Revista Oeste
“Você demorou muito a comprar. Eficácia depende de rapidez”
“Poxa… Se eu soubesse teria comprado mais rápido. Ando muito dispersivo”
— Quanto é?
— Uma é 5, duas é 10.
— Tá. Me vê uma.
— Pra você eu faço duas por 15.
— Tá bom. Obrigado. Me vê duas, então. Funciona mesmo, né?
— Claro. 100%.
— Ótimo. Não posso ter dúvidas.
— Fica tranquilo. Os testes deram mais de 90% de eficácia.
— 90%? Não era 100?
— 90 foi nos testes. No mercado real é outra coisa.
— Como assim?
— Já ouviu a frase “treino é treino, jogo é jogo”?
— Já.
— Então é a mesma coisa. Teste é teste, mercado é mercado.
— Não entendi.
— Raciocina: se um produto tem mais de 90% de eficácia na fase de testes, que não vale nada, imagina como ele vai performar quando for pra valer?
— É… Faz sentido.
— Capaz até de ultrapassar 100%.
— É possível, isso?
— Se o produto for muito bom, sim.
— Caso ultrapasse os 100%, posso dar o que sobrar pra um amigo?
— No caso você vai precisar cadastrar esse amigo aqui, e pagar uma taxa extra de titularidade compartilhada.
— OK. Se a eficácia não passar de 100% vocês devolvem o dinheiro da taxa?
— Não.
— Por quê?
— Porque esse dinheiro já terá sido investido em mais eficácia. Ou seja, você terá ajudado indiretamente outras pessoas.
— Aquele lance de empatia?
— Exatamente.
— Que legal! Eu sempre quis ter empatia!
— Pois é. É mais simples do que parece. Vai pagar em dinheiro ou cartão?
— Aceita cheque?
— Nem aqui nem na China. Quer dizer, na China aceitamos, mas o cliente tem que deixar uma garantia.
— Qual garantia?
— Ele mesmo.
— Ah, tá. Aí funciona, né?
— Inadimplência zero. Mas esse sistema ainda é muito moderno pra ser usado aqui.
— Por quê?
— Aqui as pessoas são muito indisciplinadas. Não param quietas, querem andar por aí sozinhas, decidir as coisas por elas mesmas, sem monitoramento. Enfim, gente subdesenvolvida, sem empatia.
— Então vou pagar a taxa de empatia em dinheiro e o resto no cartão.
— Perfeito. Isso aqui é seu também.
— O que é isso?
— Um brinde do fabricante. Pode pregar na camisa.
— “100% ciência”. Que legal! Obrigado. Vou botar agora.
— Esse broche teve 98,3% de eficácia em mesa de bar na fase de testes.
— Uau! Vou sair com ele hoje.
— Vai arrebentar, com certeza.
— Somando com 100% de eficácia do produto…
— 75,8%.
— Como assim? Você acabou de me dizer que…
— Você demorou muito a comprar. Eficácia depende de rapidez.
— Poxa… Se eu soubesse teria comprado mais rápido. Ando muito dispersivo.
— Fica tranquilo. Ainda é uma boa taxa de eficácia, vai por mim.
— Tá. Mas com essa taxa eu ainda posso usar o broche “100% ciência”?
— Claro! Em mesa de bar ninguém verifica nada.
— Mas e se eu não for direto pro bar?
— Dá no mesmo. Hoje em dia é tudo bar.
— Como assim?
— Não reparou? O mundo virou uma grande mesa de bar. E tá todo mundo bêbado. Vai com fé.
— Com fé ou com ciência?
— Dá no mesmo, bobo.
— Legal! Então… 75,8% de eficácia, né?
— Não. 50,5.
— O quê??
— Te falei que se demorasse ia caindo…
— Droga. Me distraí de novo. Mas… 50%? Não é arriscado?
— Você não comprou duas?
— Comprei.
— Então é só somar: 50,5 + 50,5 = 101%. Você fez um excelente negócio.
— Maravilha! Você teria um broche “101% ciência”?
Ricardo Fiuza, jornalística - Revista Oeste