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terça-feira, 7 de novembro de 2023

Governo Lula bloqueia R$ 3,8 bilhões do Orçamento e cortes atingem hospitais e livros didáticos - O Estado de S. Paulo

Ministérios admitem impactos em programas sociais, mas minimizam prejuízos até o fim do ano; ‘o presidente promete não fazer em 2024 o que está fazendo em 2023′, diz Gil Castello Branco, da Associação Contas Abertas

BRASÍLIA - O presidente Luiz Inácio Lula da Silva prometeu que não vai cortar nenhum recurso do Orçamento do ano que vem, mas, em 2023, o governo já bloqueou a liberação de verbas para o funcionamento de hospitais, o pagamento do Auxílio Gás e a compra de livros didáticos na educação básica.

Os bloqueios somaram R$ 3,8 bilhões até o dia 1º de novembro e ainda não foram destravados, de acordo com levantamento da Associação Contas Abertas com dados do Sistema Integrado de Planejamento e Orçamento (Siop).

Com a trava nos gastos, as ações do governo federal nas áreas afetadas correm o risco de paralisarem até o fim do ano ou atrasarem. Os ministérios admitem o impacto para atividades essenciais, mas minimizam os riscos de um “apagão” nos programas até o fim do ano. “O presidente promete não fazer em 2024 o que está fazendo em 2023″, afirma o secretário-geral da associação Contas Abertas, Gil Castello Branco.

O bloqueio acontece quando o governo verifica que há risco de descumprir as regras fiscais durante o ano. Os órgãos do Executivo escolhem quais verbas serão atingidas e quais serão poupadas. O valor só é destravado se a situação financeira voltar à normalidade, e até lá não há garantia de continuidade dos serviços.

Governo Lula bloqueia R$ 296 milhões de recursos para hospitais
A ação que sofreu o maior bloqueio foi a que custeia os serviços de assistência hospitalar e ambulatoria
l, do Ministério da Saúde, um total de R$ 296 milhões. 
O dinheiro é destinado para realização de consultas, exames, tratamentos e cirurgias. 
O corte atingiu recursos indicados por bancadas estaduais do Congresso e envolve emendas não obrigatórias. 
A verba é de forte interesse dos parlamentares e uma demanda de hospitais nos Estados e municípios.

O Ministério da Saúde afirmou que buscou minimizar o impacto do bloqueio na hora de escolher quais recursos seriam atingidos. De acordo com o órgão, o valor afetou todas as emendas de bancada na mesma proporção. “De todo modo, o bloqueio incidiu sobre recursos cuja destinação ainda carecia de análise e aprovação de propostas apresentadas pelos entes beneficiados, não acarretando prejuízo para continuidade de obras já iniciadas”, disse o ministério.

Depois, na lista de bloqueios, vem o Auxílio Gás, com impacto de R$ 262 milhões. Conforme o Estadão revelou, se o dinheiro não for destravado até o fim do ano, 2 milhões de famílias correm o risco de não receber o benefício em dezembro. O Ministério do Desenvolvimento Social reconheceu o risco, mas disse que vai tirar dinheiro de outras áreas se o bloqueio não for revertido para garantir o pagamento do Auxílio Gás.

Enquanto esses recursos sofreram bloqueios, o dinheiro herdado do orçamento secreto — revelado pelo Estadão permanece intacto, sendo negociado com deputados e senadores do Centrão e liberado conforme a vontade dos ministros e as negociações feitas com o Congresso, ainda sem transparência sem critério de distribuição regional.

Outro programa atingido foi o Minha Casa, Minha, Vida, vitrine do governo Lula na nova roupagem do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC)
O Fundo de Desenvolvimento Social (FDS) e o apoio à produção habitacional de interesse social, duas ações do Ministério das Cidades, sofreram bloqueios de R$ 426 milhões somadas. 
O dinheiro financia programas habitacionais, incluindo o Minha Casa, Minha Vida. A pasta não comentou os efeitos da decisão.

Bloqueios atingem livros, rodovias e transposição do Rio São Francisco

O Ministério da Educação bloqueou R$ 179,8 milhões do orçamento da produção e compra de livros didáticos para a educação básica.
Com esse dinheiro, o governo poderia comprar aproximadamente 17 mil livros para professores e estudantes do ensino fundamental.

O valor do bloqueio se soma a outros cortes feitos no Ministério da Educação que não foram revertidos e atingiram alfabetização, transporte escolar e bolsas de estudo. Procurada pela reportagem, a pasta não justificou por que esses programas foram escolhidos na hora de efetuar o bloqueio.

 Tanto o presidente quanto a maioria dos parlamentares não pretendem cortar despesas, mas a irresponsabilidade fiscal tem pernas curtas. A carruagem pode virar abóbora antes das eleições.

Gil Castello Branco, secretário-geral da Associação Contas Abertas

O governo Lula também segurou a liberação de recursos para obras em rodovias e para a transposição do Rio São Francisco. Na sexta-feira, 3, durante uma reunião com ministros, o presidente afirmou que “dinheiro bom é dinheiro transformado em obras”. O Ministério dos Transportes, porém, sofreu bloqueio de R$ 985 milhões e foi a pasta mais impactada. A construção do trecho entre Altamira e Rurópolis, na BR-230, no Pará, e a adequação de trechos da BR-230, na Paraíba, estão entre os projetos impactados.

O Ministério das Cidades, por sua vez, não esclareceu o bloqueio de recursos nas obras do Rio São Francisco. Na última semana, Lula reuniu deputados da base aliada no Palácio do Planalto e prometeu que não haverá cortes no Orçamento de 2024. A declaração significa que o governo não vai propor uma diminuição de recursos já enviados no Projeto de Lei Orçamentária Anual (LOA) e nem segurar a liberação de recursos ao longo do ano que vem, o que atinge verbas de interesse dos parlamentares. Neste ano, já houve cortes. No próximo ano, será ainda mais difícil para o presidente cumprir a promessa, de acordo com especialistas.

O governo terá de cumprir uma meta que não comprometa as contas públicas e não aumente o resultado negativo que enfrenta atualmente. Além disso, dependerá de uma arrecadação de impostos que não está garantida. Na proposta de Orçamento para 2024 que encaminhou ao Congresso, o governo programou um total de R$ 400 bilhões em recursos que não estão garantidos, incluindo verbas para programas sociais como o Bolsa Família e para as aposentadorias da Previdência Social. “Em 2024, sob o ponto de vista do orçamento, o que já está difícil em 2023 ficará pior”, diz Gil Castello Branco. “É um ano eleitoral e tanto o presidente quanto a maioria dos parlamentares não pretendem cortar despesas, mas a irresponsabilidade fiscal tem pernas curtas. 
A carruagem pode virar abóbora antes das eleições.”
 
NÃO DEIXE DE LER: Deputados da oposição pedem ao TCU que governo cumpra piso integral da saúde em 2023

Piso cheio custaria até R$ 20 bilhões extras aos cofres públicos até o final do ano; governo entende que só precisa cumprir o mínimo integral a partir de 2024

Um grupo de 27 deputados da oposição protocolou representação conjunta no Tribunal de Contas da União (TCU) para que o governo federal cumpra o piso da saúde em 2023. Previsto na Constituição, o piso da saúde tem correção atrelada a 15% da Receita Corrente Líquida do governo. Ele corresponde ao mínimo que o governo tem que gastar na área de saúde.

Os deputados cobram que o TCU mande o governo federal tomar providências orçamentárias e financeiras para cumprir o mínimo “cheio”, após a revogação do teto de gastos (regra que limitava o aumento dos gastos à variação da inflação). 
Com a sanção do novo arcabouço fiscal, o piso da saúde voltou a ser atrelado à arrecadação.

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Política - O Estado de S. Paulo