O estrago está feito. Comprometeu a indústria, a PF, os consumidores,
os trabalhadores do setor, as exportações, a imagem de marcas que são
ícones de excelência no mundo, o PIB, a balança comercial.
Contaminou a
economia, a política, a sociedade em suma. Algo lamentável em um País
que ainda peleja a duras penas na busca da retomada. E para que tudo
isso? Qual a razão de 1100 policiais saírem às ruas na captura de 30
fiscais e intermediadores de alguns frigoríficos (nem quadrilhas da
máfia mereceriam tamanho batalhão!) e depois chamarem o espetáculo de
maior operação já feita até hoje? A “Carne Fraca” foi um desastre sobre
qualquer ângulo que se enxergue. Trouxe muito menos resultado do que
propagou.
Difamou uma atividade que, na esmagadora maioria – ou na quase
totalidade – dos cinco mil estabelecimentos envolvidos, nada deve no
tocante à qualidade dos serviços. O que se viu ali deixa um sentimento
de indignação e repulsa aos brasileiros. Agentes tecnicamente
despreparados para entender o que estavam investigando e o que
encontraram. Erros em profusão na comunicação. Fraudes pontuais tratadas
com grande estardalhaço. Subornos baratos desproporcionais à escala das
apurações. Bilhões perdidos em vendas e encomendas a troco de quase
nada. Amostras mirradas de carne podre. Muita soberba e discrepância de
dados. Para ficar num exemplo alarmante: a tão propalada denúncia do uso
de papelão não passou de um erro interpretativo na escuta telefônica.
Fiscais confundiram uma conversa sobre embalagem deduzindo tratar-se de
um diálogo sobre mistura ilegal de papelão na carne. Quarenta
frigoríficos foram relacionados como alvo e apenas dois laudos
apresentados. A Polícia Federal fez inspeção em apenas uma única unidade
antes de detonar a captura de acusados. As motivações para o aparato
decorreram meramente das escutas telefônicas e do depoimento de uma
testemunha ligada à pasta da agricultura. Críticas sobre a fragilidade
das acusações vieram de todos os lados.
Ocorreram equívocos no entendimento sobre o uso de carne de cabeça em
embutidos, sobre a concessão de certificados de garantia e até na
identificação da origem dos problemas, mais relacionada a lotes de
frango do que a peças de natureza bovina. Ataques a grandes fabricantes
sem que eles estivessem diretamente ligados ao cerco foram uma
constante. No caso do portento JBS/Friboi, líder global com
participação em 150 países, não há qualquer menção a irregularidades
sanitárias e nenhum de seus dirigentes ou executivos foi sequer alvo de
medidas judiciais (apenas um funcionário de uma unidade teve o nome
citado por desvio de conduta). Mesmo assim, no plano da repercussão, o
grupo foi o mais afetado devido à estatura e projeção.
O concorrente
BRF, por sua vez, teve até uma instalação interditada sem maiores
motivos. Não está, naturalmente, em questão a necessidade de apurar
eventuais crimes e identificar os culpados. Eles existem e são de várias
vertentes, especialmente devido aos feudos políticos que se instalaram
na rede dos negócios agropecuários. Mas a forma como a operação “Carne
Fraca” foi realizada deixou muito a desejar. Não havia necessidade de
enxovalhar reputações e, sabe-se, o dano causado à atividade ainda irá
demorar muito a ser reparado. Estima-se em US$ 1,5 bilhão,
preliminarmente, o prejuízo no comércio de carne neste ano. Outros US$ 8
bilhões evaporaram no valor das ações das companhias relacionadas.
Dezenas de países cancelaram as encomendas ou estabeleceram novos
critérios de exigências. As demissões, em apenas um dos frigoríficos,
atingiram 200 funcionários. O número, no cômputo geral, tende a crescer
atingindo indiscriminadamente vários níveis da cadeia produtiva. Um
disparate! O que a armada policialesca acabou fazendo é de uma
irresponsabilidade abominável. Quase destruiu a história de um setor que
passou décadas para chegar onde está. Não precisava ser dessa maneira.
Fonte: Editorial - IstoÉ - Carlos José Marques, diretor editorial da Editora Três
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sábado, 25 de março de 2017
Barbeiragem policialesca
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