Não há na história do Brasil uma lei mais discutida, nem submetida a escrutínio mais rigoroso, antes de ser votada
Propriedade agrícola na região de fronteira entre Brasil, Paraguai e Argentina - Foto: Xico Putini/Shutterstock
O Código Florestal Brasileiro, regulado pela Lei nº 12.651, de 25 de maio de 2012, festeja dez anos de aprovação e aplicação. Não há na história do Brasil uma lei mais discutida, nem submetida a escrutínio mais rigoroso, antes de ser votada. Em todo o país, foram realizadas mais de 200 audiências públicas e reservadas, com agricultores, ambientalistas, cientistas, empresários, magistrados, membros do Ministério Público e interessados em geral.
O relator do projeto de lei do Código Florestal na Câmara Federal foi o deputado Aldo Rebelo. Jornalista de formação, ele destacou-se ao aprovar o novo Código Florestal, após 12 anos de tramitação e intensas negociações. Deputado federal por 20 anos pelo Partido Comunista do Brasil (PCdB), Aldo Rebelo presidiu a Câmara dos Deputados de 2006 a 2009. Além do Código Florestal, ele relatou a Lei de Biossegurança e foi ministro nas pastas: Coordenação Política e Relações Institucionais; do Esporte; Ciência, Tecnologia e Inovação; e da Defesa. E dedicou seu relatório final sobre o Código Florestal aos agricultores brasileiros.
A votação da primeira versão do Código Florestal na Câmara dos Deputados obteve 410 votos favoráveis de parlamentares de todo o espectro partidário e ideológico e apenas 63 votos contrários. No Senado, 59 contra 7. Esse processo legislativo contou com o apoio dos principais partidos, tanto de governo como de oposição.
Mesmo assim, grupos radicais no Ministério Público, em alguns partidos e organizações não governamentais não aceitaram o resultado legítimo da democracia parlamentar. Imediatamente após a promulgação do Código Florestal, ajuizaram ações de inconstitucionalidade contra vários artigos da nova lei, voltados a dar segurança jurídica ao produtor rural. E sob o pretexto de tais artigos estarem legalmente questionados, instâncias do Judiciário e do Executivo frearam a aplicação do novo código.
O novo Código Florestal é uma lei moderna, centrada na preservação ambiental e na sustentabilidade da agropecuária
Esse radicalismo trouxe mais um período de insegurança e prejuízos ao mundo rural e à atividade agropecuária no Brasil. Finalmente, após diversas audiências e contribuições, o Supremo Tribunal Federal julgou as Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) movidas contra o Código Florestal. Elas foram apreciadas em conjunto na ADC-42/2016 e rejeitadas. Para o STF, “o Código Florestal ostenta legitimidade institucional e democrática”.
O voto do ministro Luiz Fux foi muito claro e expressou conceitos válidos até os dias de hoje: “As políticas públicas ambientais devem conciliar-se com outros valores democraticamente eleitos pelos legisladores, como, verbi gratia, o mercado de trabalho, o desenvolvimento social, o atendimento às necessidades básicas de consumo do cidadão. Dessa forma, não é adequado desqualificar determinada regra legal como contrária ao comando constitucional de defesa do meio ambiente ou mesmo sob o genérico e subjetivo rótulo de ‘retrocesso ambiental’, ignorando as diversas nuances que permeiam o processo decisório do legislador, democraticamente investido da função de apaziguar interesses conflitantes por meio de regras gerais e objetivas. Deveras, não se deve desprezar que a mesma Constituição que protege o meio ambiente também exorta o Estado brasileiro a garantir a livre-iniciativa, o desenvolvimento nacional, a erradicação da pobreza e da marginalização, reduzir as desigualdades sociais regionais, proteger a propriedade, buscar o pleno emprego e defender o consumidor. O desenho institucional das políticas públicas ambientais suscita, assim, o duelo valorativo entre a tutela ambiental e a tutela do desenvolvimento, tendo como centro de gravidade o bem comum que é a pessoa humana, no cenário de escassez”.
Mais ainda, agregou o ministro Fux em sua manifestação: “O Princípio da Vedação ao Retrocesso não se sobrepõe ao Princípio Democrático, no afã de transferir ao Judiciário funções inerentes aos Poderes Legislativo e Executivo e nem justifica afastar arranjos legais mais eficientes para o desenvolvimento sustentável do país como um todo”.
O novo Código Florestal Brasileiro é uma lei moderna, centrada na preservação ambiental dos cinco biomas do Brasil e na sustentabilidade da agropecuária. Ele extinguiu antigas normas confusas e arbitrárias, retirou produtores rurais da ilegalidade a que foram injustamente lançados e trouxe segurança jurídica no campo.
Todo esse avanço foi possível graças ao novo Código Florestal. E, ainda assim, alguns agentes públicos e organizações não governamentais insistem em ignorar essas realidades e, de forma reacionária, comportam-se como se o novo Código Florestal não existisse. Há juízes e tribunais de todos os níveis, incluindo os superiores, decidindo pela invocação de normas e dispositivos da lei anterior.
Também há casos em que o Ministério Público, com os mais diversos argumentos, quer aplicar a casos pendentes (e até mesmo a casos novos) o Código Florestal de 1965, já revogado. Outros gestores públicos, por omissão, penalizam o produtor rural, ao manter a desinformação nessa temática. Para o bem do meio ambiente, da agricultura sustentável e da segurança jurídica, é fundamental uma revisão dessas posturas anacrônicas, neste aniversário de dez anos da nova lei ambiental.
O Código Florestal Brasileiro ajudou a transformar o Brasil numa potência ambiental e agropecuária, ao pacificar o país. Não há outra legislação, de qualquer outra nação, mais restritiva ao uso da propriedade privada.Não há no mundo rural de qualquer outro país quem preserve tanto a vegetação nativa quanto no brasileiro.
E muito menos quem assuma integralmente, em terras privadas, o ônus econômico e financeiro dessa preservação, como ocorre por aqui.
Há motivos para festejar!
Leia também “Agricultura lidera a preservação ambiental”
Evaristo de Miranda, colunista - Revista Oeste