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terça-feira, 28 de junho de 2016

Bandidos se divertem no Rio e secretário de segurança culpa população. Vá pastar, Beltrame!



1) No fim deste post, logo após um aviso para quem quiser evitar, há uma imagem forte de cadáver.

É o corpo do comerciante Manoel Marcelo Avelino, agachado e espremido entre duas geladeiras de sua loja na divisa entre as favelas de Manguinhos e Jacarezinho, ambas tidas como pacificadas pela secretaria de segurança pública do Rio de Janeiro. Acima dele, na fotografia obtida por este blog, aparecem as estantes com caixas de bala, pacotes de biscoito, embalagens de suco em pó e maços de cigarro. Avelino morreu na quinta-feira (23), vítima da mal chamada “bala perdida” durante ataque de traficantes a uma van da UPP de Manguinhos.
Homem armado com fuzil AK (similar à arma portada por Omar Mateen no massacre na boate gay de Orlando) chuta  bola em campo supostamente da Vila Aliança no Rio: diga, Beltrame, ele comprou no shopping?

Uma das “balas achadas” acertou na cabeça o sargento Ericson Gonçalves Rosário, de 34 anos, que, mesmo sendo levado para o Hospital Quinta D’Or, não resistiu. Ele se tornou o 37º policial militar assassinado dentro de uma das 38 regiões da cidade que contam com Unidades de Polícia Pacificadora.

2) VEJA informa:
“Os ataques a policiais em favelas com UPP tornaram-se rotineiros. Somente este ano, além dos oito PMs que morreram, 74 foram feridos à bala ou por granadas em confrontos com criminosos. Na soma, esses 84 agentes atingidos em 2016 fazem essa média de baleados atingir a marca de um policial a cada dois dias. As autoridades insistem no discurso de que esses episódios são uma tentativa do tráfico de tentar desestabilizar o projeto.”

Mentira. Esses episódios são a enésima prova de que o projeto comandado por José Mariano Beltrame, vitrine da propaganda do governo do Rio, é uma farsa, como este blog apontou desde a primeira ocupação.

(* Relembre também A farsa da pacificação no Rio de Janeiro“.)
Para se ter uma ideia do poder do tráfico, no domingo 19 a Divisão de Homicídios simplesmente não pôde ir ao Morro da Fazendinha, no também “pacificado” Complexo do Alemão, para fazer perícia no local onde Roseli dos Santos Jesus também morreu como vítima de “bala perdida” durante um tiroteio.

3) “Se não sair recurso mínimo para resolver o problema da segurança e da Saúde no Estado, é o caso de chegar a Brasília e entregar a chave”, disse ao Estadão o governador interino Francisco Dornelles, que decretou estado de calamidade pública para obter R$ 2,9 bilhões do governo federal. Os recursos federais garantem três meses de gastos com segurança – que custa aos cofres estaduais R$ 940 milhões mensais – e ainda ajudam Beltrame e governo a culpar a crise financeira pelo fracasso da política de segurança que é muito anterior a ela. Janeiro de 2014, por exemplo, foi um dos piores meses da história da segurança fluminense e não havia crise alguma para o governo do Rio.

Os governadores Sérgio Cabral e Luiz Fernando Pezão deram bilhões de reais à pasta de Beltrame, mas a insistência do secretário em apontar culpados sem jamais assumir suas próprias culpas virou motivo de chacota em praticamente todos os grupos de whatsapp de policiais do estado. Uma das piadas a que este blog teve acesso é assim: “Beltrame diz que fica muito difícil gerir a segurança após a saída do Reino Unido da UE”.

4) Em entrevista ao El País – jornal que recebia verba federal durante o governo do PT, mas teve seu patrocínio cancelado pelo governo de Michel Temer junto com os blogs sujos petistas –, Beltrame chegou ao cúmulo de culpar a população carioca pelo seu próprio fracasso: “O cidadão que está lá [nas favelas] vê que o Estado não está dando bola para ele e a população carioca só quer a favela para arrumar babá, faxineira e cozinheira. Ela não está preocupada com a qualidade de vida daquelas pessoas”.

Quem não está dando bola para o cidadão da favela é o secretário que não o protege contra os bandidos enquanto recebe para fazer isto um salário pago pela própria população que ele ataca.  O discurso de Beltrame, além de estúpido, é duplamente preconceituoso: contra babás, faxineiras e cozinheiras, porque subentende que este tipo de trabalho não melhora a qualidade de vida daquelas pessoas; e contra a população empregadora, porque subentende que dar emprego a elas em suas próprias residências ou empresas é apenas uma forma indiferente de exploração.

Detalhe: como a população pode “querer a favela” se os próprios moradores estão morrendo atingidos por “bala perdida”? Beltrame quer que a população suba o morro para dar aula de português e balé, e acabe espremida entre duas geladeiras como Avelino? Ao apelar ao discurso esquerdista mais rasteiro contra as supostas elites, o “sociólogo” disfarçado de secretário só faz estimular o ressentimento dos pobres e, na prática, legitimar moralmente o banditismo entre eles.

5) Nada mais natural que alguém com esta mentalidade tenha sido tratado com tantas pompas pela imprensa.  Defensor do desarmamento e da liberação das drogas, o secretário que implementou a política de espalhar bandidos em vez de prendê-los (pergunte ao povo de Nova Iguaçu e São Gonçalo) recebeu o “Prêmio Faz Diferença” do jornal O Globo em 2010 e encontrou em Zuenir Ventura seu maior garoto-propaganda.

Em 2011, preocupado apenas com a possibilidade de Beltrame virar candidato, o colunista escrevia:  “Uma das razões de José Mariano Beltrame ser hoje uma das personalidades mais queridas e respeitadas do Estado do Rio, recebendo aplausos por onde passa, é evidentemente o unânime sucesso das UPPs, mas é também a sua recusa em se meter em política ou deixar que a política se metesse em seu trabalho de pacificação das favelas.”

A exaltação cega preenchia o artigo inteiro, mas vou poupar meus leitores do desgosto. Prefiro reproduzir trechos de um artigo do mesmo Zuenir – acredite – publicado na última quarta-feira 22 (com base na ação criminosa que também comentei aqui): E, se não bastasse, há a crise crônica da segurança pública, que na madrugada de domingo ganhou um capítulo cinematográfico, com o resgate no sexto andar do Hospital Souza Aguiar de um bandido ferido no rosto, com dificuldade de caminhar e pesando mais de cem quilos: o Fat Family. Foi uma operação de guerra, envolvendo cerca de 20 homens armados de pistolas, fuzis e granadas, numa demonstração espetacular de como nossos marginais estão preparados, e as forças da ordem, despreparadas.

Eles planejaram tudo — sabiam onde o comparsa se encontrava e até que seria preciso um alicate grande para romper as algemas que prendiam o perigoso paciente à cama. Depois do desaforado feito, comemoraram num vídeo na internet (‘o mano tá aqui com nois’), enquanto as autoridades policiais discutiam, tentando descobrir os responsáveis pelo trágico vexame, que custou a vida de um inocente que chegava em busca de socorro.
O PM que custodiava o preso disse que alertou seus superiores sobre o plano de resgate. Outro alegou que quis transferi-lo, mas os médicos não deixaram. A Secretaria de Saúde negou que tivesse havido o pedido. Enfim, um bate-boca que envolveu até o secretário de Segurança, que se queixou de ‘uma cidade sem limites’, difícil de ser policiada, ‘uma verdadeira esculhambação urbanística’.

Com a experiência de ter sido a primeira mulher a chefiar o sistema penitenciário no Rio, a socióloga Julita Lemgruber desabafou num e-mail para esta coluna na tarde em que uma senhora e um rapaz inocentes foram mortos em meio a um tiroteio no Morro do Alemão: ‘Esses irresponsáveis, responsáveis pela segurança pública do Rio, estão perdidos e, com a proximidade da Olimpíada, estão arrepiando nos morros de nossa cidade’.

Que passe logo esse inferno astral, onde só os bandidos sabem o que fazer. Que venha a tão esperada festa, a dos Jogos Olímpicos.”

O comerciante Manoel Marcelo Avelino, vítima de “bala perdida”

Pois é.  O título do artigo remetia ao último trecho que coloquei em negrito: “Que passe o inferno astral”. Como se os astros fossem os culpados pelas farsas que Zuenir aplaudiu.

Fonte: Blog Felipe Moura Brasil -  http://veja.abril.com.br/blog/felipe-moura-brasil