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segunda-feira, 23 de outubro de 2023

O impasse não está no Conselho de Segurança - Alon Feuerwerker

Análise Política

Na narrativa estabelecida por estas bandas, o Conselho de Segurança (CS) das Nações Unidas vive impasses por dois motivos
1) a baixa representatividade e 
2) o poder de veto das principais nações vencedoras da Segunda Guerra Mundial.

É um pensamento baseado, além da inércia, em certo idealismo filosófico. Na vida real, o CS só consegue decidir quando há consenso entre os países que, reunidos, têm força material para fazer cumprir as decisões do CS. Simples assim.

Tivesse o CS mais representatividade, e uma vez abolido o poder de veto, ele se transformaria numa miniatura da Assembleia Geral, capaz de decidir a respeito de qualquer tema, mas cujas decisões não têm nenhum rebatimento na vida prática.

Com o tempo, teria o fim da Liga das Nações, criada após a Primeira Guerra e morta de morte morrida, fermentada no período em que se criaram as condições para a Segunda.

E o principal efeito prático de seu desaparecimento, além da economia de recursos, [só a economia já valeria a pena do que é um exemplo perfeito de uma ditadura de um único pais, com poderes para que o 'ditador' imponha sua vontade, sem necessidade de justificar, sobre todo restante do mundo.]  seria o fim das reportagens em que “a ONU” acha alguma coisa, no mais das vezes a opinião individual de algum feliz funcionário da instituição subitamente revestido de “autoridade” pela imperiosa necessidade de uma manchete.

Os debates no CS sobre a guerra desencadeada pelo Hamas contra Israel foram sintomáticos. 
Israel deseja a eliminação da ameaça militar representada pelo grupo. [destacando apenas o ASPECTO HUMANITÁRIO, as ações definidas por Israel, de forma autocrática, soberana,  como válidas para eliminar uma ameaça militar, produzem um único efeito: a matança de forma indiscriminada e maciça de civis inocentes e que resulta na depopulação palestina.]
O outro lado naturalmente prefere que o atual ciclo de hostilidades se conclua com uma vitória política e militar da principal facção islâmica dos palestinos. 
Vitória que seria obtida se Israel precisasse aceitar o novo statu quo no terreno.

Tivesse o Hamas limitado sua ação militar à tomada temporária de posições do exército israelense e à captura de prisioneiros militares, a proposta de um imediato cessar-fogo estaria mais respaldada moral e politicamente. Mas a chacina de civis em 7 de outubro, com seu ritual de barbaridades, ao buscar um segundo objetivo, acabou dificultando a saída tradicional de pausa nas hostilidades.

A chacina pegou mal. Aqui no Brasil, os levantamentos de opinião pública convergem nesse sentido.  A chacina está perfeitamente encaixada na linha do Hamas de riscar Israel do mapa, também por meio da despopulação judaica. Se Israel não restabelecer a contenção ao redor de Gaza, essa meta do terrorismo terá avançado na região sul do país. 
E servirá de estímulo a que avance também no norte, pela ação do Hezbollah.

A proposta brasileira no CS, temporariamente presidido pelo Brasil, tinha o objetivo de abordar algumas questões humanitárias e permitiu ao governo brasileiro posicionar-se como vetor da busca de soluções pacíficas e negociadas para graves conflitos que ameaçam a paz mundial. 
Nesse aspecto teve utilidade, apesar de derrotada no CS.

Resta, porém, o problema prático: como estabelecer uma paz duradoura na região, respeitadas as aspirações nacionais de cada lado e de aliados e apoiadores.  
Uma solução possível passa por todos reconhecerem o direito do adversário à autodeterminação. 
No momento, esse cenário parece mais distante. 
As ações do Hamas parecem ter reavivado as brasas do unilateralismo anti-Israel. 
Era certamente um dos objetivos da ação.

As grandes potências poderiam, se assim desejassem, impor um acordo duradouro. O problema é elas viverem um momento de rearranjo belicoso na correlação de forças, e há pouco estímulo a que busquem soluções negociadas. E só elas têm força para tal. Enquanto isso, segue a guerra. 
 
Alon Feuerwerker, jornalista e analista político