Se um profissional da segurança perde a vida quando é surpreendido e reage, o que não acontecerá com o cidadão comum
[o que mais facilita a vida dos bandidos é que formadores de opinião, comumente apresentados como 'especialistas' emitem um conceito do tipo do acima, desestimulando o cidadão (que se sente incapaz) e ao mesmo tempo estimulando o bandido a continuar à vontade para cometer seus crimes (o marginal sabe que as chances de encontrar pessoas armadas para enfrentá-lo são pequenas e passa a acreditar na 'incompetência' de eventuais opositores.]
As novas políticas de segurança no Rio de Janeiro e a iniciativa dos
governos federal e estadual estão se configurando a partir de dois
elementos centrais. O primeiro é a retração do Estado. O discurso oficial encoraja as
pessoas a se armarem para se protegerem. Assim, o Estado se omite no seu
dever de proteger o cidadão, que deve, ele próprio, arcar com esta
responsabilidade. [o Estado exerce seu dever, ou tenta exercer,de proteção do cidadão, por vários meios, sendo o principal deles a ação policial, só que os 'especialistas em segurança' cultivam o péssimo hábito de que havendo confronto o bandido não deve ser abatido - se alguém tem que morrer, que seja o policial.
Se ver que é um mau começo - o policial tem o DIREITO e o DEVER de chegar são e salvo, vivo, em casa.
A iniciativa do confronto partiu do bandido, e sempre parte, quanto resolve cometer um crime.
Ao policial só resta uma opção - inclusive é seu DEVER, neutralizar o marginal.
Mas, querem que o Estado proteja o cidadão com a morte dos seus policiais - antigamente, no século passado, quando o bandido ir cometer um assalto e havia reação, o marginal matando o oponente, ele costumava fugir sem levar nada. Assim, na visão limitada dos 'especialistas' em segurança, o Estado estava cumprindo seu dever - impedindo o roubo ou outro resultado criminoso, ainda que a custa de uma vida, ou de vidas.
Atualmente ele mata, recolhe o que estiver ao seu alcance e foge. E, continuam insistindo que o Estado mata muito, que o policial não pode exercer o direito de legitima defesa, tem que ser punido ser exercer este direito e o bandido morrer, etc, etc.]
O Estado se omite, igualmente, no seu dever de
fiscalizar. Um exemplo é o decreto sobre a posse de armas, que exige que
a pessoa possua um cofre em alguns casos, mas admite a autodeclaração
como comprovação. [o DEVER de fiscalizar deve ser exercido para impedir o bandido de portar armas, o que ocorre nos dias atuais, de forma ostensiva.
Fiscalizar se um cidadão que declarou ter um cofre está mentindo, é inócuo. No máximo, vai deixar mais uma pessoa de bem desarmada.] Entretanto, a difusão das armas não vai melhorar a
segurança, como prova o fato de que boa parte dos policiais assassinados
no Brasil morre ao tentar resistir a um assalto. Se um profissional da
segurança perde a vida quando é surpreendido e reage, o que não
acontecerá com o cidadão comum. [sou 60tão e manuseio armas a no mínimo 50 anos e já tive por mais de uma vez a obrigação de reagir a um assalto - para não ser assaltado ou impedir que alguém fosse - e graças a DEUS fui exitoso.
O treinamento, a 'intimidade' com armas, saber usá-las, ajuda, mas, nem sempre é decisivo para o abate do bandido.
Conhecer o manejo de armas dá uma confiança ao cidadão que está armado e torna mais preciso sua reação, evitando que se atrapalhe, mas, tem que sempre ter o bom senso de saber SE PODE REAGIR naquele momento, ou SE PODE ESPERAR um pouco.
Creio que ninguém discorda: cada vez é uma vez.
Se o cidadão está armado em uma guarita, ou em local abrigado, se torna tudo mais fácil. Caso contrário, a habilidade influi mas não é decisiva.]
Por outro lado, o Estado do Rio desmantela a Secretaria de Segurança com
a promessa de “liberar” as polícias de supostas interferências. Ora, é
público que as secretarias de Segurança no Brasil apresentam graves
limitações na sua capacidade de comandar as polícias. O problema central
não tem sido a interferência política, mas a incapacidade de aplicar
políticas de segurança pública integradas. O fim da secretaria tornará
isto ainda mais difícil e fortalecerá a agenda corporativa dentro das
polícias, além de comprometer ainda mais o controle interno e externo da
atividade policial.
De fato, o fim da secretaria, a fala de Bolsonaro dizendo que agora no
Brasil “mandam os capitães” e as propostas de sequer investigar as
mortes cometidas por policiais (como se agora fossem devidamente
investigadas) devem soar como música aos ouvidos dos milicianos e dos
policiais corruptos. O segundo ponto é o estímulo à execução sumária de suspeitos. [suspeito que reage, tem que ser neutralizado, ou haverá mais um policial morto.
Suspeito tem que aceitar que foi abordado, não reaja e ter a certeza que se reagir, morre.] Trata-se
de uma pena de morte sem julgamento, ilegal, como bem sabe o grupo
político que a promove, que tenta uma modificação legal encarnada na
“Lei do Abate”. De qualquer forma, essa proposta de lei é considerada
contrária às cláusulas pétreas da Constituição. O termo “abate” é mais
uma tentativa de tradução pseudo-jurídica do bordão “bandido bom é
bandido morto”, após o uso de outros conceitos estapafúrdios como a
“legítima defesa preventiva”, já usada por alguns membros do Judiciário
do Rio.
A nova proposta legal do ministro Moro para reduzir ou anular a pena de
policiais que cometam “excessos”, especialmente quando concorrerem
“medo, surpresa ou violenta emoção”, é outro passo na mesma direção.
Desse modo, um policial que testemunhasse a morte de um companheiro
poderia alegar “violenta emoção” para poder se vingar de forma legal. Na
prática, entre os países que contemplam a pena de morte nas suas
legislações, nenhum deles admite que seja aplicada por policiais na rua,
muito menos pelo crime de porte ilegal. [a morte do portador do fuzil não será pelo crime de porte e sim pela reação que ele exercerá quando for abordado.
Está armado com um fuzil, o policial não pode chegar com flores e pedir para o cidadão trocar o fuzil pelas flores.] O que mais espanta na obsessão
dos novos líderes políticos por “abater bandidos de fuzil” é o fato de
ela se apresentar como novidade. Em 2018, as polícias fluminenses
bateram o recorde histórico de suspeitos mortos, com mais de 1.500
vítimas fatais. E todos os estudos mostram a extrema dificuldade de
condenar penalmente um policial por homicídio cometido no exercício da
função, mesmo quando há provas.
De resto, não será a ameaça de morte que mudará a conduta dos jovens
integrantes dos grupos armados ilegais para quem a morte precoce é já
uma quase certeza. Em 2019, ano de mitos, as autoridades querem nos fazer crer que, por
algum motivo, a continuidade das velhas políticas gerará novos efeitos.
Ignacio Cano é professor da Uerj e membro do Laboratório de Análise da Violência