paz, da democracia, dos direitos humanos e das liberdades fundamentais que a Constituição traçou como norte da diplomacia nacional.


Notas & Informações - O Estado de S. Paulo


quarta-feira, 21 de fevereiro de 2024

Hipocrisia - Lula e as “vidas inocentes” - Gazeta do Povo

 Rodrigo Constantino

O primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, convocou o embaixador do Brasil em Israel para reunião de “repreensão severa”. [repreensão severa? aquela foi a famosa 'comida de ... .]

"E não deixaremos de lutar pela proteção das vidas inocentes em risco. É disso que se trata". Diz trecho em destaque no comunicado da página da Presidência da República do Brasil no antigo Twitter. "O embaixador de Israel em Brasília e o governo Netanyahu foram informados de que o Brasil reagirá com diplomacia, mas com toda a firmeza, a qualquer ataque que receber, agora e sempre", diz o restante.

A vitimização sempre foi a arma preferida da esquerda radical. 
Ela destila ódio, promove ataques pérfidos, faz comparações absurdos e prega ideias abjetas, mas quando alguém reage de forma dura, a esquerda sempre banca a vítima. 
No caso, Lula tenta se sair como o humanitário que "talvez" tenha se excedido na forma, mas tinha belas intenções no conteúdo. É o antissemita "do bem", digamos.

O presidente nunca se manifestou solidário às milhares de vítimas fuziladas no paredão cubano, para dar o exemplo mais óbvio.

Vamos checar se há mesmo certa coerência nessa incrível preocupação com vidas inocentes – ignorando os números incríveis que os petistas repetem com base em dados do próprio Hamas, que controla a Faixa de Gaza há duas décadas. 
Se tudo se resume a uma consternação com a quantidade de palestinos mortos – e deixando de lado que o único culpado por isso é o próprio Hamas, cabe questionar por onde anda Lula além do Oriente Médio (ou mesmo por lá).
 
O presidente nunca se manifestou solidário às milhares de vítimas fuziladas no paredão cubano, para dar o exemplo mais óbvio. Ao contrário: Lula sempre enalteceu Fidel Castro, o maior assassino do continente.  
Lula tampouco demonstrou sequer preocupação com milhões de venezuelanos mortos, presos ou exilados pela ditadora companheira de Chávez e depois Maduro
Quem foge para Roraima em busca de liberdade e oportunidade está mesmo em desespero. Lula não liga.
 
Daniel Ortega persegue inocentes na Nicarágua, mas Lula defende seu companheiro. 
O Irã, dos aiatolás xiitas que financiam o Hamas, pune minorias, prende inocentes, mas Lula jamais se mostrou preocupado
Isso sem falar da China, cujo Partido Comunista controla o povo a mão de ferro tem sete décadas, chegando a promover uma chacina em 1989 de milhares. Lula não se manifesta.
 
Agora mesmo morreu mais um crítico de Putin na Rússia, preso, depois de clara tentativa de envenenamento. Todos sabem que foi o Kremlin. 
Lula alega desconhecer os detalhes e faz pouco caso, banalizando mais esta morte. 
Milhares morrem na Ucrânia invadida por Putin, mas Lula quer, no máximo, resolver tudo numa conversa de bar, enquanto no fundo passa pano para as atrocidades do ditador russo.
 
Lula liga mesmo para as vidas de milhares de mulheres e crianças palestinas? 
Ele adquiriu de repente, do nada, uma sensibilidade ausente desde sempre? 
Se fosse o caso, ele estaria condenando, repito, o Hamas, não Israel por se defender. 
É o Hamas que mantém as próprias mulheres e crianças como escudo humano, escravizadas, reféns.
Mas Lula não dá a mínima para essas pessoas, claro. 
Ele só liga para seu projeto de poder. 
E por isso fez o cálculo de que era hora de dobrar a aposta e aproximar o Brasil da China, da Rússia e do Irã, demonizando Israel. 
As mulheres e crianças palestinas não têm nada com isso. São apenas instrumentos de retórica.
 
Conteúdo editado por: Jocelaine Santos
 
 
Rodrigo Constantino, colunista - Gazeta do Povo
 

quarta-feira, 8 de novembro de 2023

O que é um judeu? O caso Herzl - Gazeta do Povo

Bruna Frascolla - VOZES

Sionismo

 

 Theodor Herzl com sua família perfeitamente europeia. O menino não é circuncidado.| Foto: Domínio público

A escalada do conflito em Israel voltou os holofotes para o sionismo. De um lado, diz-se que o sionismo é uma coisa essencialmente maléfica; de outro, diz-se que ser contra o sionismo é o mesmo que tatuar uma suástica na testa
Arrisco dizer, porém, que a imensa maioria dos que falam sobre sionismo não fez mais que seguir as exortações e invectivas dos seus influencers prediletos, sem se dar ao trabalho de averiguar nada. 
Ninguém tem obrigação de saber sobre tudo, claro. 
Mas o mínimo que se espera é que, quando não temos a pretensão de conhecer um assunto, não subamos em palanques virtuais para pedir cabeças e dar chiliques.

Como faz parte da minha profissão escrever sobre as coisas – e como, ainda por cima, tenho interesse em história do pensamento racial por causa das semelhanças entre o neorracismo negro e o nazismo –, fiz o elementar: li O Estado Judeu (1895), de Theodor Herzl, a fim de comentá-lo aqui. Esse opúsculo é a fundação do sionismo (ou do “sionismo moderno”, como dizem os sionistas mais ousados que alegam que o sionismo está na Torá).

Theodor Herzl (1860 – 1904) nasce em Peste (metade de Budapeste), no Império Austro-Húngaro, numa família de judeus assimilados. O que é um judeu assimilado?

Bom, o judaísmo é pelo menos duas coisas ao mesmo tempo: uma religião e uma etnia
Ao contrário das demais religiões abraâmicas, o judaísmo não faz proselitismo e não está de portas abertas para a entrada de qualquer um. Nem sempre foi assim. 
Na Antiguidade tardia, os judeus converteram pelo menos dois grupos populacionais relevantes: algumas tribos nômades dos cazares, que ficavam rodando pela atual Ucrânia, Rússia e Cazaquistão, e algumas vilas etíopes. 
Os etíopes ficaram em relativo isolamento na maior parte da História, mas hoje judeus negros têm direito à cidadania israelense e, de fato, a esmagadora maioria vive lá hoje. 
Já os cazares, que deixaram de existir enquanto povo ou tribo, deixaram descendentes entre os judeus asquenazitas. Isso não quer dizer que os judeus asquenazitas não têm origem hebraica; quer dizer somente que são mestiços que têm o sangue dessa tribo extinta de língua túrquica.
De meados do século XIX a meados do século XX, floresceu o racismo científico. Por isso, o judaísmo era facilmente identificado com uma raça. À epoca de Herzl, portanto, um “judeu assimilado” era um indivíduo de raça judaica que aderiu à cultura do seu meio. 
Isso poderia incluir a conversão à cristandade, ou a adoção de um cientificismo ateu.
 
Theodor Herzl, então, era um judeu assimilado no Império Austro-Húngaro. Sua primeira língua era o alemão e ele era um fervoroso germanófilo em sua juventude: achava que a germanização progressiva faria os indivíduos de origem judaica, como ele, a evoluírem. No âmbito pessoal, tinha planos de ser um grande engenheiro. 
O motivo era o Canal de Suez, um grande um projeto utópico dos sansimonianos que acabou dando certo. 
Os sansimonianos eram engenheiros utópicos e predecessores tanto do positivismo como do marxismo. 
 Fizeram parte do movimento, inclusive, judeus sefarditas franceses, os Irmãos Pereire (um afrancesamento de Pereira), que eram banqueiros rivais dos Rothschild, também banqueiros judeus, porém asquenazitas.
 
Herzl não deu certo na engenharia e foi para as humanas. Virou jornalista, poeta e folhetinista (profissão hoje extinta, a do escritor de romances que saíam em capítulos nos jornais, como novela de TV, só que por escrito: Machado de Assis e Victor Hugo eram folhetinistas). 
Um episódio, porém, o converteu num ativista político: o Caso Dreyfus (1894 - 1906). 
Em resumo, um militar francês de origem judaica, Alfred Dreyfus, perdeu as patentes e foi condenado pela França à prisão perpétua por traição, mesmo sendo inocente.  
No fim, após grande comoção pública, Dreyfus foi inocentado e recuperou as patentes. A França é um país bem antissemita (basta comparar a boa vontade dos franceses para delatar aos nazistas gente de sangue judaico); assim, restou claro que o preconceito contra a origem racial de Dreyfus foi o motivo da condenação.
 
Para piorar, o demagogo Karl Lueger, na Áustria-Hungria natal de Herzl, arrastava multidões com sua pauta antissemita. Foi um modelo para o jovem austríaco Adolf Hitler. 
Assim, Theodor Herzl viu frustrada a sua ideia de viver reconhecido como um germânico pleno, cultor da língua. Daí resultou a sua ideia do Estado Judeu. O Caso Dreyfus começa em 1894; em 1895 sai Der Judenstaat, ou O Estado Judeu.

Mas o que é um judeu? Essa é uma questão com a qual Herzl se bate no seu opúsculo. Herzl decididamente não era um religioso: não se deu nem mesmo ao trabalho de circuncidar o filho. No entanto, a “fé” é apenas a segunda das duas coisas apontadas que unem o povo judeu, e aparece como fator de união só do meio para o fim do escrito. A primeira dela é o antissemitismo. Diz ele: “Nós somos um povo: nossos inimigos nos fizeram um só sem o nosso consentimento, como sempre acontece na História. Nós nos unimos no sofrimento, e no sofrimento descobrimos, de repente, a nossa força. Sim, nós temos a força para construir um Estado; na verdade, um Estado Modelo.” (Eis o alemão para quem quiser comparar: “Wir sind ein Volk – der Feind macht uns ohne unseren Willen dazu, wie das immer in der Geschichte so war. In der Bedrängniss stehen wir zusammen und da entdecken wir plötzlich unsere Kraft. Ja, wir haben die Kraft, einen Staat, und zwar einen Musterstaat zu bilden.” Basta ir no Wikisource, pois o texto original está em domínio público. Os direitos das traduções são outra história.)

Abstraída a questão religiosa, o que é um judeu? Para Herzl, um judeu é aquele que é perseguido por ser judeu. Assim, uma consequência óbvia tirada pelos contemporâneos de Herzl é que ele fomentaria o antissemitismo para fazer prosperar o seu projeto político. Do mesmo jeito que os líderes do movimento negro precisam aumentar o racismo para provar que o seu próprio trabalho é fundamental. A pretensão de falar em nome da coletividade dos judeus também lembra o identitarismo. Mas o que me salta às vistas nesse trecho é a possibilidade de criar uma identidade baseada na opressão social, em vez de numa realidade concreta. Transfira isso para a definição de “mulher” e pense no que pode dar.

Herzl se defende das acusações de que ele precisa criar antissemitismo onde não há, ou aumentar onde já há. A sua defesa consiste em atacar a “assimilação”, dizendo ser ela impossível, exceto por meio dos casamentos mistos. Só por meio da miscigenação os judeus poderiam ser assimilados: “A assimilação, pela qual compreendo não só a mera aparência exterior das roupas, dos estilos de vida, dos costumes e da língua, mas, em vez disso, uma identificação em um sentido e um tipo... A assimilação generalizada dos judeus só poderia ser feita por meio dos casamentos mistos.” (Em alemão, procurar pelo parágrafo que começa com “Die Assimilirung, worunter…)

Resta perguntar, então, o porquê. Será o judaísmo considerado uma raça também por Herzl? Uma raça associada a um modo interno de sentir? A biologia molda o nosso sentido interno, de modo que acabar com o judaísmo só seria possível por meio de uma mudança biológica? Outra vez, isso lembra o cartaz dos racialistas na Avenida Paulista: “Miscigenação é genocídio.” E os tribunais de heteroidentificação racial também exigem uma conformação psicológica (que nada mais é que a adesão ao movimento) para reconhecer alguém como negro.

Seja como for, uma coisa relevante que transparece em Herzl é que as comunidades de origem judaica àquela altura mantinham o hábito de casar entre si, de modo que a “raça” permaneceria sem muita mestiçagem. (O exemplo que ele dá é o de um "casamento misto" reconhecido pela Hungria no qual uma judia se casava com um "judeu batizado".) A relevância do caráter racial para o debate sionista não pode ser diminuída, e o melhor exemplo disso é a politização que a questão da remotíssima miscigenação com os cazares (lá na antiguidade…) causou entre judeus e não-judeus no século XX, com a publicação do livro de Arthur Koestler, um judeu asquenazita que queria provar que não tinha nada a ver com semitas.

Mas bom, a maior diferença entre os negros e os judeus, no que concerne a essa questão, é que podemos sem pestanejar dizer o que é um negro: um negro é alguém de pele negra. 
Não há nada de cultural envolvido nessa questão; negros podem ser judeus, muçulmanos, ateus, brasileiros, congoleses, etíopes... 
Não faz sentido perguntar se um negro é assimilado; faz menos sentido ainda um negro dizer que “se descobriu” negro. Por outro lado, as discussões sobre assimilação eram habituais na Europa de Herzl; e é possível alguém se descobrir judeu após analisar o próprio histórico familiar. 
Afinal, o que é um judeu? Herzl não dá uma definição, nem toca nos critérios pelos quais alguém é reconhecido ou se reconhece como judeu.

Respondamos, então. Considerando a biologia algo apenas acidental, podemos com facilidade apontar o critério primário segundo o qual alguém é apontado como judeu: ter nascido de um ventre judaico. Ou seja, o judeu é o filho da judia (e não necessariamente do judeu). Judeu nasce judeu, não se torna. E como a própria judia pode ser ateia ou convertida a outra religião, resulta que esse critério cultural acaba redundando na matrilinearidade pura e simples. Assim, das três religiões abraâmicas, só uma tem porta de saída: se no islamismo podem te matar caso você queira sair, no judaísmo você continua sendo considerado judeu mesmo que nunca tenha sido nem sequer circuncidado.

O leitor deve saber da “conversão” ao judaísmo de figuras ilustres, tais como a filha de Trump, que se casou com um judeu e hoje é considerada judia. A mãe da israelense Shani Louk é uma alemã de origem católica que fez o mesmo trajeto da Ivanka Trump: casou com um judeu e foi aceita como judia. Não posso apontar fontes, porque meu conhecimento do assunto é oral e o judaísmo não tem Papa, de modo que não é fácil apontar uma doutrina oficial. De todo modo, explico o que eu aprendi oralmente: não é possível se tornar judeu; o que é possível é a autoridade religiosa reconhecer que você é uma alma judaica que foi, digamos assim, extraviada para um útero não-judaico.

Sei disso porque um familiar mestiço, judeu segundo critérios étnicos, resolveu virar judeu religioso e quis que o lado gentio da família aderisse à religião judaica junto com ele. De minha parte, achei a religião mais parecida com um transtorno obsessivo compulsivo generalizado, e não poderia haver proposta menos tentadora. E por aí eu entendi também por que tem tanto judeu ateu: dá trabalho demais ser religioso e é muito aflitivo, pois envolve passar o dia inteiro pensando nisso. A religião inclui até agradecimento a Hashem quando se vai ao banheiro. E Hashem é o modo de se referir a Deus, cujo nome não deve ser pronunciado ou escrito à toa.

Em seu opúsculo, Herzl menciona a acusação de que ele fortaleceria o antissemitismo justamente quando o processo de assimilação estaria quase concluído. 
 De fato, muitos europeus de origem judaica (como se costumava dizer então) haviam se convertido a diversas religiões cristas, ou haviam até nascido num lar cristão novo. 
Karl Popper, austro-húngaro, nasceu num lar cristão novo luterano; 
Edith Stein se converteu ao catolicismo, virou freira e foi canonizada; Jacques Maritain, filósofo católico francês, casou-se com uma judia que se converteu ao catolicismo junto com a irmã; 
Karl Polanyi, austro-húngaro, nasceu num lar cristão novo calvinista; 
Aurel Kolnai, austro-húngaro, converteu-se ao catolicismo… 
Que eu saiba, não existia isso de ser reconhecida como alma judaica para se casar com um judeu; ou, se havia, não havia interesse. A tendência parecia ser a de o grosso da tribo judaica se dissolver na cristandade (como as tribos europeias fizeram antes), sobrando só os ortodoxos, cuja identidade estaria fundada na observância à religião judaica… Até aparecer o sionismo. Aí ficamos fazendo cálculos de matrilinearidade, ou recorrendo a tribunais de heteroidentificação de alma, para decidir quem é judeu.

Porém, uma fé que concorria com as confissões cristãs era a fé laica na ciência, o cientificismo que tanto atraíra o jovem Herzl à engenharia. E o que vemos no seu esboço de como deveria ser o Estado Judeu é a manifestação da fé na Ciência. Que fica para o próximo texto.

quarta-feira, 20 de setembro de 2023

"A grandeza do Brasil" - Correio Braziliense

Para o jornalista, "estamos entre as maiores economias do mundo, produtores espetaculares do combustível mais nobre, o alimento que energiza pessoas. E nosso potencial é maior ainda em energia limpa, minerais, água potável e terra"

Ao abrir a Assembleia Geral da ONU, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva falou contra o conflito na Ucrânia e criticou os membros permanentes do Conselho de Segurança, que têm poder de veto e fazem guerras. O Brasil quer ser membro permanente — já que também foi nação vitoriosa na II Guerra.

O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, que falou depois, concordou com Lula, pregando a necessidade de mais vozes no Conselho de Segurança. [mais vozes,  para falar bobagens? Biden, emite com folga, as falas negativas que o petista que preside o Brasil expeliria se o Brasil se tornasse membro permanente do CS-ONU.]  Hoje os presidentes Lula e Biden se encontram, em Nova York. Foi uma presença forte do Brasil, diante de representantes dos 193 países membros das Nações Unidas. É desejo do Brasil ter um protagonismo mais significativo nas questões mundiais. Mas teria o país um poder nacional para sustentar uma posição maior, mais decisiva?

Não parece que estejamos em situação de grandeza política para isso. O chefe de Estado, que deveria ser um estadista, é mais afeito às questões menores da política, assuntos provincianos, pessoais. 
O Brasil se apresenta grande na ONU, mas fica com aspecto de propaganda. Na prática, conforma-se com o objetivo de ser uma liderança regional. 
Não fossem os desastres econômicos dos regimes argentino e venezuelano, certamente teríamos séria concorrência no campeonato regional de poder e influência.
 
Misturamos política com comércio exterior. Ter a China como principal parceiro comercial não exige que elogiemos o regime autoritário comunista chinês
Nossas relações internacionais misturam diplomacia com ideologia e, hoje, estamos colados na Venezuela, Argentina, Cuba, Nicarágua, China e Rússia — só para citar alguns países que, por coincidência, não são exatamente democracias.

Além disso, nossa tentativa de liderança mistura o estilo de clientelismo usado dentro do país com política de boa vizinhança de oferecer créditos de um banco estatal nacional, como se ele fosse uma agência internacional de desenvolvimento. É a projeção do fisiologismo interno para atrair países na ilusão de liderança regional.

Para complicar as questões diplomáticas, nosso chefe de Estado faz declarações tomando partido na guerra Rússia-Ucrânia. Despreza decisões do Tribunal Penal Internacional, chama os países-membros do Tratado de Roma de bagrinhos, provoca o aliado histórico americano e permite que aportem no Rio navios de guerra do Irã
Agora, na ONU, desagradou de novo os EUA ao defender Cuba e o Hamas.

Como a Índia
A Índia, que tem a maior população do mundo, desde sua independência em 1947 tem mantido neutralidade, com a qual cruzou a Guerra Fria.
Hoje, China, Rússia e EUA parecem ensaiar uma segunda Guerra Fria. 
O atual governo brasileiro poderia imitar a Índia, mas dá todos os sinais de que já escolheu ficar coadjuvante de um lado. 
O poder nacional, além do poder político, se compõe do poder econômico, social e militar.

No econômico, estamos entre as maiores economias do mundo, produtores espetaculares do combustível mais nobre, o alimento que energiza pessoas. E nosso potencial é maior ainda em energia limpa, minerais, água potável e terra para produzir alimento, que pode ainda ser multiplicada, a despeito da ideologia anti-agro.
Mas nosso poder militar é fraco, em disparidade com a riqueza que precisa ser defendida.
E nosso poder social é medíocre, com ensino em geral precário e formação política e de cidadania não compatíveis com o primeiro dos fatores de riqueza: a natureza.
 
E Lula, na ONU, ainda criticou o nacionalismo. 
Seu ex-ministro de Assuntos Estratégicos, Mangabeira Unger, tem criticado a mediocridade. 
Com ela, não pode haver grandeza.
 
 Alexandre Garcia, colunista - Correio Braziliense
 
 

domingo, 17 de setembro de 2023

O controle da linguagem - Revista Oeste

Rodrigo Constantino

O julgamento dos 'atos golpistas', que não deveria se dar no foro supremo, foi um típico show trial soviético


Foto: Montagem Revista Oeste/Shutterstock

Em Winter is Coming, livro em que analisa a ascensão de Putin ao poder e como ele se transformou num tirano, o enxadrista Garry Kasparov, também ativista pela liberdade, diz o seguinte sobre o famoso livro de Orwell: “O tema mais poderoso do livro de Orwell não é o do Grande Irmão que tudo vê, mas o do controle e da distorção da linguagem, especialmente na forma de ‘novilíngua’. As palavras assumem significados invertidos, as palavras que expressam ideias não aprovadas são eliminadas e o próprio pensamento humano é restringido através da redução e simplificação do vocabulário. Esta tentativa de distorcer a realidade através do controle da informação não é ficção científica para quem leu o Pravda na União Soviética, ou para quem vive hoje na Rússia de Putin.

Poderíamos acrescentar sem medo de errar: e no Brasil do PT e do STF. Afinal, o julgamento dos “atos golpistas”, que não deveria se dar no foro supremo, foi um típico show trial soviético. 
Com o apoio da velha imprensa, o ministro Alexandre de Moraes posou de defensor da democracia contra “terroristas”, mas acabou foi trucidando, uma vez mais, as leis do país e aviltando a própria democracia
Ele proferiu a pena ao primeiro “golpista”: 17 anos de prisão! Por vandalismo! 
Isso num país em que os vândalos do MST, do MTST, da Antifa, dos Black Blocs nunca terminam atrás das grades
Num país em que traficantes são soltos pelo STF, que manda devolver seus bens. 
Num país em que o STJ reduziu a pena de Elize Matsunaga, condenada por matar e esquartejar o marido, para 16 anos! 
 
Ao menos ela não participou de uma manifestação em que alguns indivíduos cometeram crimes de depredação do patrimônio público, não é mesmo? 
Alexandre de Moraes criou também a culpa coletiva, atribuindo crimes individuais à “turba golpista”; ou seja, basta ter estado entre os manifestantes que você pode ser responsabilizado pelo que outra pessoa fez no calor do momento. 
 
O desembargador aposentado Sebastião Coelho apresentou a defesa do primeiro réu. No mesmo dia do julgamento, o CNJ abriu investigação e quebrou o sigilo dele por “incitação a atos golpistas”. 
O doutor Coelho apresentou tal “coincidência” como uma clara tentativa de intimidá-lo e disse nada temer. 
Sua fala foi de uma coragem inspiradora, que tanto tem feito falta ao Brasil e ao mundo. Ele teve de desenhar o absurdo. Golpe de Estado sem arma? 
Golpe de Estado sem o presidente na capital? 
Golpe de Estado com vendedor ambulante de algodão-doce? 
Golpe de Estado sem qualquer reação de quem tem o monopólio das armas?
 
(...)

No mesmo dia em que Alexandre condenava um manifestante a 17 anos de prisão, o brasileiro psicopata que esfaqueou a mulher na frente dos filhos foi preso nos Estados Unidos, depois de duas semanas em fuga. “No Brasil, nunca ia ser preso”, disse a irmã da vítima de Cavalcante. Errada ela não está. Mas, se ele por acaso fosse preso, o STF daria um jeito de soltá-lo, pois ao menos o monstro assassino não “atentou contra a democracia”. Tamanha inversão de valores só é possível num regime tirânico e quando as palavras e os conceitos perdem o sentido.

Juntando as peças, os comunistas no poder e seus companheiros supremos precisam manipular os conceitos das palavras, colocar-se como defensores da democracia e espalhar o medo para ter total controle sobre a população “As ditaduras devem ser temidas para sobreviver e por isso não suportam ser ridicularizadas”, disse Kasparov. 
Por isso Putin foi implacável com as moças do Pussy Riot. 
Por isso já tem humorista perseguido no Brasil. 
O medo é o melhor instrumento do tirano. 
Por isso o Ocidente fracassou no teste da pandemia: pois o pânico incutido pelas “autoridades” levou muita gente a entregar de bandeja suas liberdades básicas. 
Os globalistas usam o alarmismo do “aquecimento global” pela mesma razão: desejo de controle, de poder.


Em The Psychology of Totalitarianism, Mattias Desmet comenta: “Sempre que surge um novo objeto de medo na sociedade, existe apenas uma resposta e uma defesa na nossa forma atual de pensar: maior controle. O fato de que o ser humano pode tolerar apenas uma certa quantidade de controle é completamente ignorado. O controle coercitivo leva ao medo e o medo leva a um controle mais coercitivo. Simplesmente assim, a sociedade é vítima de um círculo vicioso que conduz inevitavelmente ao totalitarismo, o que significa um controle governamental extremo, resultando eventualmente na destruição radical da integridade psicológica e física dos seres humanos.” 

CLIQUE AQUI, INTEGRA DA

MATÉRIA.

Leia também “Gerontocracia”

 

Colunista Rodrigo Constantino, Revista Oeste

 


quinta-feira, 14 de setembro de 2023

Centrão no governo - O infeliz xadrez de Lula - Gazeta do Povo

Vozes - Alexandre Garcia

Fufuca, Lula, Costa Filho e França em foto após a cerimônia de posse dos novos ministros.| Foto: Ricardo Stuckert/Presidência da República

Na quarta-feira, Lula preferiu fazer a posse de seus novos ministros de uma maneira bem discreta, uma reunião fechada no gabinete dele, sem convidados. Tudo para não ficar muito clara a ausência de Ana Moser, que deveria entregar o Ministério dos Esportes para o deputado federal André Fufuca (PP). Ela e o PT estão em desacordo. A primeira-dama Janja da Silva também não concorda, e já se manifestou publicamente sobre esse assunto.

A foto da posse mostra Lula, Fufuca e o novo ministro de Portos e Aeroportos, o deputado federal Silvio Costa Filho (Republicanos), com o polegar para cima. Já Márcio França (PSB) – realocado do comando de Portos e Aeroportos para o recém-criado Ministério do Empreendedorismo e da Microempresa – aparece com a cara de desagrado e com as duas mãos para trás. Assim devem estar o Partido Socialista Brasileiro e o vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB). Só que eles não vêm a público para manifestar isso.
 
Está sendo muito infeliz o xadrez de Lula nessa entrega ao Centrão. 
O Republicanos recebe o Ministério de Portos e Aeroportos, mas diz que não está recebendo, que isso não significa que o partido vai aderir ao governo, que é uma questão pessoal do ministro Silvio Costa Filho – que por sua vez vai ter de prestar contas também aos seus eleitores, que foram enganados
O mesmo vale para Fufuca. Deixaram os seus eleitores na mão. 
Os eleitores os elegeram não para serem empregados de Lula, mas empregados dos eleitores do Maranhão e de Pernambuco.

E o PP também não está satisfeito porque quer todas as apostas esportivas no Ministério dos Esportes, quer a presidência da Caixa – e parece que Lula vai dar – e quer também a Diretoria de Habitação da Caixa Econômica, que o PT não quer soltar. 

Eu pergunto aos que elegeram Lula: votaram também no Centrão? Porque fica bem estranho isso.

TSE mantém cassação de Dallagnol
No Tribunal Superior Eleitoral (TSE) já está formada maioria, com quatro votos em sete, para não aceitar o recurso de Deltan Dallagnol, mantendo a cassação do deputado federal mais votado do estado do Paraná. Houve uma época em que os tribunais respeitavam a força do povo, a força do eleitor. O mais votado dificilmente seria banido. O relator, ministro Benedito Gonçalves, votou contra Dallagnol, assim como Alexandre de Moraes, Cármen Lúcia e Ramos Tavares. A denúncia foi feita pelo PT, PCdoB e PV.
 
Brasil terá insegurança jurídica internacional?
No Ministério da Justiça, o ministro Flávio Dino aderiu a uma tese de Lula, de que o Tribunal Penal Internacional está estranho por não ter a adesão de Rússia, China e Estados Unidos. Então, o ministro disse que o Brasil tem de avaliar se cai fora do Tribunal de Haia. 
Isso significaria rasgar o Tratado de Roma, que o Brasil assinou, que foi confirmado pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso, depois de aprovado pelo Senado Federal. 
Então o Brasil, que já tem insegurança jurídica interna, vai ter também insegurança jurídica internacional.
 
Colaboração não é delação premiada
Finalmente eu me esclareci diante do noticiário que só fala em “delação premiada” do Mauro Cid. Eu sabia que não era isso. 
Não encontrei em lugar nenhum. 
Avisei a quem me segue que não tem isso. Era impossível, porque um sujeito com essa formação ética de família e passagem pela Academia Militar das Agulhas Negras não teria como fazer isso
Agora está esclarecido que se trata da colaboração prevista na Lei 12.850/2013. 
Significa que a pessoa abre mão de seu direito de ficar calado para não se incriminar e conta tudo. 
Não é aquele acordo em que a pessoa se obriga a incriminar alguém, a incriminar outros.
 
Isso não tem nada a ver com outra questão que o pessoal está chamando de “lavagem de provas”. Sabem como funciona? Aparece um indício, mas não há como buscar a prova atrás daquele indício. 
Então quebram sigilo bancário, sigilo fiscal, sigilo telefônico por algum outro pretexto, desenterram caso antigo e vão procurar. 
Assim como tem a lavagem de dinheiro – em que se tenta tornar legal o dinheiro ilícito –, tem também a lavagem de provas.
 
Desembargador aposentado rouba a cena no STF
O ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes pediu 15 anos e meio de regime fechado para o primeiro réu julgado pelo STF por suposto envolvimento nos atos de 8 de janeiro. 
Aécio Lúcio Lopes Costa Pereira teria sido fotografado no plenário do Senado no dia 8. 
Dizem que ele quebrou espelhos, computadores, obras de arte etc. 
Segundo ele, não era uma tentativa de golpe, mas uma manifestação de protesto. Ainda lembrou que o réu não pôde comparecer a seu próprio julgamento porque está no presídio da Papuda.
 
Depois, Coelho disse que, um dia antes, tentaram intimidá-lo, com o Conselho Nacional de Justiça dizendo que ele vai ser investigado. Disse que não tem mais idade, que não tem mais tempo a perder para o medo. Não tem mais tempo de ter medo de nada. 
E, por fim, ele se dirigiu aos ministros do Supremo dizendo que à frente dele estavam as pessoas mais odiadas desse país. 
Alexandre de Moraes ainda falou depois, chamou de “extremistas” os que não gostam do STF e disse que são a minoria da população.

Conteúdo editado por: Marcio Antonio Campos

Alexandre Garcia, colunista - Gazeta do Povo - VOZES

 


domingo, 10 de setembro de 2023

A China tomou posse do MST - Gazeta do Povo

Vozes - Leonardo Coutinho


Brasil, América Latina, mundo (não necessariamente nesta ordem)

Detalhe de cartaz de propaganda chinês da época maoista sobre a mecanização agrícola.| Foto: Reprodução/Domínio público

O Movimento dos Trabalhadores Sem-Terra (MST) divulgou que está fazendo um negócio da China. Literalmente. O Partido Comunista Chinês vai investir na organização que tem como uma das suas principais atividades a invasão de terras.

No fim de julho, uma delegação de 14 pesquisadores da Universidade Rural da China visitou assentamentos do MST e prometeu intercâmbio e suporte técnico para ajudar os assentados a modernizar seu sistema produtivo. A parceria, no entanto, é um belo negócio que os chineses avistaram depois que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva esteve na China carregando no colo o chefão do MST, João Pedro Stédile.

De volta ao Brasil, o MST se abrigou sob o dossel de institucionalidade do Consórcio Nordeste – que, não por acaso, também foi à China acomodado na algibeira presidencial. As duas organizações anunciaram que serão uma espécie de laboratório do empreendedorismo agrícola chinês.

    O Partido Comunista Chinês já tem os grandes produtores brasileiros de joelhos. Os fazendeiros praticamente se tornaram fornecedores de cliente único, tornando o agronegócio nacional perigosamente dependente dos interesses do partido

O governo do Rio Grande do Norte estendeu o tapete vermelho para os chineses demonstrarem a grandiosidade de sua tecnologia agrícola e recepcionará um campo de testes de pelo menos 31 modelos de equipamentos que serão usados em lavouras do MST. Antes de tomar esta iniciativa, entretanto, o Consórcio Nordeste bateu em muitas portas, dentro e fora do Brasil, em busca de financiamento “carimbado” para as máquinas chinesas. Como não deu certo, resolveram, então, transformar a região em um grande showroom para ajudar a convencer não só entes governamentais e agências de fomento, mas também os produtores da magnificência do maquinário que o Partido Comunista Chinês quer desovar no Brasil.

A aliança do Consórcio Nordeste com os interesses da China não é recente. Desde a sua criação, em 2019, a associação de governos esquerdistas nordestinos se apresentou como trincheira chinesa no Brasil. Uma espécie de movimento de secessão, que tinha como pretexto se contrapor ao “fascismo” do governo federal que buscava se afastar da China ao mesmo tempo que se alinhava aos Estados Unidos, na época comandados por Donald Trump.

Durante a pandemia de Covid-19, o consórcio passou a tratar diretamente com o embaixador chinês e com o governo da China, que ignorou qualquer tipo de protocolo e respeito na relação bilateral com o Brasil e passou a lidar com o grupo de governadores como se eles formassem um Estado dentro do Estado.

Quais serão as reais implicações da marcha da China sobre a agricultura familiar brasileira, valendo-se dos governadores esquerdistas do Nordeste e do MST? 
Não é possível prever com exatidão, mas os sinais apresentados pelos próprios envolvidos na operação indicam que:

1. O Partido Comunista Chinês já tem os grandes produtores brasileiros de joelhos. Os fazendeiros praticamente se tornaram fornecedores de cliente único, tornando o agronegócio nacional perigosamente dependente (e subserviente) dos interesses do Partido Comunista Chinês;

2. Os chineses viram um grande negócio no Brasil. Não soa nada absurdo ver, em breve, milhões e milhões de reais provenientes dos cofres públicos jorrarem para o financiamento dos tratorzinhos chineses. O diminutivo não é depreciativo, mas uma referência ao sistema de minimáquinas que a China desenvolveu para atender minipropriedades;

3. A conquista da produção da agricultura familiar,
que ficará atrelada – potencialmente em um modelo de sociedade 50%-50% com os chineses. O que antes era 100% brasileiro perderá, de imediato, metade da influência nacional e possivelmente muito mais do que isso no que se refere à destinação para o mercado interno;

    China, Rússia, Irã, Cuba, Venezuela e as demais autocracias que existem pelo mundo trabalham noite e dia para desacreditar as democracias. O mais bizarro é que eles têm conseguido fazer isso muito bem com o apoio de muita gente da direita

4. Quase ninguém se lembra, mas, durante a pandemia de coronavírus, a China chantageou meio mundo – e não foi diferente com o Brasil – sequestrando insumos para vacinas e emperrando as cadeias logísticas para se blindar de qualquer crítica ao regime e sua lista sem fim de violações.  
O Congresso brasileiro, políticos de todos os matizes ideológicos e a imprensa, sem falar do Consórcio Nordeste, uniram-se em coro para reverenciar a ditadura. 
Pois sem ela todos nós morreríamos, não é mesmo? 
Como o Partido Comunista entendeu o processo de domesticação ao qual fomos submetidos, eles avançaram na conquista;

5. O esquerdismo latino-americano do qual o MST faz parte é terreno fértil para o Partido Comunista Chinês semear suas políticas estratégicas que nada têm a ver com os interesses locais, mas apenas servem de plataforma para os objetivos globais do regime chinês.

Uma pesquisa de opinião realizada pelo Instituto Latinobarómetro, com sede no Chile, revelou que o desprezo dos latino-americanos pela democracia tem crescido de forma perturbadora. 
 Do total de 20 mil pessoas ouvidas em 17 países da região, 17% disseram preferir um regime autoritário a um sistema democrático. Para outros 16% tanto faz viver em uma democracia ou uma ditadura. 
A coisa fica ainda mais horripilante quando perguntados se defendem a democracia: o porcentual dos que disseram “sim” caiu de 63%, em 2010, para 48%, em 2023. [a condição mais adversa à  preservação da democracia é que na adoção de algumas medidas destinadas a preservar a democracia,  na prática, agridem a democracia.]

China, Rússia, Irã, Cuba, Venezuela e as demais autocracias que existem pelo mundo trabalham noite e dia para desacreditar as democracias. O mais bizarro é que eles têm conseguido fazer isso muito bem com o apoio de muita gente da direita que acredita que questões ligadas à corrosão de valores familiares ou tudo que cabe no tal wokeismo são culpa da democracia.

Esse sentimento repleto de confusão é usado pelas ditaduras para se normalizarem, colocando em xeque os valores democráticos. Ninguém tem investido mais nisso que o Partido Comunista Chinês. Xi Jinping tem gastado muito de seu capital político e financeiro para vender a ideia de que o Ocidente não pode ter o “monopólio da democracia”, ou mais precisamente dizer o que é democracia. Xi, na maior desfaçatez possível, passou a vender a ideia de que há uma democracia com características chinesas. Truque que angariou adeptos dentro dos principais partidos políticos do Brasil, inclusive.

A China compra quase tudo e todos. Não resta dúvidas de que a sua mais recente aquisição é o Movimento dos Trabalhadores Sem-Terra. Mas, no caso, parece que não foi bem uma compra e sim, como dizem os seguidores de Stédile, uma ocupação
Ou seja, a China tomou posse de algo do qual ela se sente literalmente dona.

Conteúdo editado por:  Marcio Antonio Campos

Leonardo Coutinho, colunista - Gazeta do Povo - VOZES