Barroso está sempre bem na tela que Heraldo ocupa. Ou mais que isso: nos últimos dois governos, essa tela dispara diariamente contra o ocupante da cadeira presidencial — e nos últimos dois governos Barroso se dedica com afinco à mesmíssima atividade. Por mais de um ano, essa tela bombardeou sem parar o então presidente da República Michel Temer, baseando-se na delação imprestável do criminoso confesso Joesley Batista — delação que inclusive acabou suspensa.
Barroso virou uma espécie de palestrante antibolsonarista, um onipresente e inveterado personagem de lives colegiais
Esse cerco regido de forma rudimentar pelo então procurador-geral da República Rodrigo Janot, cujo ex-braço direito na Procuradoria foi o instrutor de Joesley na manobra, contava com a ação diligente de Luís Roberto Barroso. O ministro do STF fez a sua parte prorrogando indefinida e artificialmente as investigações contra o então presidente da República, sem qualquer inibição diante dos indícios comprometedores que insistiam em não aparecer.
Manter o cerco a Temer era um ato singelo, como subir num palco e cantar. Cada um na sua. O governo mudou, entrou no palácio outro presidente, mas a tela e a toga mantiveram a mira na mesma direção. Barroso virou uma espécie de palestrante antibolsonarista, um onipresente e inveterado personagem de lives colegiais, cheias de construções filosóficas indigentes sobre aspirações iluministas contra o espectro do fascismo imaginário. Um numerão patético.
E o mais comovente na cena do supremo caraoquê foi o seguro de vida. Estava lá o Heraldo, o representante da seguradora, rosto e voz da alquimia oracular que ungiu o felizardo Barroso, lado a lado com ele, validando a apólice ao vivo, confiança na veia, rosto colado e sem máscara — porque quem está imune a tudo e a todos não precisa de máscara. Nem para esconder o vexame.
Barroso — logo ele que falou tanto em ameaça totalitária — manda demitir por justa causa não vacinados, se lixando para o fato de que as vacinas não bloqueiam contágio e não têm estudos conclusivos sobre riscos. Ele não precisa de nada disso. Com o holofote do Heraldo, ele pode reescrever a ciência inteira se quiser, entre um refrão e outro. Você está indignado porque não fez as amizades certas.
A diferença entre um doutrinador e um farsante está no nível de distração da plateia. Até aqui, tudo bem.
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Guilherme Fiuza, colunista - Revista Oeste