Com o país conflagrado, a presidente Dilma fez um discurso
incendiário, usando o Palácio do Planalto como se fosse escritório
partidário e o clima, obviamente, se elevou mais. A presidente Dilma
falou em “conjuração” e afirmou que “é assim que começam os golpes”. O
vocábulo “golpe” serve como palavra de ordem para militância, mas na
boca de um chefe de governo passa a ter extrema gravidade.
A reação dos juízes e procuradores foi imediata, com a leitura de
manifestos em que explicaram que a Operação Lava-Jato não é apenas o
juiz Sérgio Moro, mas o Judiciário ao qual se pode recorrer das decisões
do próprio Moro, além do Ministério Público. Eu entrevistei em Curitiba
para meu programa na GloboNews os procuradores Deltan Dallagnol e
Carlos Fernando Lima. Eles mostraram que já esperavam este tipo de
reação às investigações. — Estamos vendo aumentar as acusações de abusos nas investigações
exatamente como aconteceu na Itália depois de três anos da Operação Mãos
Limpas. Essas acusações nunca se comprovaram, mas serviram para reduzir
o apoio da opinião pública à operação e permitir uma reação do sistema
corrupto. Foram aprovadas leis contra a investigação. Uma delas proibia a
prisão preventiva por corrupção, que foi chamada de ‘salva ladrões’.
Este é o risco que nós corremos, de que surjam acusações infundadas que
tirem o prestígio da operação para permitir a reação do sistema.
Ontem Deltan e os outros procuradores foram para a frente do
Ministério Público Federal no Paraná para ler um manifesto em defesa da
operação. A Associação dos Juízes Federais também fez leituras de
manifesto. A presidente disse que o país está atravessando a perigosa
fronteira do estado de exceção. Os juízes e procuradores responderam que
estamos sob o império da lei.
Dilma chamou de grampo ilegal o que foi escuta autorizada. Chamou de
vazamentos o que é suspensão do sigilo. O juiz Sérgio Moro tem
explicado, a cada momento que, nos processos, a publicidade tem que ser a
regra, a menos que seja decretado segredo de justiça. Se Dilma
considerar que seus direitos constitucionais foram feridos pode e deve
recorrer à própria Justiça, e não usar o Palácio do Planalto para uma
posse-comício em que ataca como inconstitucionais atos que estão sendo
referendados nas instâncias superiores.
Há uma batalha judicial em curso e o país vai travá-la porque o
sistema político polarizado não tem sido capaz de organizar suas
desavenças. Cada lado coloca seus argumentos. Dilma pode fazer a defesa
ardorosa do seu ponto de vista, mas com algumas ressalvas. Se está
convencida de que começou um "golpe" precisa alertar todos os poderes
constituídos. Não pode falar apenas para a sua militância e dentro da
sede do governo.
O Palácio é do povo. O governante é um mero inquilino que lá é
colocado temporariamente pelo eleitor. A posse de Lula transformou o
Planalto em um palanque extemporâneo no qual Dilma fez um discurso
inadequado no tom e no conteúdo.
A Operação Lava-Jato completou dois anos ontem, dia 17 de março, e
nesse meio tempo ela conseguiu mais do que qualquer outra investigação
em valores tangíveis e intangíveis. O país recuperou R$ 2,9 bilhões, a
maior parte disso devolvido à Petrobras, da qual foi surrupiado um valor
muito maior com o conluio de políticos do atual governo. No plano
intangível o Brasil está construindo, a duras penas, a barreira moral
que impedirá os absurdos que o país tem visto e ouvido nos últimos
tempos. Até agora foram acusadas 180 pessoas, 70 já foram condenadas a
penas que somam 900 anos de prisão. Já foram cumpridas 500 ordens de
busca e apreensão e fechadas 100 cooperações internacionais com 30
países.
O dia terminou com duas derrotas para o governo. A posse de Lula foi
suspensa por liminar e a Câmara elegeu a Comissão do Impeachment. Como
sinal dos turbulentos tempos atuais, no comando desse processo, nesta
primeira etapa, está um réu da Lava-Jato e na segunda etapa estará um
investigado da Lava-Jato. O procurador Deltan me disse que o que mais o
preocupa é que "personalizem" o combate à corrupção em uma pessoa ou um
partido. "Se queremos mudar essa realidade temos que nos concentrar nas
mudanças das leis".
Blog da Miriam Leitão - Com Marcelo Loureiro, interino
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sexta-feira, 18 de março de 2016
País em chamas
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País em chamas
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