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quinta-feira, 17 de novembro de 2022

STF quer recuperar à força o respeito que já perdeu - O Globo

Vozes - Paulo Polzonoff Jr
 

Vexame at Tiffany's

Ontem (16) o STF emitiu uma nota dizendo que os protestos de brasileiros contra os ministros em Nova York eram manifestações “de intolerância e violência”. Nas poucas linhas assinadas pela ministra Rosa Weber, lê-se ainda este trecho que há de entrar para os Anais do Cinismo Jurídico Brasileiro (volume 13): “A democracia, fundada no pluralismo de ideias e opiniões, a legitimar o dissenso, mostra-se absolutamente incompatível com atos de intolerância e violência, inclusive moral, contra qualquer cidadão”.

O ministro Alexandre de Moraes deixa o hotel em Nova York.| Foto: Reprodução/ Twitter

A gente até dá um desconto porque sabe que a ministra das platitudes é café-com-leite. 
Mesmo assim, os conceitos e a linguagem usados na nota são preocupantes. 
Afinal, parece que nossos ministros supremos não entendem o significado de palavras importantíssimas para o bom funcionamento da engrenagem verdadeiramente democrática, como tolerância. Pior: a nota fala em “violência moral” como se o STF não fosse um dos três pilares da República, o poder “cabeça branca” por excelência e um lugar ocupado por pessoas maduras e no pleno gozo de suas faculdades mentais e emocionais, e sim um safe space para criançolas frágeis.
 
Além disso, o que será que a ministra Rosa Weber entende por “plurarismo de ideias e opiniões”? 
Será que ela sabe que o tal dissenso, esse mesmo que a democracia legitima, pressupõe a coexistência conflituosa de ideias antagônicas? Melhor, vou falar de um modo que até a ministra Rosa Weber entenda: era uma vez uma ideia muito boba e feia, que queria vencer as outras ideias na base da violência física, do cala-boca institucionalizado e da perseguição judicial
Aí, por meio do dissenso democrático, veio uma ideia melhor (uma ideia de liberdade, talvez?) e a venceu. E todos foram felizes para sempre. Fim.

Ira democrática

“Mas e os palavrões? Você não vai falar dos palavrões? Tem que falar dos palavrões, rapá! Das injúrias. Do ataque à honra dos ministros. Da violência verbal. Do des-res-pei-to!”, diz uma dessas pessoas que separam sílabas quando querem enfatizar algo e que  acreditam mesmo que Alexandre de Moraes merece estátua (equestre?) em praça pública. Ao que respondo com a obviedade irritante do bom senso: os palavrões são errados, reprováveis, lamentáveis, vergonhosos, etc. Mas também são compreensíveis. Compreensibilíssimos.

Estamos diante de uma multidão que se sente injustiçada e, sem saber direito como expressar isso, faz o que pode. Isto é, faz uso da liberdade garantida por uma Constituição imune às alexandrices da vida (a norte-americana) para deixar bem claro que o poder absoluto dos ministros do Supremo não é bem-vindo. E não adianta vir com a desculpinha esfarrapada de estar “protegendo a democracia”.

É uma multidão que não sente que foi derrotada apenas nas urnas; ela sente que foi derrotada muito antes de sair de casa e enfrentar longas filas para depositar seu voto nas máquinas infalíveis e inquestionáveis do TSE. É uma multidão que, diante de sucessivos escárnios, da “censura temporária” ao jantar de ministro do STF com o advogado do PT, não tem a quem recorrer. Até porque, numa democracia de verdade, elas recorreriam justamente aos ministros do Supremo Tribunal Federal. Isto é, àqueles que têm como atribuição maior proteger o cidadão comum de eventuais abusos cometidos pelo Estado e seus agentes.

Cooptada por um grupo político (esquerdistas, comunistas, progressistas, petistas – chame como quiser) e embriagada de soberba, contudo, a instância máxima da Justiça brasileira não é mais capaz de produzir... justiça
Diante disso, como não entender os palavrões? 
Os xingamentos são o último recurso de uma população que está há anos vendo a prudência, a mansidão, a lógica e até a doutrina jurídica sendo ignoradas ou substituídas pelo voluntarismo dos ditadores de toga.

Assim como a política é a guerra por outros meios, no contexto do rega-bofe supremo em Nova York a palavra chula é o habeas corpus por outros meios. A isso dou o nome nada criativo de "ira democrática": um monstrengo assustador que dormia em berço esplêndido até ser acordado pela ambição dos ministros que se consideram cruzados dessa revolução petista & patética.

O texto já acabou
O texto já acabou e tal, mas é que sobrou um fiapinho de raciocínio aqui e, bom, como governo Lula é prenúncio de vacas magras, não convém desperdiçar nada. É uma coisa boba, simples, à toa. Tão boba, simples e à toa que nem sei por que estou escrevendo. Mas estou.

Acontece que, levando em conta a vaidade mastodôntica dos nossos magistrados, fiquei imaginando a vergonha deles perante os ministros da Suprema Corte dos Estados Unidos e de todos os lugares aos quais as imagens dos protestos possam ter chegado. 

Porque, você sabe, eles podem estar se lixando para mim e para você, mas são totalmente dependentes da aceitação da imagem que projetam para o mundo.

Paulo Polzonoff Jr., colunista - Gazeta do Povo - VOZES

 


quarta-feira, 19 de janeiro de 2022

É sobre isso Tenho pena de Lula. E do canalha-ao-lado. E explico por quê

Paulo Polzonoff Jr.

É sobre isso

Ao procurar uma imagem para ilustrar este texto, me ocorreu esta pergunta: Barrabás foi perdoado?

Não existe nada mais difícil do que ser misericordioso. Ou caridoso. Por isso os ensinamentos cristãos de 2000 anos atrás são tão fascinantes. E tão difíceis de serem assimilados e incorporados à vida cotidiana. Sobretudo aqui na nossa contemporaneidade, com tantos guerreiros narcisistas que, por detrás de uma tela de computador ou celular, travam guerras sem sangue, mas não isentas de vítimas.

Ao procurar uma imagem para ilustrar este texto, me ocorreu esta pergunta: Barrabás foi perdoado? - Foto: Reprodução/ Wikipedia

Há anos, e aos sobressaltos, tento aplicar a ideia da misericórdia (como humildemente a compreendo) à guerra ideológica – com pouco sucesso e muito fracasso. Afinal, imagine chegar aqui hoje, em plena segunda-feira, e sugerir aos leitores da Gazeta do Povo que vejam Lula pelo que ele é: um homem que, apesar do poder, da influência e da riqueza, não pode nem tomar uma cachacinha no bar da esquina com os amigos de sindicato
Um homem corrompido pela própria ideia de grandeza e benevolência, incapaz de se olhar no espelho e se ver por inteiro. 
Um homem tão escravizado pela imagem que os outros fazem dele que já nem sabe quem é.  
Um leproso moral que anda pelas ruas negando o caráter contagioso das próprias chagas.

E pensar que tudo isso poderia ter sido evitado se Moro tivesse abandonado momentaneamente os manuais e códigos e biografias por uma cópia de “Moby Dick”.

Moro: “Coloque-se na minha situação”. Eu: “É pra já!”

Para mim, tudo isso é castigo o bastante. E é justamente por isso que a anulação das sentenças contra Lula não faz nem cócegas. Tá, talvez faça um pouquinho, mas só na planta do pé. Mas sou exceção, reconheço. E também vacilo nessa minha excepcionalidade. A depender da cor do meu café-com-leite matinal e do formato e do peso das nuvens, tendo a ser mais ou menos severo com esses líderes que se veem como deuses, mas (sabemos eu e você e até a torcida do Flamengo) não passam de cadáveres prematuros à espera da terra que os cobrirá – porque cobrirá a todos nós.

Castigo maior, para mim, seria dar a Lula uma cópia de “A Morte de Ivan Ilitch” ou “Lições de Abismo” e trancafiá-lo por alguns anos, até que ele saísse do cativeiro com uma compreensão profunda de sua existência. Mas talvez isso seja uma forma de tortura proibida pela Convenção de Genebra – menos pelas obras-primas citadas e mais pela crueldade de obrigar alguém a se olhar no espelho por tanto tempo. Eu mesmo talvez não suporte se um dia for obrigado a passar mais de cinco minutos diante do amontoado de pecados e erros que sou.

E, antes que você fique aí todo revoltadinho porque citei Lula e não Bolsonaro ou Moro ou Doria ou o Cabo Daciolo, aqui está a frase que, apesar da obviedade, há de me redimir na manhã nublada de domingo em que escrevo este texto: não estamos cercados nem somos liderados por santos de nenhum tipo. E todos esses homens que sobem ao púlpito da política para oferecer nossa sanidade em sacrifício à deusa Democracia, fomentando uma guerra fratricida (ou parricida, no caso do meu amigo que brigou com o pai petista), são dignos, sim, da nossa mais sincera pena, misericórdia, caridade.

E na vida?
Exercer a misericórdia na vida cotidiana é ainda mais difícil do que na política. E eu, como todos nós, erro mais do que acerto. Mas, na base do estudo, da experiência e das muitas (muitas mesmo!) surras da vida, essa professorinha atraente, mas severa, aprendi um bocado ao longo dos últimos anos. E se você acha que a frase anterior é expressão de uma vaidade repreensível e até repugnante (e é mesmo), tente ser misericordioso comigo agora (tentarei também).

Hoje em dia, com os joelhos eternamente ralados pelos tropeços da juventude, quando vejo perto de mim uma manifestação do que considero canalhice & perversidade, não saio correndo para escrever sobre o assunto e o ofensor e, pateticamente, tentar fazer justiça com as parcas sílabas que me sói encadear na forma de argumentos e insultos literários. De jeito nenhum! Quando vejo perto de mim (real ou virtualmente) o dito-cujo se regozijando com a maldade própria ou alheia, só me permito ceder à raiva privada – àquele xingamento dito para o apartamento vazio e que talvez se prolongue pela Eternidade, mas tomara que não.

Exige esforço. Nunca ninguém disse que era fácil. A mim o silêncio só me vem a muito custo – espero que não o de uma gastrite nervosa. Outro dia mesmo, ao me deparar com a perversidade pública e mal-disfarçada de um desses parasitas, tive ganas de gritar ao mundo o nome dele. De compor uma crônica que deixasse clara a minha revolta. E até de procurar meios formais de reparação – talvez a maior estupidez do nosso tempo, à qual, ao que parece, não estou imune.

Mas daí me lembrei dessa milenar ideia frágil: a misericórdia.
Fechei os olhos por um instante e me lembrei da voz mansa e covarde, da magreza pachequenta, dos olhos vazios de quem alcançou a velhice sem jamais ter saboreado um único momento de sabedoria. E entendi, numa lição que precisa ser reaprendida diariamente, que para alguns a vida é apenas uma sucessão de dias. “Coitado”, concluí, sem brilhantismo nem indignação. E fui dormir o sono pesado que me é de direito.

Porque, parafraseando o historiador e político romano Tácito, numa frase que serve tanto para o canalha-ao-lado quanto para o líder no palanque, na vida sempre haverá aqueles que, cercados pela mais cretina miséria moral (e política), insistirão em chamar isso de vitória. E até de vida.

Paulo Polzonoff Jr., colunista - Gazeta do Povo - VOZES