João Domingos
Lula, Sérgio Moro e Bolsonaro tendem a ganhar maior espaço
A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de proibir a prisão após
condenação em segunda instância tem tudo para se tornar um marco na
História do País. Por alguns motivos em especial. Um, porque foi - e
continuará sendo - um teste para se medir a força das instituições
pilares da sustentação do Estado Democrático de Direito. Mesmo sob forte
pressão para que mantivesse a jurisprudência de 2016, a favor da
prisão, a Corte não se intimidou. A sessão foi transmitida ao vivo pela
TV e quem quis pôde ver em detalhes como se comportou cada ministro.
Goste-se ou não do resultado, ele está aí.
O motivo número 2 que fará com que o julgamento entre para a História
existe porque, embora se trate de uma questão técnica - se um artigo do
Código de Processo Penal é compatível com a Constituição -, o resultado
principal foi político. Daqui para a frente começa a ser montado o palco
da eleição presidencial de 2022. Agora, com todos os personagens que,
de alguma forma, movimentarão as forças políticas do País, ou na frente
de alguma chapa, ou nos bastidores.
O ex-presidente Lula, motivo de toda a barulheira em torno do
julgamento, passa a ter liberdade de locomoção para continuar a fazer
aquilo que sempre fez, e que não deixou de fazer nem na cadeia, que é
política. Se será candidato ou não, isso é outra coisa. Lula está
enquadrado na Lei da Ficha Limpa e, caso o STF não anule sua sentença, o
que, se não é impossível, é muito difícil, não poderá se candidatar.
Mas poderá percorrer o País para fazer campanha por um candidato do PT.
Quer dizer que vencerá a eleição, como venceu com Dilma? Necessariamente
não. Hoje a situação é muito diferente da de 2010. A rejeição ao PT é
maior. Ninguém deve se esquecer que o processo de corrupção que arruinou
o partido é recente, está na memória do eleitor e fez nascer novas
forças políticas no País, uma delas no poder com Jair Bolsonaro.
Outro personagem que pode ser resgatado, embora no momento se encontre
um pouco apagado, é o ministro da Justiça, Sérgio Moro. É possível que a
decisão do STF reacenda a lembrança de que foi Moro que condenou Lula
no processo do triplex do Guarujá. Não só Lula, mas dezenas de
empresários até então intocáveis, dirigentes de partidos, parlamentares e
burocratas de estatais. Não se deve esquecer ainda que foi Moro o maior
responsável pelo impeachment de Dilma Rousseff. Ele divulgou o grampo
de uma conversa entre Dilma e Lula, na qual a então presidente da
República mandava a seu mentor o termo de posse na Casa Civil, o
salvo-conduto para que não fosse preso. Tal grampo levou o ministro
Gilmar Mendes a proibir a posse de Lula. Sem cargo no governo, Lula não
pôde fazer nenhuma articulação política para salvar Dilma, que logo
teria o mandato cassado.
A respeito de Moro, Jair Bolsonaro aproveitou ontem cerimônia de
formatura de policiais federais para dizer que se não fosse o ex-juiz de
Curitiba ele não estaria ali como presidente da República. “Parte do
que acontece na política do Brasil devemos a Sérgio Moro”, afirmou.
Nada mais verdadeiro. Para, em seguida, dizer essa frase enigmática, que
pode ser interpretada de várias maneiras: “Ele (Moro) estava cumprindo
uma missão. Se a missão não fosse bem cumprida eu também não estaria
aqui”. Bolsonaro é outro personagem político que tende a se manter em
evidência por causa da decisão do STF. Ainda encarado como o “anti-PT” e
o “anti-Lula”, ele vai aguardar a forma como se comportará o
ex-presidente. Se Lula radicalizar o discurso, ficará à vontade para
também radicalizar o seu e tentar tirar o mesmo proveito do antagonismo
com os petistas que tirou na eleição de 2018.