O Aedes aegypti é o novo fator de unidade nacional. Ou: Dilma cai das asas do mosquito
A ditadura militar tentou unir o país com estradas, ferrovias, aulas de Educação Moral e Cívica... Tudo inútil.
Temos, finalmente, o mosquito. Só ele agora nos define e nos unifica moral, intelectual e existencialmente
Não vou aqui
fazer a lista das cidades onde houve panelaço quando a presidente Dilma
apareceu na TV para falar sobre o combate ao mosquito Aedes aegypti.
Não faço porque isso sempre tem de ser ampliado, incluindo cidades e
bairros que não são citados. Parece-me
que o prudente é considerar que houve protestos onde quer que as pessoas
soubessem que ela iria se manifestar. Acho que se espalhou pelo Brasil
inteiro.
Na região
onde estou, na Paulista, do 24º andar de um edifício, ouvi o mais
ruidoso de todos os protestos até agora. Como há muita gente voltando
pra casa, as buzinas brigavam com as panelas para ver quem se
manifestava com mais clareza.
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Dilma está
de parabéns! O ímpeto da presidente da República de transformar o
mosquito num ativo político mereceu da população o devido repúdio e
certamente vai contribuir para, como posso dizer?, elevar a temperatura
em favor do impeachment.
O governo
vende por aí, de maneira determinada, que houve um arrefecimento dessa
possibilidade. Acho que está a confundir desejo com realidade. A reação
da população ao perceber que Dilma tentou voar nas asas do mosquito
deixou isso claro.
Não tenho nada com isso
Como é praxe, a presidente buscou se
eximir e a seus parceiros de petismo de qualquer responsabilidade.
Afirmou: “O vírus zika, transmitido pelo mosquito, não tem
nacionalidade. Começou na África, se espalhou pelo Sudeste da Ásia, pela
Oceania e agora está na América Latina. E este foi um processo
excepcionalmente rápido, a partir do ano passado”.
Ora, presidente Dilma!
Sei que é
difícil, mas um governante deveria ser proibido de usar bens públicos e
privados — resumidos na Rede Nacional de Rádio e Televisão — para dizer
imprecisões e inverdades.
Sim, essa é a
geografia do vírus. Ela só se esqueceu de dizer que, ao chegar ao
Brasil, o bichinho encontrou as circunstâncias ideais para se expandir.
Afinal, o Aedes aegypti, seu hospedeiro, havia se transformado num
verdadeiro fator de identidade e unidade nacionais.
Muito se
fala nessas ditas-cujas. As mais variadas correntes políticas,
artísticas e ideológicas tentaram defini-las. A literatura indianista
estava em busca do elemento que as plasmasse. Foi parcial. Os
modernistas de 22 também se dedicaram a esse esforço — tanto que uma
corrente até chegou a ter simpatias pelo fascismo em razão de seu
nacionalismo exagerado. Mais recentemente, o Tropicalismo, um movimento
musical, mas com imbricações em outras artes, também escarafunchou o
solo em busca dessa identidade, da unidade. E nada!
A verdade é
que há tantos Brasis dentro do Brasil que todas essas tentativas
falharam. Querem ver? O “samba” é coisa nossa? Não diz nada para o
interior de São Paulo, Minas e Região Centro-Oeste, onde a identidade
está na música sertaneja e variantes, ainda que modernizadas. Há o forró
e assemelhados nordestinos. Nem uma coisa nem outra falam à memória
cultural e afetiva do Sul e do Norte do país. E vai por aí.
A ditadura militar tentou unir o Brasil com estradas, ferrovias, aulas de Educação Moral e Cívica… Tudo inútil.
Temos, finalmente, o mosquito.
Só ele agora nos define e nos unifica moral, intelectual e existencialmente.
Devemos isso ao PT de Dilma.
Fonte: Blog do Reinaldo Azevedo - VEJA ON LINE