Uma carta de saudade
Um ano, 52 semanas, 365 dias…
Há
exatamente um ano, eu não uso mais farda. Não faço mais o habitual
coque, nem pinto as unhas de branquinho. Há um ano, não entro mais em
forma embaixo de sol. Nem preciso ser superior ao tempo quando começa a chover.
Para
minha felicidade, há um ano não faço TAF (Teste de Aptidão Física).
Corro só quando tenho vontade. Mas, para
minha tristeza, também não faço TAT (Teste de Aptidão ao Tiro) e sinto
muita falta dele. Há um ano, paquero de longe o PDC (Palácio Duque de Caxias,
no RJ) quando passo em frente a ele.
Isso
acontece todos os dias, de segunda a sexta, de manhã e à noite. Há
um ano, não ando mais em viatura, mas continuo usando (e muito) jargões de
miliquês. Há um ano, não participo de
operações, nem de ações cívicas sociais, nem de solenidades militares. Há um ano, não ouço o som do bumbo… Aquele
que nos diz que devemos colocar o pé direito no chão, enquanto desfilamos.
Há um
ano, não presto continência, nem sou chamada de “senhora”.
Era tão estranho ser chamada de senhora aos 24 anos… Eu era uma menina quando
ingressei nas fileiras do Exército Brasileiro. Não sabia nada da vida
castrense. Não sabia nem que iria usar farda.
De cara, odiei. Depois, me apaixonei.
E a paixão virou amor, daqueles que nunca morrem.
Durante
o último ano, só tive coragem de voltar ao PDC uma vez. E
derramei lágrimas sem fim com cada amigo que encontrava nos corredores. Talvez seja complicado para um civil
entender. Mas ser militar é muito mais que ter um emprego. É ter uma
família, uma segunda casa, lições de vida e amizades duradouras. É compartilhar
valores, perrengues, missões, tradições. É multiplicar companheirismo,
cumplicidade, camaradagem. É entender o significado literal de “servir”.
É superar limitações e se orgulhar muito disso. Só entende quem passa por isso.
Aliás, só entende mesmo quem “vivência” isso.
Há um
ano, eu me preparava para um dos dias mais
emblemáticos da minha vida: o dia de
deixar a caserna. Por mais que, desde 2006, eu soubesse que este dia
chegaria e até tenha tentado me preparar para ele, confesso que não estava
preparada. Doeu como se estivesse me despedindo de um grande amor. E estava. Ainda atendo o telefone no ímpeto de dizer “Assessoria
de Imprensa do Comando Militar do Leste”.
Ainda penso nas histórias do fim de
semana que vou contar para as minhas companheiras. Ainda lembro e celebro as
datas festivas do calendário do Exército. Ainda conto as experiências vividas,
como se tivessem acontecido na semana passada. Ainda lembro da formatura mensal
e revivo na memória, com lágrimas nos olhos, a última vez que entrei em forma
no Dia da Bandeira de 2013. Por mais incrível que possa parecer (milicos
entenderão), minha família também lembra e revive muitas coisas comigo.
Ah! Como
sinto saudades… Saudade daquela camaradagem. Saudade das missões. Saudade de me
arrepiar em forma, ao som da Canção
do Expedicionário. Saudade da minha farda. Saudade de ser a Tenente Sheila.
Não pela patente, pois quem me conhece, sabe que nunca me vali dela, mas pelo orgulho de ser uma Oficial do Exército
Brasileiro. Continuo sendo uma Oficial do nosso
glorioso EcoBravo, mas agora
componho a reserva atenta e forte. Saudades…
O tempo passou tão rápido e eu agradeço a Deus TODOS OS DIAS pela manifestação da graça superabundante
Dele em minha vida. Pelos novos desafios que Ele me tem dado, pelos novos
aprendizados, pelas oportunidades e conquistas diárias. Sou muito feliz pela
oportunidade ímpar que estou vivendo hoje. Tenho muito orgulho de fazer parte
de um projeto tão expressivo para o nosso país. Peço a Deus que me abençoe e me
capacite para que eu possa somar e dar sempre o melhor de mim no meu trabalho.
Contudo,
saudade é algo que não controlamos. Às
vezes, nem ao menos sabemos explicá-la direito. Mas, na minha opinião, saudade
é a confirmação de que algo que vivenciamos valeu a pena. Integrar o Exército valeu muito a pena. Foi muito mais que uma
experiência de emprego, foi uma escola de vida, da qual – hoje – trago comigo
os melhores ensinamentos.
Ao Exército Brasileiro, minha continência, meu reconhecimento, meu eterno
respeito, admiração e amor.
Brasil acima de tudo!
Tenente Sheila
Morello – Transcrito do Site Clube Militar - http://clubemilitar.com.br/