O Estado de S. Paulo
Não há votos para as soluções colocadas e não há outras para substituí-las
A verdade nua e crua é que o plenário do Supremo Tribunal Federal
decidiu adiar a decisão sobre regras para as alegações finais de réus
delatados por um único motivo: um impasse. Não há votos para as soluções
colocadas e não há outras para substituí-las. Mais ou menos como o Reino Unido se meteu numa enrascada ao decidir pelo
Brexit sem ter articulado as regras para a saída da União Europeia, os
ministros se meteram também numa grande confusão ao diferenciar o réu
delatado do réu delator, definir que o delatado tem a última palavra e
criar mais uma interrogação sobre a extensão da decisão e sobre o futuro
da Lava Jato.
O presidente da Corte, Dias Toffoli, tentou articular uma solução mista
para reduzir o impacto, juntando duas regras: a primeira é a de que só
terá direito à anulação de sentença o delatado que tiver reclamado desde
a primeira instância para falar por último; a segunda é a de que haja
comprovação de “prejuízo” do réu com a manifestação final do delator.
As duas regras são altamente polêmicas. A proposta de Toffoli faz o
oposto do que o habitual, garantindo direito retroativo, não daqui para a
frente, porque só atinge quem, lá atrás, ainda na primeira instância,
pediu direito para falar por último. Isso cria dois réus. Um é
beneficiado porque pediu o direito antes da decisão do STF e o outro,
não. Os dois têm a mesma situação, mas um se lasca e o outro se dá bem.
A outra regra proposta é igualmente complicada: haver ou não “prejuízo”
para o réu carrega uma altíssima dose de subjetividade e acarretaria uma
onda de recursos e pedidos de habeas corpus. [só a análise de que houve ou não prejuízo, e se houve definir qual o prejuízo havido, ensejará vários recursos o bastante para emperrar mais ainda o andamento do processo e favorecer criminosos com eventual prescrição - no Brasil, após a 'constituição cidadã' se judicializa até pensamentos, imagine definir situações não previstas em lei e com um Supremo que pela manhã pode tomar uma decisão e no inicio da noite mudar tudo.]
Diante da falta de uma saída, ou solução, a decisão foi adiada
novamente, de hoje para a próxima semana. Assim como no Brexit, não há
modelos razoáveis para “modular” a decisão que foi tomada antes pela
Segunda Turma e, agora, é endossada pelo plenário por 7 votos a 4.
Eliane Cantanhêde, jornalista - O Estado de S. Paulo