Comportamento do ministro será examinado pelo Comitê de Ética Pública da Presidência; Temer tem de exigir que seu ministro se desculpe
Das
respostas possíveis ao óbvio e admitido comportamento impróprio de
Geddel Vieira Lima, ministro da Secretaria de Governo, o Planalto
escolheu a pior, que foi tentar varrer a questão para baixo do tapete
sob o pretexto de que se trata de algo menor.
[cabia a Geddel ou mesmo ao Temer seguir o exemplo de Itamar Franco e Henrique Hargreaves em caso parecido: surgiram suspeitas sobre o chefe da Casa Civil de Itamar, o próprio ministro se afastou, o assunto foi investigado e comprovada sua inocência Henrique Hargreaves voltou.
Temer deveria ter adotado igual postura - talvez não o tenha feito por saber que seu Geddel é culpado.
Muda o Governo mas a Casa Civil continua com os seus malfeitos.]
Moreira Franco (Programa
de Parcerias de Investimento) chegou a dizer que, dadas as urgências no
Congresso, não seria conveniente a substituição do ministro. A gestão
Dilma não diria nada melhor. Ou pior. Mais: ficou claro, ao longo do
dia, que o presidente Michel Temer sabia das pressões de Geddel sobre o
então ministro da Cultura, Marcelo Calero, desde quarta-feira. Tentou
contornar. Não foi possível. Como está, também não pode ficar. Vamos
ver.
A Comissão
de Ética da Presidência da República decidiu por unanimidade que a
atuação de Geddel tem de ser investigada. O placar estava cinco a zero
quando a votação foi suspensa por um pedido de vista do conselheiro José
Saraiva, que é próximo da turma de Geddel na Bahia. A mãozinha dada por
Saraiva saiu pior do que o soneto. A comissão só voltaria a se reunir
em dezembro. A questão se arrastaria até lá. Como a maioria já estava
formada, que se decidisse a coisa logo. O próprio Geddel pediu pressa. E
Saraiva foi solícito mais uma vez: pôs fim ao pedido de vista logo
depois de solicitá-lo e votou a favor da investigação, sendo seguido
pelo sétimo elemento. E pronto! Haverá a apuração. Por sete a zero.
Para
lembrar: Geddel comprou um apartamento num projeto imobiliário que foi
vetado pelo Iphan, o órgão federal que cuida do patrimônio histórico e
que é subordinado à Cultura. Mantém relação de amizade com o
empreiteiro. Tentou usar a sua influência para liberar a construção.
Aliás, ele teve de admitir tal comportamento.
O que o
governo deveria ter feito logo no sábado, quando veio à luz a entrevista
em que Calero relata a pressão, depois de pedir demissão? Deveria ter
admitido o comportamento inadequado de Geddel, dado um jeito de
demonstrar publicamente a sua contrariedade e cobrado um pedido público
de desculpas. Em vez disso, preferiu tornar pública a versão de que se
tratava de algo pequeno.
Pois é… O
argumento da coisa pequena é um tiro no pé. PERGUNTA ÓBVIA: QUEM FAZ
ISSO NUM CASO PEQUENO É CAPAZ DE FAZER, NUM CASO GRANDE, O QUÊ? Ou será
que Geddel é do tipo que só se ocupa de miudezas até R$ 3 milhões? Acho
que não.
Irritação de Temer
Temer ficou irritado com Calero.
Compreende-se. Acha que o ex-ministro fez tempestade num copo d’água,
especialmente porque a opinião do Iphan foi a que triunfou, e o projeto
não sairá na forma original, como queria Geddel. Mas isso não justifica o
comportamento displicente do Planalto, até porque todos conhecem — e
também o presidente — o estilo e o temperamento do ministro da
Secretaria de Governo. Ele é, digamos, um político espaçoso, para dizer
pouco.
Sim, o
governo já deixou claro que Geddel continua. Mas precisa arrumar um bom
argumento. Ou, como virou moda dizer hoje em dia, uma narrativa. Qual
mesmo? A de que o assunto é irrelevante não vale. Aliás, esta segunda
foi um dia em que um outro apartamento estava na berlinda, um certo
tríplex no Guarujá… Já tratado do assunto em outro post. Pau que bate em
Chico bate em Francisco. Dar de ombros para o comportamento de Geddel
significa endossar-lhe os métodos.
O Comitê de
Ética Pública não tem nenhuma função executiva ou judicial. É apenas um
órgão de consulta da Presidência. Suas recomendações podem ir do
arquivamento do caso à sugestão de que o servidor seja demitido,
passando por uma censura pública. Arquivado, com certeza, o caso não
será — ou estaríamos diante de uma vergonha. Quando menos, haverá a
censura pública. Até porque Geddel transgrediu vários itens do Código de
Ética Profissional do Servidor Público Civil do Poder Executivo
Federal, que está aqui.
Não acho que
seja uma questão pequena, de somenos. Mas, ainda que fosse, a
inabilidade do Planalto fez com que ela ficasse grande. Ou o governo
exige um pedido formal de desculpas de Geddel ou o que se tem é a
admissão de um método. Compreendo
que o presidente Temer esteja irritado com o fato de Calero ter dado a
entrevista à Folha. Mas quem pode contaminar o seu governo não é o
comportamento do ex-ministro da Cultura, e sim o de Geddel. Calero,
diga-se, apenas negou um assédio que, mais do que evidente, foi admitido
pelo ainda ministro.
Fonte: Blog do Reinaldo Azevedo